ELEIÇÕES 2024

Nunes, Marçal e a meia-volta de Bolsonaro

Ex-presidente ainda tenta se achar na disputa pela prefeitura da principal capital do país, mas uma coisa já é certa: em São Paulo, não é mais o protagonista da extrema direita

Créditos: Reprodução de vídeo / Uol
Escrito en BLOGS el

Na noite desta quinta-feira (12), em uma aparição por vídeo em meio a um evento da campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) divulgou uma mensagem de apoio ao candidato à reeleição na capital paulista.

"Torço por você, tenho certeza que haverá segundo turno. E seremos vitoriosos no segundo turno", disse Bolsonaro a Nunes, que recebia o apoio de empresários no clube Monte Líbano. Foi o ato de campanha mais explícito de alguém que, até agora, não se empenhava em nada para ajudar o emedebista.

Bolsonaro ainda fez referência ao candidato Pablo Marçal (PRTB), afirmando que "não queremos uma experiência nova" porque "sabemos como são essas figuras".

Foi uma mudança na relação com o ex-coach. Publicamente, tanto o ex-presidente como seus filhos chegaram a trocar farpas com Marçal, mas recuaram diante dos bons números que ele começou a ostentar nas pesquisas. Bolsonaro temeu se indispor com seu próprio eleitorado, já que sua família começou a ser cobrada em seu habitat político, as redes sociais, por conta da relação estabelecida com o candidato do PRTB.

O armistício durou até a manifestação de 7 de Setembro, quando Marçal chegou à Avenida Paulista após o discurso do ex-presidente. Bolsonaro não escondeu sua insatisfação em uma mensagem do Telegram enviada a aliados. “O único e lamentável incidente ocorreu após o término do meu discurso (com o evento já encerrado) quando então surgiu o candidato Pablo Marçal que queria subir no carro de som e acenar para o público (fazer palanque às custas do trabalho e risco dos outros), e não foi permitido por questões óbvias”, escreveu.

Mesmo assim, o desconforto com Marçal não havia se traduzido em um vínculo mais explícito com Nunes. Até a pesquisa Datafolha.

Oportunismo e sobrevivência

O levantamento do instituto trouxe Nunes com 27% das intenções de voto, com Guilherme Boulos (PSOL) chegando a 25%. Pablo Marçal oscilou negativamente três pontos percentuais, ficando com 19%.

Aí se deu a virada de Bolsonaro. Ele tem seu candidato no Rio de Janeiro, Alexandre Ramagem, com um desempenho pífio, além de dois ex-ministros, Marcelo Queiroga e Gílson Machado, amargando índices de um dígito. Não são figuras simplesmente alinhadas com ele, mas personagens próximos que participaram de seu governo.

Neste cenário, Bolsonaro não gostaria de se arriscar a se associar a uma derrota em São Paulo. Uma eventual vitória de Nunes na capital paulista pode reservar um quinhão da administração municipal ao seu grupo, já que o vice é indicado por ele, como fez questão de frisar no vídeo de apoio ao prefeito. Ajuda na sobrevivência política e se trata de uma reconversão do ex-presidente ao espírito do Centrão. Espectro do qual, na prática, nunca guardou distância.

Por outro lado, tentar se ligar a um eventual vitorioso não lhe garante os dividendos políticos. Estes, no cenário, iriam para o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que não abandonou o emedebista a despeito de "conselhos" do próprio ex-presidente.

Bolsonaro não joga sozinho

Governadores de São Paulo não costumam ter grande influência na eleição da capital paulista. Sinal disso é que o PMDB nunca elegeu um prefeito na cidade, mesmo com Franco Montoro, Orestes Quércia e Luiz Antônio Fleury Filho no comando do estado. Quando tucanos foram eleitos, também não foi por apoio do Palácio dos Bandeirantes. A mídia corporativa até tentou atribuir ao então governador José Serra a eleição de Gilberto Kassab (PSD) em 2004, mesmo sem o tucano poder explicitar o apoio a seu ex-vice, já que o também tucano Geraldo Alckmin disputava contra o prefeito.

No entanto, com Tarcísio a história seria diferente. Ele apareceu não só em diversos atos públicos com Nunes como também no horário eleitoral, onde pregou o voto útil contra "a esquerda", defendendo que o emedebista seria a melhor opção para derrotar Boulos no segundo turno.

No jargão de campanha, a estratégia seria "queimar a largada", já que o argumento costuma ser usado em retas finais de campanha. Mas isso, associado ao bombardeio contra Marçal e a um espaço generoso na rádio e TV, conseguiu fazer com que Nunes revertesse a tendência de queda. Caso ele vença, Bolsonaro não leva os louros, Mas Tarcísio, sim.

A corrida, contudo, está longe do final. Marçal, aparentemente abatido, ainda pode estancar sua queda. E, mais importante, Boulos pode derrotar um ou outro em um eventual segundo turno, contando com os apoio de Lula e a influência de Marta Suplicy até o fim do primeiro turno. No segundo, a vantagem de tempo de TV e de rádio de Nunes desapareceria. A eleição não zera o placar, mas a disputa fica mais equilibrada.

A essa altura, o que já se sabe é que, neste jogo, Bolsonaro piscou. Seja para Tarcísio ou Marçal, ou mesmo os dois, o ex-presidente não dá mais as cartas sozinho. Para quem tem dificuldades em dialogar, é uma péssima notícia.

Siga os perfis da Revista Fórum e do jornalista Glauco Faria no Bluesky