A TV Globo pode cair?

Escrito en BLOGS el
Nos meus estudos sobre o modelo de negócios da TV aberta no Brasil frente aos desafios impostos pelas tecnologias digitais, cheguei a um ponto crítico: as emissoras de TV aberta do Brasil podem fechar? Podem sim, e por uma questão simples, elas são empresas como quaisquer outras e estão sujeitas aos mesmos princípios que regem a viabilidade econômica de uma empresa de qualquer setor do mercado.

E quais são estes princípios? No livro “Como as Gigantes Caem”, Jim Collins, professor e consultor administrativo nos EUA, apresenta casos de empresas que foram líderes em seus setores de atuação, mas que por diversos motivos, caíram e quase faliram. O livro é fruto de uma extensa pesquisa, devidamente detalhada, e apresenta cinco estágios de declínio pelos quais trilham as empresas que, por algum tempo conheceram o sucesso, mas agora enfrentam a morte financeira, a saber:

1 – estágio: o excesso de confiança proveniente do sucesso;
2 – a indisciplinada busca por mais;
3 – a negação de riscos e perigos;
4 – a luta desesperada pela salvação;
5 – a entrega a irrelevância ou à morte.

Ao cruzarmos as idéias de Collins com o cenário atual enfrentado pelas emissoras de TV aberta no Brasil é possível verificar que nossas emissoras estão enfrentando algum desses estágios. Emissoras como a TV Globo, que já passou pelos estágios um e dois e que agora vivencia o terceiro estágio. A RedeTV que está vivenciando o primeiro estágio e a TV Bandeirantes e o SBT que experimentam o terceiro estágio. Se nada for feito, se nenhuma estratégia for elaborada para adpatar-se às tecnologias digitais, certamente as emissoras irão experimentar o quarto estágio. Chegar ao quinto é último estágio só depende da gestão.


Ponto importante nesta discussão, é que as discussões sobre a sobrevivência da televisão estão centradas no papel da TV na vida das pessoas. Pouco se tem discutido do ponto de vista empresarial, ou seja, as emissoras de TV estão sujeitas às condições de mercado, concorrência, crises financeiras, má gestão de recursos, crises de imagem, investimentos em produtos pouco atraentes e outros. Como afirma Collins, se ela é uma empresa, ela pode cair.

“Acontece que o declínio é, em grande parte, auto-imposto, e o caminho para a recuperação está em nossas mãos. [...] Todas as empresas passa por altos e baixos e mostram sinais de estar no Estágio 1 ou 2, ou até mesmo no Estágio 3 ou 4, em algum ponto de sua história. Mas o estágio 1 não leva inevitavelmente ao Estágio 5”.

De um modo geral, entendo que as emissoras de TV aberta no Brasil estejam vivenciando o estágio 3º e começando a entrar no 4º estágio. Isto porque, mesmo com inúmeras indicações, parece que as emissoras não estão dando a devida atenção aos sinais de que tudo está em plena transformação no mundo da comunicação. O consumo de produtos audiovisuais por parte dos usuários, as tecnologias de distribuição de conteúdo, o conceito da publicidade segmentada e sob demanda, a legislação (PL -29) e a oferta de empresas na distribuição de conteúdo por assinatura. Talvez porque 2010 seja um ano atípico. É ano de Copa do Mundo de Futebol e eleição do executivo nacional e estadual. Com isso, os investimentos em publicidade crescem e podem esconder o que vem por ai, apesar do diretor da Globo, Luiz Gleiser, afirmar em recente evento em São Paulo que “a gente já sabe há algum tempo que a TV aberta está mudando de natureza, está perdendo o monopólio do conteúdo”. (Leia matéria completa)

Nos EUA e na Europa as coisas não estão diferentes. Luís Marques, diretor-geral da SIC, rede de TV portuguesa, afirmou: na Europa há a sensação de que a televisão "está à beira da extinção". "Parece que aquilo que fazemos perdeu sentido. Há algo de novo, que não sabemos exatamente o que é, que se impõe" (Leia matéria completa)
O pesquisador Valdecir Becber, em recente participação no EuroITV definiu em seu blog o atual estágio das coisas por lá: “O foco das pesquisas em televisão na Europa está na TV on line (TV conectada, broadband TV, como preferirem), baseada em uma realidade onde praticamente 100% da população tem acesso à internet por banda larga. O foco é a TV social, com recursos de comunicação interpessoal incorporados aos receptores. A interatividade através de software embarcado no receptor (caso do Ginga no Brasil) é tratado como modelo ultrapassado e, com exceção da Inglaterra, como modelo sem sucesso”.

Entretanto, nem tudo está perdido, há caminhos que podem ser trilhados para que as emissoras de TV aberta vençam esta transição. Mas é preciso um esforço muito grande, adoção de novos paradigmas e perdas de privilégios históricos. E isto, ninguém quer. Então, de acordo com Collins, só resta o 5º estágio.

Jim Collins
Como as Gigantes Caem: e por que algumas empresas jamais desistem. 
Rio de Janeiro, Elsevier, 2010.