Metalúrgicos do ABC: "O Brasil está virando um exportador de commodities" E quando deixou de ser?

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A história econômica de nosso território desde a chegada dos portugueses é uma história de exportação de matéria-prima.

Desindustrialização e baixa competitividade preocupam metalúrgicos do ABC

Por Jorge Américo, de São Paulo, da RadioAgência NP

20/07/11 A participação da indústria brasileira na composição do Produto Interno Bruto (PIB) caiu pela metade em menos de 30 anos. Um levantamento feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) apontou que atualmente o setor representa apenas 15,8% das riquezas geradas no país. Em 1984, respondia por 35,9% da soma total.

No período avaliado, o emprego no setor também caiu. Em 1985, a indústria concentrava 30,6% dos postos de trabalho e agora emprega apenas 17,4% do contingente de trabalhadores.

No último dia 8 de julho, os metalúrgicos do ABC de São Paulo realizaram uma manifestação que reuniu aproximadamente 30 mil trabalhadores. Eles interromperam o tráfego na Via Anchieta e alertaram o governo federal e a sociedade para o risco da desindustrialização no Brasil.

O presidente do sindicato, Sérgio Nobre, revela que lutar pela sobrevivência da indústria é tão importante quanto garantir melhores condições de trabalho. Em entrevista à Radioagência NP, ele questiona a baixa competitividade do setor e defende investimentos em tecnologia.

Radioagência NP: Sérgio, o que motivou 30 mil metalúrgicos a ocuparem as ruas?

Sérgio Nobre: Nós não queremos ser apertador de parafuso ou produtor de bugigangas na indústria. Queremos ter alta tecnologia, produzir computadores, aviões, automóveis. E não é o que está acontecendo no Brasil. Se você quiser acessar o mercado chinês, tem que assumir compromisso com o Estado chinês. Você vai montar a fábrica lá, o controle acionário é do Estado, você vai ter que transferir tecnologia e desenvolver lá o produto que você vai produzir. No Brasil é diferente, quem quer assumir o mercado brasileiro – e todo mundo quer – vem de qualquer maneira, produz em seu país de origem, manda para cá em caixas, feito “Lego” e a gente monta.

Radioagência NP: No ano passado, o Brasil bateu um recorde na geração de empregos. Como isso refletiu na indústria?

SN: Essa geração de empregos não é na indústria de transformação, que é o que mais agrega valor. E quando ocorre na indústria, não é emprego qualificado. No ano passado, o Brasil importou 600 mil automóveis. Se eles fossem produzidos aqui, seriam 105 mil novos postos de trabalho só no setor automotivo. Neste ano, a projeção é de importar um milhão de automóveis. É mais do que a Volkswagen – que é a maior produtora no país – produziu no ano passado inteiro.

Radioagência NP: O que se deve fazer para que a indústria brasileira seja competitiva?

SN: O Brasil está virando um exportador de commodities, de matéria primária. Então, aquilo que é de alta tecnologia vem dos países centrais. Aquilo que não tem tecnologia, nós estamos disputando e perdendo – em função do câmbio valorizado, inclusive – para a China, Índia, México. Precisamos ver o que está vindo de fora, sejam máquinas, equipamentos ou automóveis e traçar um plano para produzir internamente, que é o que a China faz. Se ela não tem tecnologia para produzir determinado produto, ela importa, mas ao mesmo tempo ela traça um plano para, em determinado tempo, deixar de importar e produzir em seu próprio país.

Radioagência NP: Que avaliação você faz da greve dos funcionários da Volkswagen, no Paraná, que durou 37 dias?

SN: A ideia de a indústria ir para outros lugares é a de pensar o país como um todo, pensar a indústria nacional e o papel da indústria automobilística nesse contexto. Então, eu vejo com alegria o movimento dos trabalhadores no Paraná porque é isso mesmo que tem que fazer. Se o preço do automóvel é igual em todos os estados, custa a mesma coisa, por que o salário lá é menor? Não faz sentido. Os trabalhadores assimilaram isso e estão reivindicando, o que é muito justo.

Radioagência NP: Mas a descentralização das indústrias não é boa para o país?

SN: As grandes nações do mundo têm uma indústria automobilística muito forte. O Brasil também, mas não pode ficar concentrado só em São Paulo. O que a gente dizia era o seguinte: se for para outras regiões em busca de benefícios fiscais e salários baixos, é ilusão, porque os incentivos fiscais passam e depois de dez anos você precisa pagar os mesmos impostos de São Paulo. O salário baixo, com o tempo os trabalhadores percebem que têm potencial para reivindicar, tem parâmetro de comparação e buscam equiparação. Isso faz parte de processo e estamos vendo isso na China. Lá os salários são baixos, mas agora os trabalhadores olham para o mundo e começam a reivindicar também.

Radioagência NP: Como a pauta da desindustrialização está sendo discutida com os trabalhadores?

SN: Não adianta ficarmos discutindo como melhorar as condições de trabalho e o salário, se a indústria está em jogo, se a sobrevivência dela está ameaçada. Uma coisa está ligada na outra. Nossa categoria, graças aos 30 anos de luta, conquistou padrões salariais diferenciados da realidade brasileira, mas temos que pensar na sobrevivência da indústria. E aí, a agenda é com o governo. Então, estamos atuando nas duas frentes.

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