CHINA EM FOCO

China-EUA: Guerra comercial ganha novos contornos com volta de Trump

Maioria republicana no Congresso dos EUA quer cancelar acordo histórico com Pequim

Créditos: Xinhua -Presidente Xi Jinping e Donald Trump caminham para discutir mais questões de cooperação bilateral no resort Mar-a-Lago, na Flórida, Estados Unidos, em 7 de abril de 2017
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A guerra comercial dos EUA contra a China inicia uma nova fase desafiadora para Pequim com a vitória de Donald Trump para a presidência e a conquista de uma maioria do Partido Republicano no Congresso.

Os republicanos da Câmara dos EUA começaram a renovar a ideia de acabar com o status comercial preferencial da China. Eles estão promovendo o fim das Relações Comerciais Normais Permanentes (PNTR, da sigla em inglês) com a potência asiática. A ideia antes considerada improvável agora se torna mais provável.

Durante coletiva de imprensa do Ministério das Relações Exteriores da China desta segunda-feira (11), o porta-voz Lin Jian relembrou que após o acordo entre a China e os EUA sobre a adesão do país asiático à Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, Washington anunciou a concessão do status de relações comerciais normais permanentes à China.

"Alguns políticos estadunidenses estão tentando retroceder na história e trazer as relações comerciais e econômicas entre China e EUA de volta à era da Guerra Fria. Isso viola as regras da OMC e só prejudicará os interesses comuns de ambos os países, além de desestabilizar a economia global. Instamos alguns membros do Congresso dos EUA a respeitarem as regras da OMC e a pararem de dizer ou fazer coisas que não beneficiam ninguém", comentou.

Entenda o caso

Um porta-voz do Comitê da China da Câmara que não foi identificado, declarou à Fox News, veículo alinhado a Trump, que os republicanos dos EUA avaliam que o Partido Comunista da China (PCCh) se aproveita da abertura dos EUA com "práticas econômicas predatórias que afetam a economia, trabalhadores, empresas e segurança nacional".

"Acreditamos no livre comércio entre nações livres, mas, como recomendou o Comitê de forma bipartidária, chegou a hora de redefinir nosso relacionamento com a China, superando o PNTR para uma relação comercial que reflita a ameaça que enfrentamos do PCCh", disse o porta-voz.

Em 2000, o Congresso dos EUA votou para conceder à China o status de relações comerciais normais permanentes, mudando fundamentalmente as relações comerciais EUA-China. Consumidores estadunidenses ganharam acesso a produtos chineses a preços baixos, e o valor das importações da China quadruplicou entre 2001 e 2021, atingindo 500 bilhões de dólares.

Críticos do PNTR argumentam que ele permitiu que empresas transferissem sua produção para a China e que as tensões renovadas com Pequim podem levar a problemas nas cadeias de suprimentos.

Os defensores do PNTR afirmam que o fim do status causaria inflação, com a aplicação de novas tarifas sobre bilhões de dólares em produtos chineses.

O presidente eleito Donald Trump já propôs uma tarifa de 60% sobre todos os produtos chineses e o fim do status comercial favorecido da China. A revogação do PNTR reajustaria automaticamente as tarifas dos produtos chineses para níveis mais altos.

Trump poderia implementar grande parte de sua agenda comercial em produtos que considere uma "ameaça incomum e extraordinária" à segurança nacional ou à economia dos EUA.

A plataforma do Partido Republicano, divulgada em julho, pedia o fim do PNTR. Em setembro, um grupo de senadores republicanos apresentou um projeto de lei para acabar com o PNTR da China e aumentar as tarifas de muitos produtos para até 100%.

O projeto de lei, liderado pelo senador republicano Tom Cotton, do Arkansas, tem o apoio de senadores também republicanos Marco Rubio, da Flórida, e Josh Hawley, do Missouri, também concederia ao presidente Trump autoridade para instituir tarifas adicionais, cotas e proibições sobre produtos específicos da China.

