Bechis: Serviço secreto francês conspira contra Gadaffi desde novembro

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Ação secreta: França estava preparando a derrubada de Gaddafi desde novembro Por: Franco Bechis*, Roma, Itália, VoltaireNet, Tradução: Victor Farinelli

25/03/2011

Segundo o jornalista da direita liberal italiana Franco Bechis, os serviços secretos franceses prepararam a revolta de Bengazi desde novembro de 2010. Como assinala Miguel Martinez no sítio web progressista ComeDonChisciotte, estas revelações, apoiadas pelos serviços secretos italianos, devem ser interpretadas como uma mostra da rivalidade no seio do capitalismo europeu. A Rede Voltaire detalha que Paris rapidamente agregou Londres ao seu projeto de derrocamento do coronel Gaddafi (força expedicionária franco-britânica). O plano foi modificado no contexto das revoluções árabes e Washington tomou, então, o controle do mesmo, impondo seus próprios objetivos (contrarrevolução no mundo árabe e desembarque do AfriCom no continente negro). A atual coalizão é, portanto, o resultado de ambições diversas, o que explica suas contradições internas.

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O ex-companheiro de Kadhafi, Nuri El-Mesmari Masud, desertou em 21 de outubro de 2010. Ele está atualmente sob a proteção dos serviços secretos franceses.

Primeira etapa da viagem, 20 de outubro de 2010, Tunísia. Ali desceu de um avião da Libyan Airlines, com toda a sua família, Nuri Mesmari, o chefe de protocolo da corte do coronel Muamar Gaddafi. Se trata de um dos peixes grandes do regime líbio e esteve desde sempre junto ao coronel.

Era o único, junto com o ministro de Relações Exteriores Mussa Kussa, que tinha acesso direto à residência de Gaddafi sem ter que tocar a campainha antes de entrar. Era o único com direito a passar pelo batente da suite 204 do velho círculo oficial de Bengazi, onde o coronel líbio recebeu, com todas as honras, o primeiro ministro italiano Silvio Berlusconi, durante a visita oficial deste à Líbia.

A visita de Mesmari à Tunísia não dura mais que algumas horas. Não se sabe com quem se reunia na capital, onde já se percebia o burburinho da revolta contra Ben Ali. Hoje se sabe com certeza que durante essa estância Mesmari estabeleceu ali os contatos para o que seria convertido, em meados de fevereiro, na rebelião da região de Cirenaica. E preparou a estocada contra Gaddafi buscando e obtendo alianças nas duas frentes. Primeiro, a da dissidência tunesina. Segundo, a da França de Nicolas Sarkozy. Dois alianças que estabelece com êxito.

Sarkozy e Gaddafi

Tudo isso é demonstrado por documentos da DGSE, o serviço secreto francês, e por uma série de notícias sensacionalistas que circularam nos meios diplomáticos franceses a partir do boletim confidencial Maghreb Confidential (do qual existe uma versão sintetizada e acessível somente a assinantes).

Mesmari chegou a Paris no dia seguinte, 21 de outubro. De lá n4ao sairá mais. Na Líbia, Mesmari não havia ocultado sua viagem à França, já que levava com ele toda a sua família. A versão seria a de que foi a Paris para se submeter a um tratamento médico, e provavelmente a uma intervenção cirúrgica. Jamás verá nenhum médico. Por outro lado, verá sim, e todos os dias, a vários funcionários dos serviços secretos franceses.

O antigo camarada de Gaddafi, Nuri Masud El-Mesmari, desertou em 21 de outubro de 2010. Se encontra atualmente sob a proteção dos serviços secretos franceses.

A reunião Está comprovado que colaboradores próximos do presidente francês foram vistos, no começo de novembro, quando entravam no hotel Concorde Lafayette de Paris, onde reside Mesmari. Em 16 de novembro, uma fila de carros azuis se mantém em frente ao hotel. Uma longa e concorrida reunião tem lugar na suite de Mesmari. Dois dias depois, uma pomposa e estranha delegação francesa vai a Bengazi. Está composta por funcionários do ministério da Agricultura, dirigentes da France Export Céréales e da France Agrimer, dirigentes da Soufflet, de Louis Dreyfus, da Glencore, da Cani Céréales, Cargill e Conagra.

