Piadas velhas, malas de ninguém e conversa para boi dormir

É! Com tanta facilidade que os computadores oferecem, é fácil fazer uma montagem com uma foto como aquela. As impressões digitais do sujeito nas notas e nos pacotes? Ah, isso é bobagem. Ficção também. Outra montagem.

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É! Com tanta facilidade que os computadores oferecem, é fácil fazer uma montagem com uma foto como aquela. As impressões digitais do sujeito nas notas e nos pacotes? Ah, isso é bobagem. Ficção também. Outra montagem. Por Mouzar Benedito* Lá se foram mais de 50 anos... Mas eu me lembro ainda – embora parcialmente – de algumas piadas dos meus tempos de criança. Algumas pessoas chegavam a imprimir piadas em uma folha de papel (em gráfica, não havia computadores e nem mesmo máquinas de xerox) e distribuir. Uma dessas piadas impressas era sobre dez homens que viajavam no mesmo vagão de um trem – só por aí já dá pra ver que é piada velha, pois viagem de trem é coisa rara no Brasil de hoje. Restam poucas ferrovias “de longa distância” como se chamam as que não se restringem a áreas metropolitanas. Bom, os dez homens eram um de cada profissão. Não me lembro de todos. Aí vai a relação dos profissionais de quem me lembro: caixeiro-viajante, médico, padre, marujo, advogado e telegrafista. Então, só me lembrei de seis e um deles de uma profissão que acho que não existe mais, telegrafista. Vou contar aqui o que me lembro dessa piada, mantendo o telegrafista, mas achando que ele poderia ser substituído por um sujeito dos tempos atuais, um cara ligado na internet, que tem instagram, facebook e tudo quanto é coisa nessa linha. Lá vai a história. Quando estavam em silêncio, o caixeiro-viajante soltou um peido bem sonoro. Ficou aquele clima esquisito e o médico resolveu quebrar o silêncio, explicando: “São gases provenientes da fermentação intestinal”. Aí, cada um foi dando explicações, de acordo com suas profissões. O padre: “É a alma do feijão subindo ao céu”. O advogado: “É o grito de um sentenciado clamando por liberdade”. O marujo: “É a voz do canhão impondo-se pelas liberdades democráticas”. E o telegrafista (que poderia ser substituído pelo ligadão na internet) concluiu: “É um aviso urgente que a merda vem chegando”. Depois dessa piada, lembrei-me de uma outra também daqueles tempos, mas não impressa. E era uma época mais moralista, em que pessoas flagradas transando em público iam em cana. Lá vai esta também. Um carro de polícia passava ao lado de um terreno baldio e os policiais viram nesse terreno um sujeito com o pinto fora da calça, ereto. E uma moça já estava deitada no chão, com a saia levantada. Deram um flagra neles. O policial fez uma pergunta óbvia: “O que você está fazendo aqui com o pinto de fora?”. Com a maior cara de pau, o sujeito respondeu: “Eu ia urinar”. Nova pergunta do policial: “E essa moça deitada na sua frente?“. O cara não titubeou: “Puxa... Se o senhor não me avisasse, eu mijava nela”. Pois é. Esta última remete a três coisas recentes que eu não sei se são piadas ou se são sonhos que tive. Uma delas é de um cara acusado de ter contas com milhões e milhões em bancos do exterior, com dinheiro fruto da corrupção. Mas ele garante que não tem nem nunca teve conta bancária no exterior. Uma vez, foi preso em Paris, quando tirava dinheiro de um banco, num valor bem alto, suspeito. Solto, se mandou para cá e continuou negando que tinha conta no exterior. Mais tarde, autoridades internacionais identificaram uma conta como sendo dele, recheada com dinheiro de propina, e mandaram esse dinheiro para autoridades brasileiras. Mas o sujeito continua jurando: não tenho nem nunca tive conta no exterior. A segunda é de um sujeito que recebeu em sua casa, de madrugada, um mutreteiro para conversar sobre coisas que fizeram e fariam. Só que o mutreteiro gravou a conversa, em que continha algumas inconveniências. Aí, o outro fez pose de indignado. Esse mutreteiro, ameaçado de ir em cana, contou à Dona Justa que tinha prometido dar uma mala de dinheiro por semana ao outro. Propina por alguns favores recebidos, claro. E para provar, gravou um vídeo entregando uma dessas malas a um enviado do outro. Mas, era, jurou o outro, e uns amigos dele referendaram, tudo mentira. O enviado não foi mais ouvido ou visto, e o homem que receberia uma grana dessas por semana – coisa pouca, só R$ 500 mil – foi inocentado, com direito a continuar fazendo pose de injustiçado. Para terminar, num apartamento de um sujeito foram encontradas caixas e malas cheias de grana – um pouquinho a mais do que o que tinha na mala de que já falei: coisa de R$ 52 milhões. – “Ficção”, esbravejou o suposto dono dessa graninha que talvez tenha sido juntada em anos de trabalho honesto, colocada em cofrinhos, depois debaixo do colchão... “De grão em grão, a galinha enche o papo”, poderia dizer. “E de tostão e tostão eu enchi um apartamentinho de dinheiro“. Mas não foi o que disse, e sim “Isso não existe”. É! Com tanta facilidade que os computadores oferecem, é fácil fazer uma montagem com uma foto como aquela. As impressões digitais do sujeito nas notas e nos pacotes? Ah, isso é bobagem. Ficção também. Outra montagem. Mas como essa grana parece que não é de ninguém, que apareceu ali por mágica, quero aqui contar mais uma historinha e fazer uma reivindicação. Nestes tempos em que conversa pra boi dormir são engolidas numa boa, dependendo de quem é o conversador, vou falar da origem e do dono de um pouco da grana geddeliana. Quem sabe, cola. Lá vai: uma vez, viajando para o exterior, ganhei uma baita grana em dólares, na loteria. E trouxe para cá. A mala ficou abarrotada de dólares. Eu ia declarar tudo à Receita Federal, pagar os impostos e ficar com o resto, mas passei pela Bahia e me hospedei no apartamento de um sujeito que eu não conhecia, um gordinho que falava que era muito honesto. Alguns dias depois, tomei um porre e me mandei pra São Paulo, esquecendo a mala de dólares lá. Nem me lembrava do endereço nem do nome do sujeito, por isso nunca falei nada sobre isso. Agora me lembrei... Atenção Polícia Federal: uma daquelas malas, cheia de dólares, é minha. Por favor, desconte os impostos de repatriação de grana e me entregue o resto. Pretendo fazer uma festa... * Mouzar Benedito, mineiro de Nova Resende, é geógrafo, jornalista e também sócio fundador da Sociedade dos Observadores de Saci (Sosaci). Foto: Polícia Federal