Perca tempo para não perder pessoas

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Tudo o que você tiver de fazer, faça o melhor que puder, pois no mundo dos mortos não se faz nada, e ali não existe pensamento, nem conhecimento, nem sabedoria. E é para lá que você vai (Eclesiastes 9.10) Se necessário for, perca tempo para não perder pessoas! O sentimento de perda é conhecido por todos nós. O pesar comum é que tivemos algum tempo com algumas pessoas, e de uma hora para outra, não as temos mais como antes. Concluímos que poderíamos ter aproveitado mais o tempo em que estivemos juntos. A maneira mais contundente desse tipo de pesar se manifesta diante da morte de pessoas amadas. Bate uma saudade grande! Um misto de emoções; o insistente pesar de que poderíamos ter aproveitado mais a companhia daquele que se foi. Achamos até que, por mais que o tempo tenha sido bem aproveitado, não foi o suficiente para expressar ao falecido o quanto o amávamos. O divórcio é também um rompimento drástico que deixa na boca o gosto amargo da neutralização do amor. Para uns, o tempo não foi suficiente para vivenciar o amor; para outros, o tempo foi desperdiçado tentando amar. Neste nosso tempo, tem sido bastante comum desconhecer quem está ao lado, pois os olhos se põem lá adiante, onde o vento faz a curva. Daí, muitas preferirem correr atrás do vento a amar quem está ali, pertinho. O sábio do livro de Eclesiastes diz logo de início que fez e aconteceu; mas não fala de pessoas amadas. Não fala sobre sentir-se amado por alguém. Ele diz, sim, que teve muito prazer sexual – mas era um solitário. No capítulo nove, o pensador aconselha seus leitores a nutrir relações estáveis e profundas. Numa linguagem moderna, ele nos aconselha a nos ocuparmos na medida certa, para não erramos na mão na hora de amar. Uma terceira modalidade deste sentimento de que perdemos tempo não amando o tanto quanto devíamos está relacionado à separação espacial. Em termos práticos, é quando os filhos crescem, se casam, vão trabalhar em outra cidade… E os pais os veem saindo e pensam: “Mas logo agora que a vida está mais sossegada e temos mais tempo para eles…” Outros se dão conta de que os filhos cresceram e eles não viram, que passou rápido demais: “Eu estava tão ocupado que não vi meus filhos crescerem!” É provável que a vida moderna acabe por ocasionar este sentimento em nós, de alguma forma. Agora, não podemos nos acomodar e justificar a situação dizendo simplesmente que “é assim mesmo”. Como o conselho do sábio: “Goza a vida com a mulher que amas.” Depreende-se que o bem viver, na concepção do escritor de Eclesiastes, é saber amar e é saber-se amado. O que vem depois é lucro! O que mais gosto neste conselho é que ele não sugere uma solução mirabolante. Importa apenas fazer do cotidiano algo significativo, desfrutando dos momentos felizes que passamos com as pessoas amadas. Importa desacelerar, para não deixar para trás as pessoas que dão sentido às nossas vidas. Chegou o momento de amadurecermos as nossas relações através da valorização das diferenças, e não das tentativas de mudar o outro. Que o outro seja amado, ainda que não se amolde à nossa preferência. Em momento algum os sábios conselhos nos convidam para sermos iguais, ou pensarmos todos as mesmas coisas. Não; o que eles nos dizem é que, a despeito das nossas diferenças, devemos ter unidade. Isso porque o que nos une, presume-se, é algo maior do que aquilo julgamos importante na nossa individualidade. Conta-se que, numa carpintaria, houve uma acalorada assembleia. Os utensílios discutiam qual deles deveria liderar os outros. O martelo se candidatou, mas os demais achavam que ele era inadequado, pois golpeava o tempo todo, além de fazer barulho. O martelo aceitou retirar a sua candidatura, mas disse que o parafuso não poderia exercer a presidência, pois dava muitas voltas para conseguir as coisas. E todos concordaram com ele. O parafuso mostrou sua contrariedade, mas conformou-se com a decisão. Com a palavra, argumentou que a lixa também não poderia exercer a liderança, devido ao seu modo áspero de ser. A lixa provocava muitos atritos com o seu jeito, argumentou. E quanto ao metro? Também não. Acharam que ele jamais seria um bom chefe, pois tinha o hábito de medir os outros segundo suas próprias medidas, o que causava grande desconforto. A discussão foi abruptamente interrompida quando o carpinteiro entrou na oficina. Juntou as ferramentas e começou o seu trabalho. Utilizou o martelo, a lixa, o parafuso e o metro, e a rústica peça madeira transformou-se num lindo móvel. Os instrumentos, então, compreenderam que o hábil carpinteiro utilizou as qualidades de cada um, e não os seus muitos defeitos. Perceberam ainda que, unidos, poderiam suprir as faltas uns dos outros. Somos treinados, ou melhor, domados, por uma ordem social que nos impele a viver a buscar a todo o tempo coisas mirabolantes, impressionantes mesmo, para mexer com a rotina de todos que vivem ao nosso redor. Queremos ter sempre algo original para dizer ou saber de um lugar maravilhoso para levar os que andam conosco até lá. Assim, assumimos com satisfação a necessidade de tentarmos ser merecedores do primeiro pedaço do bolo na festa de família ou da confiança dos superiores na empresa. Estamos cansados de tanto tentar. Que tal, então, começar a viver momentos singelos com as pessoas amadas, ocasiões em que nos basta ser exatamente aquilo que somos? Saboreie bem detidamente instantes simples de felicidade ao lado de gente a quem você quer bem. Qual foi a última vez em que, diante dessas pessoas que lhe são caras – as mais caras –, você se permitiu um longo tempo de silêncio compartilhado? Toques. Olhares detidos. Os sentidos todos em floração. Goza a vida com as pessoas que você ama, pois esta é a melhor forma de ganhar tempo! Feliz Natal! Que Jesus seja uma realidade boa na sua vida Meditação adaptada do livro “Mosaico da Espiritualidade”.