"Tratamento minimis"

A ideia dos republicanos é acabar com o "tratamento de minimis" para a China, ou seja, o limite de valor abaixo do qual as importações não estão sujeitas a impostos alfandegários.

De acordo com o projeto de lei, a receita gerada iria para agricultores e fabricantes prejudicados por possíveis retaliações chinesas, para a compra de munições importantes para conflitos no Pacífico e para reduzir a dívida.

O "tratamento de minimis" é uma regra que isenta de tarifas aduaneiras e impostos de importação mercadorias que têm um valor abaixo de um limite determinado, conhecido como limite de minimis.

Nos Estados Unidos, por exemplo, o limite de minimis para importação está atualmente em 800 dólares. Isso significa que bens importados com valor inferior a esse limite geralmente podem entrar no país sem serem taxados. Essa política facilita a entrada de pequenos pacotes e compras internacionais, beneficiando consumidores e empresas que importam itens de baixo valor.

Em discussões comerciais, a remoção desse tratamento pode ser usada como medida de retaliação ou controle, como proposto em legislações recentes nos EUA para bens importados da China, o que implica cobrar tarifas sobre todos os produtos, independentemente do valor.

Acordo histórico

O status de Relações Comerciais Normais Permanentes (Permanent Normal Trade Relations - PNTR) foi concedido pelos Estados Unidos à China em 2001, quando o país asiático se juntou à Organização Mundial do Comércio (OMC).

LEIA TAMBÉM: Como a chegada da China à OMC mudou o comércio no mundo

Esse status permite que produtos chineses sejam exportados para os EUA com tarifas reduzidas e regulamentações comerciais padronizadas, em pé de igualdade com outros parceiros comerciais dos Estados Unidos.

A concessão do PNTR consolidou o acesso da China ao mercado estadunidense e, desde então, facilitou a expansão das relações comerciais bilaterais, impulsionando o comércio e a integração econômica entre os dois países.

O governo chinês vê qualquer tentativa dos Estados Unidos de revogar ou modificar o status PNTR como um retrocesso nas relações econômicas e comerciais entre os dois países.

Para Pequim, tal movimento seria uma violação das regras da OMC e prejudicaria os interesses comerciais de ambas as nações, além de gerar impactos negativos para a economia global.

Além disso, a China exorta o Congresso dos EUA a respeitar os acordos vigentes e a manter uma postura construtiva, alegando que qualquer deterioração nas relações comerciais pode resultar em perdas econômicas para ambos os lados e aumentar as tensões geopolíticas.

Perspectivas para a China com Trump

Em artigo publicado no jornal The New York Times desta segunda, o repórter Peter Goodman informa que a vitória de Trump sinaliza para uma nova onda de tarifas e pressão econômica sobre a China.

Enquanto se prepara para um novo mandato, com promessas de intensificar a guerra comercial com a China, Trump organiza a ofensiva comercial contra Pequim. Entre suas propostas, destaca-se a imposição de tarifas de 60% ou mais sobre todas as importações chinesas.

O país asiático, que adota uma política planejada, não vai ser pego de surpresa e acaba de lançar um pacote de estímulo à economia de 1,4 trilhão de dólares com redução da taxas de juros. Também expandiu seu domínio sobre tecnologias limpas, como veículos elétricos, o que o torna menos dependente dos mercados ocidentais.

A China continua a explorar novos mercados no Sul Global para compensar as perdas no Ocidente. Desde as tarifas de Trump em 2018, a potência asiática vem redirecionando exportações para países da Ásia e América Latina. Hoje, apenas 13% das importações dos EUA vêm da China, contra 20% em 2017.

Há anos a China tem se preparado para reduzir a dependência externa em áreas estratégicas. A ascensão do setor privado chinês, responsável por cerca de metade das exportações, oferece maior flexibilidade econômica ao país. A busca por autossuficiência é reforçada pelas restrições dos EUA sobre a tecnologia, que impulsionam a China a acelerar o desenvolvimento interno.

No final das contas, o tiro de Trump contra a China pode acabar saindo pela culatra e fortalecer a visão chinesa de autossuficiência e independência tecnológica.

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