Meritocracia em pleno Dia do Mestre?

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Organizar a escola como negócio é uma péssima ideia. Supor que o professor está aquém e maltratá-lo até que prove as suas “competências” é profanar uma atividade venerável. das próximas vezes em que falar em educação, professor e comunidade escolar, candidato Aécio Neves, lembre-se de gente e não de gerente Celebremos o dia 15 de outubro de 2014. Não vai cair na prova, só na querela entre os candidatos à Presidência da República! No debate entre os presidenciáveis (Band, 14/10/14) quando foi perguntado sobre educação, surgiu sonoramente o termo "meritocracia". Conceito típico das empresas. As gratificações ficam condicionadas às produções. A maneira gerencial de elaborar e monitorar as políticas públicas. A velha concepção de que o Estado é um mal necessário governado por uma junta de notáveis que estabelecem metas e eventualmente distribuem “bondades”. Organizar a escola como negócio é uma péssima ideia. Supor que o professor está aquém e maltratá-lo até que prove as suas “competências” é profanar uma atividade venerável! Permita-me neste 15 de outubro de 2014 SIMULAR conversas com os mestres. Será que eles sabem o que é meritocracia? Mestre Paulo Freire, o professor Luther não conseguiria bater a meta. Ele resolveu ensinar para vida. Professor de Filosofia na Cidade de Três Rios (RJ). O chamariam de arrogante por não se enquadrar nas mensurações mesquinhas rabiscadas por gerentes que só pensam através de gráficos. Sempre que o contexto exige desvia-se do “programa anual” para ser certeiro com o ponteiro existencial. Nunca pergunta o que a molecada quer ser, pois compreende que eles já são. Choveu dentro da sala de aula. O professor em ato de santa ousadia lecionou com o guarda-chuva aberto. O Luther não teria chance com a meritocracia. Mestre Darcy Ribeiro, a professora Aurideia não alcançaria os resultados esperados nessa lógica. São duas horas para chegar à escola. Desloca-se num pequeno barco pelas águas escuras do Rio Canaticu, município de Curralinho (PA). Comunidade de ribeirinhos. Ninguém chega à escola nadando ou através de transportes terrestres. Sequer de bicicletas. A mata densa amansa a fala. Meigamente índia nativa. Diriam que ela recusa-se a reciclar-se. Mas até Belém (PA) são dezesseis horas no pequeno barco e onde mora não há “sinal de internet”. Ao retornar para sua casa no barco escolar, observa cada aluno que vai ficando. Casas sem portas e janelas. A professora Aurideia cairia em exigência e não ganharia o bônus da meritocracia. Mestre Milton Santos, uma outra globalização é possível? O professor Ulisses leciona educação física no Capão Redondo (SP). Dia desses, um menino chegou armado para a aula e se impôs como titular. O professor disse que se fosse dessa forma o valente entraria e ele sairia de campo para jamais voltar. Detalhe que o Ulisses ia para o campo de futebol depois do horário formal da sua aula. Trabalho voluntário. Os outros meninos foram para cima do marrento e o desarmaram de todas as formas. Atualmente, o Chico é titular do time de futebol treinado pelo Ulisses, ganhou a posição na bola, com méritos. No entanto, o professor ocupado com cidadania das boas, pelo que eu o conheço, descuidaria das formalidades, perderia prazos, deixaria de fazer atividades cosméticas e zombaria dos rankings. Esse ser humano generoso, educador da quebrada, seria desqualificado e não usufruiria do plus salarial. A meritocracia aponta para os “melhores”. A Sônia é especial. O seu aluno, quase que exclusivo, está com quatorze anos e ainda não lê “devidamente”. Quando o Pedro a encontra em sala de aula, ele grita e se contorce. Pura e genuína alegria. Gestual marcado por membros do corpo que não são responsivos à mente. Desarmonia entre vontades e acontecimentos. Cinco horas de cuidados especiais. Cantam e dançam ao modo deles. Celebram a vida e comemoram conquistas. Este aluno com paralisia cerebral mudou a vida da professora do município de Cariacica (ES). Depois dos pais, Sônia é o grande elo do Pedro com a vida. Querida mestra Zilda Arns, meritocracia não é algo com que a Sônia contaria. Para ela, o Pedro é um desafio constante. Arte do encontro que a humaniza. Isso basta! Sinceramente, espero que das próximas vezes em que falar em educação, professor e comunidade escolar, candidato Aécio Neves, lembre-se de gente e não de gerente. A propósito, o chefe da economia num virtual governo tucano já foi anunciado. Posso entender que essa será a prioridade? Sem querer ofender, quem seria o gestor do Ministério da Educação que daria ao Brasil o tom e a cor da meritocracia? Posso inferir que para Aécio a educação de fato é uma questão menor? Foto de capa: Arquivo/Agência Brasil