Cristiano Pavini: Governo de São Paulo esconde dados sobre efetivo da polícia civil após sucateá-la

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Outra matéria de fôlego do blog do jornalista Cristiano Pavini que nos mostra que é possível fazer jornalismo com dados públicos e que esse jornalismo incomoda autoridades que não são muito afeitas à transparência.

Governo de SP esconde efetivo policial Por Cristiano Pavini, Além do Fato 26/05/2014 Na contramão da Lei de Acesso à Informação (LAI), que completou dois anos de regulamentação no dia 16 de maio, o Governo do Estado de São Paulo decidiu esconder seu efetivo policial. Em 2013, mostrei no jornal A Cidade (Ribeirão Preto) e neste blog que a Polícia Civil havia reduzido drasticamente seus quadros na última década. Já a PM cresceu proporcionalmente menos do que o avanço populacional nesse período (infográficos no final da postagem) Em julho, o Além do Fato conseguiu dados detalhados do número de policiais civis atuando na capital e em cada Deinter (Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior). De 2003 a 2013, houve perda de 3.193 homens, um encolhimento de 10% no quadro. (Clique aqui para ver os infográficos completos). Os dados foram disponibilizados pelo Serviço de Informação ao Cidadão (SIC), ferramenta criada para atender a LAI. Agora, os novos pedidos feitos pela reportagem, referentes aos dados de 2014, foram negados ou simplesmente “esquecidos” pelo Governo Estadual. Para esconder o número de policiais civis em atividade, a Delegacia Geral de Polícia emitiu em setembro do ano passado a portaria DGP 31, com o objetivo de regulamentar quais informações poderiam ser divulgadas ao público. Segundo a portaria, informar o número de policiais atuando pode “comprometer atividades de Inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento”. Além disso, os dados seriam “imprescindíveis à segurança da sociedade e do estado”. Clique aqui para ler a portaria na íntegra Assim, o efetivo policial atual, de acordo com a portaria, é considerado sigiloso é só pode ser divulgado daqui a cinco anos. Foi informado, apenas, o efetivo anterior a 2008. A corporação também se negou a informar o percentual de policiais que atuam em serviço administrativo e quantos estão afastados. Recorri da decisão do Governo Estadual, argumentando que a divulgação do efetivo policial não fere a segurança da sociedade e não atrapalha as investigações, e pedi que a informação fosse reclassificada de sigilosa para de livre acesso. Ambos os pedidos foram negados (clique aqui para ler o indeferimento do recurso em primeira instância). Sem resposta A Polícia Militar também negou informar o efetivo relativo a Ribeirão Preto, alegando se tratar de “questões estratégicas de planejamento operacional de comando”. Entrei com recurso em primeira, segunda (corregedoria) e terceira (Comissão Estadual de Acesso a Informação) instância, questionando qual ato decisório tornou o dado sigiloso. Nenhum deles foi respondido e todos os prazos expiraram (clique aqui) . Além disso, a corporação afirmou que seu efetivo é superior a 100 mil homens no estado. No ano passado, em resposta a um outro pedido da LAI, a PM havia informado que seu efetivo era de 93.987 policiais. De duas, uma: ou a PM ganhou sigilosamente mais de seis mil policiais em um ano, ou a resposta dada foi deliberadamente incorreta. Vejamos o que diz a LAI: Art. 32. Constituem condutas ilícitas que ensejam responsabilidade do agente público ou militar: I - recusar-se a fornecer informação requerida nos termos desta Lei, retardar deliberadamente o seu fornecimento ou fornecê-la intencionalmente de forma incorreta, incompleta ou imprecisa
Infográfico (pode levar alguns segundos para carregar) LONGA ESPERA
Quem tiver pedidos de Lei de Acesso à Informação negados pelos órgãos do Governo do Estado de São Paulo e persistir nos recursos até a última instância terá que aguardar. E muito. Recorri, em terceira instância, à Comissão Estadual de Acesso à Informação (CEAI), último grau de recurso, para conseguir a resposta do efetivo da PM em Ribeirão Preto. De acordo com o sistema informatizado, o pedido será apreciado daqui a três reuniões ordinárias do CEAI. A primeira está prevista para o dia 9 de junho. Depois, os encontros serão a cada três meses. Ou seja: serão 9 meses de espera. No mínimo. ENTIDADES CRITICAM Segundo o coordenador do Observatório de Violência da USP de Ribeirão Preto, Ségio Kodato, o governo estadual “está tampando o sol com a peneira”. Ele diz que a falta de estrutura e de recursos humanos das polícias, em especial a Civil, é evidente e contribuiu para o aumento da sensação de insegurança na população. “O governo se assemelha a uma avestruz, que enfia a cabeça embaixo da terra para que ninguém veja”, diz ele, que cobra maior transparência e diálogo da Secretaria de Segurança Pública com a sociedade civil. Marina Atoji, secretária Executiva do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, diz que alguns dados referentes à segurança pública realmente precisam ser sigilosos. “Mas o efetivo policial certamente não é um deles, pois se trata de uma informação de interesse público”, afirmou. Ela também criticou a portaria DGP 31 por ser muito genérica. Emauri Malta, diretor do Sindicato dos Policiais Civis de Ribeirão Preto (Sinpol), diz que a divulgação do efetivo não fere a segurança da sociedade. “O que prejudica é o nosso déficit gritante de efetivo”, diz. ANÁLISE Na reportagem que escrevi para o jornal A Cidade, ouvi Luis Flávio Sapori, Conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e coordenador do Centro de Estudos e Pesquisa em Segurança Pública da PUC-MG. A síntese segue abaixo: "A negativa do governo do Estado de São Paulo em divulgar os dados relacionados ao efetivo policial é injustificável. São informações importantes para o conhecimento da população e cujo acesso configura-se um direito básico à cidadania. Dados relacionados ao número de funcionários de uma unidade policial em específico até podem ser ocultados por medidas de segurança, mas não informar no âmbito municipal, regional e estadual vai contra os princípios de transparência. Cabe ressaltar que o contexto histórico das forças policiais em São Paulo é preocupante, com defasagem de funcionários. Enquanto isso, há um número crescente de crimes contra o patrimônio que ficam sem punição – pois não há policiais militares para o patrulhamento ostensivo nem civis para a investigação. Ressalta-se, ainda, que o governo prioriza a Polícia Militar em detrimento da Civil, e que há uma disputa interna entre ambas as corporações, que atrapalha ainda mais o combate à criminalidade."

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