DIÁRIO DA CHINA

A vulnerabilidade de desconhecer o idioma e o alfabeto chinês

Vivenciar uma experiência simples como ir às compras me fez sentir na pele a situação de uma pessoa que não é alfabetizada

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Neste sábado (30), meu dia de folga, fui às compras em Beijing. A pessoa que presta assistência aos jornalistas que participam do programa oferecido pela Associação Chinesa de Diplomacia Pública, que eu considero uma verdadeira anjinha de guarda, chamada Ma (o nome dela para os ocidentais), acompanhou a mim e mais duas colegas, uma da Costa Rica e outra da Guiana, para um shopping na capital chinesa.

Shopping em Beijing

Como tudo em Beijing, o local é gigantesco e tem vários prédios. O primeiro no qual fomos foi o que concentra marcas europeias. Definitivamente não era o meu lugar, um único par de sapato do qual gostei custava mais de 2 mil reais. Tá doido. Procurei, com a ajuda de Ma, a área com as marcas mais populares e consegui comprar os itens que precisava.

Essa compra não estava nos meus planos. Mas minha bagagem com meus calçados e bolsas e itens de higiene foi trocada no voo de Brasília para São Paulo. Até agora a companhia aérea, Latam, não conseguiu ter a competência de sequer me dar uma satisfação se um dia conseguirei recuperar a minha bagagem. Bom lembrar que o outro passageiro está passando pelo mesmo perrengue que eu. 

Sigo na expectativa de que o status dos comunicados da Latam, sem uma gota de compromisso com o cliente, mude de "estamos analisando a situação" para algo mais informativo. O contato com o atendimento deles tem sido horrível e reforçou meu verdadeiro horror ao uso do gerúndio, que para mim indica que nada avança. Vocabulário de procrastinador. Tenho cada vez menos esperança de reaver meus itens que foram escolhidos a dedo para essa viagem tão especial e com os quais tenho apego afetivo. Se depender de mim nunca mais embarco num voo dessa cia mequetrefe.

Decidi que esse episódio não vai estragar a minha viagem. Como me restou apenas um par de tênis e uma bolsa preta, comprei três pares de calçados, dois mais formais e uma sapatilha, e uma bolsa bege para revezar com a que ficou comigo. 

Minhas compras na China.

Eu fiz minhas compras sozinha, a Ma ficou em uma cafeteria e sempre on line para auxiliar no que fosse preciso. A comunicação com os vendedores foi até simples, nada que gestos não resolvam e sempre tem o aplicativo de tradução para ajudar. 

Compras feitas, fomos almoçar um prato tradicional chinês, o hot pot. No centro da mesa há recipientes com molhos variados e ferventes nos quais você mergulha peixe, carne ou legume até cozinhar. A dinâmica me lembrou o fondue. Simplesmente delicioso. O chá servido também era incrível, feito de ameixas mas que me remeteu ao gosto do xarope de guaraná que há no Brasil. 

Almoço no restaurante Haidilaohuoguo, onde degustei um tradicional prato chinês, o hot pot. 

Na segunda etapa das compras eu fui a um supermercado enquanto a Ma acompanhava outro grupo de jornalistas que participam do programa durante uma entrevista. Eu precisei comprar uma bateria para carregar o meu celular, pois sem o tradutor on line eu seria incapaz de diferenciar um detergente de um chá.

Além disso, eu só consigo acessar os locais públicos e usar transporte como táxi, metrô e trem em Beijing com um aplicativo da cidade que prova que estou livre de covid, o Health Kit. Isso sem falar nos pagamentos, feitos por meio de aplicativos. No meu caso, o AliPay.

Health Kit e AliPay são aplicativos de primeira necessidade.

Durante minhas compras solitárias no mercado, eu me dei conta de que eu sou uma completa analfabeta na China. Não sei absolutamente nada do idioma e sequer conheço o básico do alfabeto. E fui tomada por uma imensa angústia, turbinada pelo cansaço e a dor no quadril de caminhar durante horas. Foi difícil segurar o choro.

Nessas reflexões eu pensei muito sobre o quanto deve ser difícil para as pessoas não alfabetizadas exercerem os direitos de cidadãs. Atualmente, inclusive, não basta saber ler e escrever, é preciso saber lidar com tecnologias que não param de inovar. A China tem feito um trabalho monumental de inclusão digital

Gostaria muito que esse exemplo fosse seguido pelo Brasil, mas desafortunadamente estamos vivendo um período de trevas em que sobram recursos para orçamento secreto para distribuir para aliados desse (des)governo e para uso sigiloso de cartão corporativo, mas falta dinheiro para garantir acesso à internet nas escolas públicas país afora e para manutenção das universidades, por exemplo. Situação para elevar ao grau máximo a indignação dos verdadeiros patriotas brasileiros.

No caso do mandarim, o idioma chinês, o que me acalenta o coração é saber que, a despeito de toda a sinofobia desvairada que corre solta no ocidente e que é impulsionada pela família do (des)presidente brasileiro, ainda há esperança na nova geração. Como o caso da querida Lorena Squeff Martins, de 11 anos, que mora em São Paulo (SP) e há um ano e meio cursa chinês numa escola chamada 'Made in China'.

Lorena tem 11 anos e há um ano e meio estuda mandarim.

A Lô é filha de uma amiga muito querida, Larissa Squeff, e desde que soube da minha aventura na China me mandou várias mensagens. Ela me contou que decidiu estudar mandarim logo no início da pandemia da Covid-19, em 2020, depois que sonhou que estava na China. Ela planeja ser designer de moda e quer atuar no gigante asiático. No sonho, ela ministrava uma palestra em mandarim para um público chinês. 

Depois de ler a edição do 'Diário da China' na qual abordei algumas curiosidades sobre Chengdu, a cidade onde cumpri minha quarentena antes de vir para Beijing, ela gravou um vídeo no qual se apresenta e deseja feliz aniversário aos gêmeos pandas gigantes que moram em um santuário localizado no meu primeiro destino chinês. 

Neste vídeo ela se apresenta, diz o nome dela em mandarim, conta que é minha amiga, que ama a China e a comida chinesa e deseja feliz aniversário aos bebês pandas gigantes. 

 

Sei que estou devendo um vídeo do meu latifúndio de um quarto em Beijing. Esta semana eu vou providenciar e mostro com detalhes para vocês. Também pretendo fazer um texto detalhado sobre os supermercados na China.

Até amanhã!