O BDS, eles e nós.

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Por Thomas Farran

Israel continua a violenta campanha de punição coletiva que já matou dezenas e emprisionou centenas desde o último 12 de Junho, e que apenas no último dia deixou 24 mortos (6 deles, de uma mesma família e 7 crianças) nos bombardeios indiscriminados às áreas densamente populadas na Faixa de Gaza.
A campanha, que não é nova e nem uma "escalada", faz parte da agenda israelense desde 1948: limpar etnicamente todo o território palestino.
A desculpa sempre muda, o objetivo é sempre o mesmo.

Enquanto isso, a campanha não-violenta de resistência palestina para Boicotes, Desinvestimento e Sanções (BDS) à Israel ganha alguma força, apesar dos inúmeros obstáculos e frequente intimidação por parte daqueles que flertam com o homicida regime sionista.

O objetivo da campanha é simples: resistir e reclamar os direitos de todos os palestinos através de uma campanha global que visa atacar Israel onde mais lhe dói: o bolso.
Para isso o movimento faz uma brilhante campanha de conscientização sobre as condições de vida dos palestinos e dos crimes de guerra e contra a humanidade praticados rotineiramente por Israel (todos exaustivamente documentados e condenados por organizações e órgãos palestinos, israelenses e internacionais tais como o Tribunal Internacional de Justiça, a ONU, a Anistia Internacional e a Cruz Vermelha), e a pressionar empresas e instituições que estejam envolvidas nesses crimes - direta ou indiretamente.

Em países como Estados Unidos, Canadá, Irlanda, Escócia, Espanha, Inglaterra e África do Sul, centros acadêmicos das mais diversas universidades tem passado com sucesso resoluções que determinam o encerramento de parcerias, e desinvestimento de empresas israelenses ou que estejam envolvidas no aparato da ocupação, e o mesmo acontece em sindicatos que pedem pelo boicote e desinvestimento imediato de empresas israelenses que façam parte do portfólio de seus fundos de pensões.
Na Europa, 17 países (Alemanha, Grã-Bretanha, França, Espanha, Itália, Portugal, Áustria, Malta, Luxemburgo, Dinamarca, Irlanda,Grécia, Eslovênia, Finlândia, Bélgica, Eslováquia e Croácia)  têm recomendado aos seus cidadãos que boicotem ou desinvistam de empresas envolvidas em operações e/ou localizadas em colonatos israelenses.

Acadêmicos e instituições de todo o mundo, como Stephen Hawking, se juntaram ao boicote acadêmico à Israel, e artistas como Roger Waters, Elvis Costello, Stevie Wonder, Danny Glover, Emma Thompson e Viggo Mortensen aderiram, ou advogam, pelo boicote cultural da entidade sionista.

Em países como Argentina, Holanda e Portugal, a empresa estatal israelense de águas, Mekorot, teve seus contratos cancelados e prejuízo de milhões, após pressão de grupos dos direitos humanos e ativistas que pediam para que se parasse a cumplicidade desses governos com o sistema de apartheid infligido ao povo palestino.

Nos últimos meses, até tubarões financeiros, como Bill Gates, se viram obrigados a desinvestir de empresas relacionadas à ocupação israelense.

Cada vez mais abandona-se o mito perpetuado pela propaganda israelense, onde Israel é imprescindível para algum tipo de progresso no planeta, seja ele qual for.

Não é verdade. Nunca foi.

Nada do que foi, ou é, produzido em Israel não pode ser, ou é, produzido em outro canto do planeta.
A questão que sempre se levantou com esse mito é: E se fosse verdade? Valeria a pena o custo de tal "progresso"? Estaria você preparado para pagar esse "custo"?
Nesse caso, o custo é a ocupação e o sangue de gerações de palestinos que lhes têm negados os seus direitos mais básicos.

E cada vez mais, estar relacionado de alguma forma com Israel, com o governo israelense e com toda a sua agenda de ocupação e domínio racista, é vista pelo lado de fora como um risco, seja ele moral, financeiro ou de  imagem.

Essa é a imagem geral na mudança de cenário no debate da questão da Palestina.
A informação é acessível à qualquer um, e o próprio BDS tem sido um dos responsáveis pela difusão dessa informação, assim como o trabalho de ativistas, autores, acadêmicos e cineastas palestinos, e não só.
É um trabalho que não começou ontem, tão pouco terminará amanhã.

E no Brasil?

No Brasil se vê o uso da causa palestina como estandarte para algum tipo de engodo político, ou populista, e o desenvolvimento, de facto, da questão visto em outros lugares, não é repetido em terras tupiniquins.
Das autoridades, a atividade pela Palestina começa e termina em algum tipo de discurso, que normalmente é reciclado. O famoso tapinha nas costas.
Os poucos que genuinamente brigam por algum tipo de mudança, usualmente são ostracizados ou tratados como radicais.

Ser radical enquanto se advoga por direitos humanos?
Pois é. Como se existisse um consenso até onde se pode ir no ativismo pela Palestina.

Não ignoro aqui esses poucos que, com uma gigantesca pressão e contra todas as probabilidades, fazem um trabalho louvável. Longe disso.
O problema é, inclusive, em como esses são tratados. Mesmo porque eu faço parte desse grupo.

Enquanto isso:

O Brasil continua sendo o 5º maior cliente do complexo militar israelense, muito embora isso esteja em contradição com a constituição brasileira. (1)
O Brasil continua investindo em contratos com estatais israelenses (Mekorot / Sabesp / Caesb) (2)
O Brasil continua permitindo parcerias de instituições públicas e privadas do ensino superior com empresas do complexo militar israelense. (3)
O Brasil continua a permitir empresas israelenses envolvidas com financiamento do aparato militar sionista, como a Strauss (Café 3 Corações; Café Santa Clara) que orgulhosamente patrocina duas das mais violentas brigadas do exército de ocupação, Golani e Givati, responsáveis por inúmeras  violações dos direitos humanos, operem inquestionavelmente no país. (4)
O Brasil continua o intercambio cientifico com institutos públicos israelenses, envolvidos na ocupação. (5)
O Brasil continua a se valer do turismo religioso, para divulgar Israel como um destino exótico para férias e/ou estudos em uma localização "moderna" e progressista. (6 ; 7)

Ainda hoje foi divulgado mais um contrato entre o Exército Brasileiro e a israelense Elbit (por meio de sua subsidiaria ARES), para o fornecimento de 5,000 miras telescópicas para fuzis. (8)

Em resumo: o Brasil que se declara aos palestinos, é o mesmo que celebra Israel.

E mesmo com eleições adiante, o prognóstico para alguma mudança nesse posicionamento não é bom.

E isso tapinha nenhum nas costas consegue maquiar.

Quem paga por isso nós sabemos, mas quem se beneficia?