No papel, se trata de uma delegação comercial, encarregada de obter, justamente em Bengazi, importantes pedidos líbios. Mas o grupo inclui também vários militares franceses, camuflados como homens de negócios.

Em Bengazi vão se reunir com um coronel da aviação líbia, cujo nome foi proporcionado por Mesmari: Abdallah Gehani. O homem está acima de qualquer suspeita, mas o ex chefe de protocolo de Gaddafi revelou também que Gehani está disposto a desertar, e que tem também bons contatos com a dissidência tunezina.

A operação se desanrola no maior segredo, mas algo é filtrado, e chega aos ouvidos dos homens mais próximos a Gaddafi. O coronel suspeita de algo. Em 28 de novembro, assina uma ordem internacional de prisão contra Mesmari. A ordem chega também à França, através dos canais protocolares. Alarmados, os franceses decidem acatar a ordem de prisão de maneira formal.

Quatro dias depois, em 2 de dezembro, a notícia é filtrada precisamente desde Paris. Não são dados nomes, mas se revela que a polícia francesa tomou preso um dos principais colaboradores de Gaddafi. A princípio, a Líbia se sente tranquila novamente. Até se dar conta de que Mesmari está, na verdade, sob regime de prisão domiciliar numa suite do hotel Concorde Lafayette. Gaddafi começa a se aborrecer.

A ira de Gaddafi Quando chega, a notícia de que Mesmari solicitou oficialmente asilo político na França desperta a ira de Gaddafi, que ordena a cassação de passaportes, inclusive o do próprio ministro das Relações Exteriores Mussa Kussa, acusado de ser o responsável pela deserção de Mesmari. Depois, trata de enviar seus homens a Paris, com uma mensagem para o traidor: «Regresse. Será perdoado». Em 16 de dezembro, é a vez de Abdallah Mansur, chefe da televisão líbia, quem tenta fazer chegar a mensagem. É detido pelos franceses na entrada do hotel. Outros líbios chegam a Paris em 23 de dezembro. São Farj Charrant, Fathi Bukhris e Alla Unes Mansuri.

Vamos conhecê-los melhor depois de 17 de fevereiro, pois serão precisamente eles quem, junto a Al Hadji, dirigirão a revolta de Bengazi contra as milícias do coronel.

Os franceses autorizam estes três personagens a jantar com Mesmari num elegante restaurante dos Campos Elíseos. Também participam do evento vários funcionários da presidência da República Francesa, e alguns dirigentes dos serviços secretos franceses. Entre Natal e Ano Novo, aparece, no boletim Maghreb Confidential, a notícia de que Bengazi se encontra em ebulição – coisa que ninguém sabe ainda – e também aparecem várias notas indiscretas sobre certa ajuda logística e militar que parecem haver chegado à segunda cidade líbia, ajuda proveniente justamente da França. Já está claro que Mesmari se converteu em instrumento estratégico de Sarkozy, quem trata de arrancar Gadgafi da Líbia. O boletim confidencial sobre o norte da África começa a filtrar os conteúdos dessa colaboração.

Mesmari ganha o apelido de «Libyan Wikileak» porque revela os segredos militares do coronel um após o outro, e conta todos os detalhes sobre as alianças diplomáticas e financeiras do regime, traçando inclusive um mapa da distribuição dos setores em desacordo e das forças que se encontram em terreno. Em meados de janeiro, a França tem nas mãos todas as ferramentas para tentar derrubar o coronel. Mas então se produz um vazamento. Em 22 de janeiro, o chefe do serviços secreto na região de Cirenaica, fiel a Gaddafi, o general Audh Saaiti, detém o coronel Gehani, quem trabalhava em segredo para os franceses desde 18 de novembro.

Em 24 de janeiro, Gehani é enviado a uma prisão em Tripoli, acusado de ter criado em Cirenaica uma rede social que elogiava a oposição tunezina contra Ben Ali. Mas é tarde demais. Gehani já tinha preparada, junto com os franceses, a revolta de Bengazi. *Franco Bechis: Vice-Director do jornal italiano "Libero