Mulheres que escrevem: uma conversa entre escritoras

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A literatura, assim como diversos outros espaços, continua majoritariamente masculina. Por isso, o que elas escrevem continua sendo visto como literatura de nicho, algo que interessa somente a mulheres, ou simplesmente uma literatura de menos valor. A escrita feita por mulheres não forma uma voz uníssona, somos humanas, justamente por isso, somos diversas. No entanto, a maioria de nós tem um problema em comum: lidar com o machismo e a insegurança que nos envolve por termos sempre que provar nosso valor. O projeto “Mulheres que escrevem” é uma conversa entre escritoras e mulheres que ainda não se nomeiam assim sobre essa insegurança, sobre processo criativo e o ato de escrever. Começou numa newsletter e hoje também está no Medium, Facebook e até mesmo em eventos presenciais. Por ser colaborativo e por trazer textos que possibilitam uma identificação, ele tem motivado mulheres a se sentirem mais confortáveis a se assumirem como escritoras. Conversei com as criadoras, Taís Bravo e Natasha R. Silva, sobre a origem do projeto e sua continuidade.

Como surgiu a ideia da newsletter "Mulheres que escrevem"? O que motivou vocês a criarem?

Costumamos dizer que a ideia veio de uma dinâmica que já acontecia na vida real. As angústias e as dúvidas que vêm com o processo de se reconhecer como escritora ficaram registradas nas mesas de bar, mensagens de Whatsapp e nas nossas caixas de e-mail. Com o tempo, observamos que essas inseguranças, inicialmente tratadas como confidências entre amigas, fazem parte de um problema muito maior.

Então, veio a ideia da newsletter. Queríamos envolver mais mulheres nesse processo de compartilhar as angústias e as vitórias, principalmente porque vemos nessa troca uma maneira de não desistir de escrever. O objetivo é esse: apoiar outras mulheres que escrevem, enfrentando assim as desigualdades de gênero e a falta de representatividade feminina que nos afeta diariamente. Hoje vocês estão também no Medium, tem página no facebook, no twitter e tem encontros presenciais, mas a newsletter segue sendo o "carro-chefe" do projeto, né? Por que vocês escolheram essa ferramenta? Como duas amigas de longa data, que agora vivem um relacionamento a distância, trocamos muitas mensagens. Às vezes a angústia ou a inspiração são intensas e demandam mais espaço, então, escrevemos emails. Entre as burocracias, compromissos e promoções de nossas caixas de entrada, abrimos espaço para afeto e vontade. Quando resolvemos envolver outras mulheres nessa troca, pareceu uma escolha natural escolher o formato intimista de uma newsletter. Assim, em setembro de 2015, criamos a Mulheres que Escrevem, uma newsletter semanal e colaborativa, feita por muitas mulheres além de nós. Atualmente, também fazemos uso de outras plataformas e formatos em nosso projeto. Contudo, a newsletter ainda é nosso carro-chefe, porque é um espaço mais acolhedor e seguro para conversamos francamente sobre os desafios de nosso trabalho enquanto escritoras.

Como aconteceu a expansão para os encontros presenciais? Como faz para participar? O que são esses encontros?

A decisão de fazer os encontros foi uma evolução natural do projeto. Quando decidimos começar a newsletter e depois passamos para a página no Facebook, tínhamos a certeza de que o objetivo principal do projeto sempre teria que ser construir um espaço de confiança e troca para mulheres, o que, obviamente, também era um lugar confortável para nós mesmas.

A realidade superou os nossos planos e fomos recebidas com um engajamento tão bom nesses espaços que decidimos investir ainda mais nessa iniciativa. Depois de muitos sonhos e alguns ensaios, decidimos que era a hora de nossas conversas ultrapassarem os limites virtuais, então criamos os encontros.

O modelo é simples: convidamos escritoras para conversar sobre diferentes temas relacionados ao processo de criação e nos encontramos em um lugar para, basicamente, trocar ideias e estímulos. A única coisa que pedimos é que as pessoas interessadas preencham um formulário. Isso nos permite conhecer um pouco mais o trabalho e os projetos de outras mulheres e planejar melhor cada encontro.

O projeto construiu um espaço que motiva mulheres que escrevem se definirem como escritoras, se sentirem mais confiantes com seus trabalhos e confortáveis em escrever publicamente. Vocês, como idealizadoras, também sentem mais confiantes nesse aspecto depois de mais de um ano de projeto?

Natasha: Com certeza. Não vou dizer que superei todas as questões com relação a quem sou como escritora porque também não se trata de ter encontrado uma solução milagrosa. Isso não existe. Mas a Mulheres que Escrevem nasceu para ser um espaço de escuta e respeito… E funciona. Como mulheres, nos acostumamos a não ter espaço para levantar a voz, a ser silenciadas diariamente de uma maneira ou de outra. Ser ouvida é libertador e acredito que contribui para fortalecer a identidade de qualquer mulher como escritora.

Taís: Sim! Sendo muito sincera, às vezes parece que a insegurança faz parte do trabalho de ser escritora. Há muitas dúvidas e questões ao longo dessa trajetória profissional. É difícil não se questionar em um mercado tão difícil que sempre desvaloriza esse tipo de ofício. Além disso, autocrítica, em alguma medida, é saúdavel e importante para nos manter em movimento criativamente. Desde que criamos a Mulheres que Escrevem me sinto mais confiante para lidar com essas inseguranças, porque me sinto cercada por companheiras e interlocutoras que me apoiam durante esse processo. Acho que agora consigo reconhecer que as dificuldades fazem parte e me sentir confortável para lidar com elas com mais calma, gentileza e fôlego. Vocês tem planos de expandir ainda mais?

Sim. Nosso maior objetivo é ser uma iniciativa que promove a partir de curadorias, publicações, oficinas e debates novas possibilidades de produção cultural e literária.

Como temos muitos planos para o futuro, também temos mais gente se juntando ao projeto. Há pouco outras duas escritoras se juntaram a nossa equipe: Estela Rosa e Laura Pires. Com elas, pretendemos potencializar a nossa página do Medium e oferecer mais eventos, sejam eles encontros, oficinas ou debates. Estamos planejando muita coisa para 2017. Tudo isso sem deixar de lado a newsletter, claro, que sem dúvidas só irá melhorar a partir disso.

Por Thaís Campolina