Em 15 anos, O Brasil corre o risco de perder até 60 diferentes línguas indígenas

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Em 2000, quando escrevi a primeira versão da minha coleção de história para crianças, prêmio Jabuti 2005 na categoria didático-paradidáticos, minha personagem Guarani que (na coleção, hoje, intitulada Manacá e publicada pela Editora Positivo) discute com as crianças a questão indígena, abria sua série na coleção de 4 volumes discutindo o direito de aprender a ler e escrever também em sua própria língua. Quinze anos depois a EBC faz uma matéria trazendo à tona o grave problema no processo de escolarização indígena que muitas vezes nega este direito. Espero que não seja tarde demais. 

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Eu falo Tupi Antigo, especial da Agência EBC

Textos: Vitor Abdala Edição: Lilian Beraldo Fotos: tânia Rêgo Desenvolvimento: Pedro Ivo de Oliveira

Nos próximos 15 anos, o Brasil corre o risco de perder até 60 diferentes línguas indígenas – o que representa 30% do total estimado de idiomas falados pelas diversas etnias no país. Na avaliação de especialistas ouvidos pela Agência Brasil, isso representa uma perda irreparável tanto para as culturas indígenas quanto para o patrimônio linguístico cultural mundial. Eles também defendem que esses idiomas que levaram séculos para se desenvolver são fundamentais para a manutenção de outras manifestações culturais, como cantos e mitos.

"Esse é um patrimônio que pertence não só à comunidade brasileira como ao mundo." José Carlos Levinho, diretor do Museu do Índio

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Apesar de algumas iniciativas isoladas de valorizar as línguas desses povos – como a do município de São Gabriel da Cachoeira (AM) que, em 2002, tornou o tukano, o baniwa e o nheengatu línguas co-oficiais da cidade –, estima-se que mil idiomas indígenas brasileiros tenham sido extintos nos últimos 500 anos. Na maioria dos casos, isso ocorreu com a extinção da comunidade de falantes, ou seja, dos próprios índios. Hoje, entretanto, o maior risco não está mais no extermínio da população indígena, mas sim nos processos de escolarização, na exploração da mão de obra e inclusive nos programas sociais que favorecem a entrada da televisão em todas as aldeias. Para os indígenas, o idioma materno é um instrumento de autoafirmação da identidade e da cultura. No Rio de Janeiro, em uma área de proteção ambiental, um grupo de 60 índios usa sua própria língua, o guarani, como forma de manter tradições e se comunicar.

Atualmente, apenas cinco das cerca de 200 línguas indígenas faladas no Brasil têm mais de 10 mil falantes.

Línguas indígenas como o tupi deram importantes contribuições ao português.

Durante as primeiras décadas de ocupação portuguesa, o tupi antigo foi a principal língua de comunicação entre índios, europeus e uma geração de brasileiros mestiços que começava a povoar o território nacional. Mas perdeu a força em meados do século 18, quando o então primeiro-ministro português, Marquês de Pombal, proibiu o uso e o ensino do tupi no Brasil e decretou o português como língua oficial. Há ainda línguas indígenas que, por sua complexidade e dinâmica, acabaram virando objeto de estudo e desafiaram teorias consagradas da linguística, caso da língua pirahã.

Apesar de a Constituição garantir uma educação diferenciada aos indígenas, com escolas próprias que ensinem o idioma nativo, uma série de dificuldades estruturais comprometem a qualidade desse ensino. Faltam professores treinados e material didático, por exemplo. Diante disso, muitos jovens passam a frequentar escolas urbanas.

O governo afirma que tem buscado investir na formação de professores indígenas para garantir que a língua materna seja passada para as crianças nas escolas. O Ministério da Educação (MEC) também alega que tem investido na pesquisa e documentação de línguas indígenas, na preparação de materiais didáticos e na construção de escolas destinadas a esses povos. Para o diretor do Museu do Índio, entretanto, a forma como as escolas nas aldeias são estruturadas não contribui para a preservação da cultura e da língua desses povos.

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