Repórteres de Época que fazem jornalismo bem feito recebem reprimenda do PSDB

Escrito en BLOGS el
O RISCO-JORNALISMO Por Leandro Fortes em seu Facebook 17/09/2012

Na edição dessa semana, a revista Época fez uma ótima reportagem sobre a venda de votos no Brasil. A reportagem, assinada por Marcelo Rocha e Hudson Corrêa, se inicia com uma denúncia sensacional: em Betim, Minas Gerais, o candidato do PSDB à prefeitura, Carlaile Pedrosa, foi filmado enquanto comprava votos de pobres carroceiros por 280 reais. O vídeo está (ou estava) no site da Época para quem quiser ver.

Vale a pena ler o lead da matéria:

“Na lista das profissões em extinção num Brasil que se moderniza, está o carroceiro. Os poucos que resistem evocam gravuras de Debret (1768-1848), o pintor francês que fez a crônica visual do Brasil Colônia. No tempo de Debret, eles transportavam tonéis de água num Rio de Janeiro onde não havia saneamento básico. No Brasil de hoje, puxam pesadas carroças de lixo reciclável, em troca de vencimentos que raramente chegam ao salário mínimo. Na cidade mineira de Betim, município da Grande Belo Horizonte, um carroceiro ganha em média R$ 600 por mês. Para ele, R$ 280 fazem diferença no orçamento. É essa a quantia que o candidato Carlaile Pedrosa (PSDB) paga a carroceiros em troca de apoio político – como mostra um vídeo obtido com exclusividade por ÉPOCA e que evoca, na era da urna eletrônica, o Brasil do tempo das carroças. As imagens abaixo mostram Carlaile, postulante à cadeira de prefeito de Betim, chegando de carro a um bairro pobre da cidade. Logo depois, uma correligionária dele se encontra com carroceiros. Tira do envelope um maço de dinheiro. Eles ficam felizes. “Só de o pagamento ser em dinheiro já tá bom demais. Da outra vez foi em cheque”, afirma um deles. “Vai ter mais 140 ou é só este?”, diz outro – e é imediatamente informado de que receberá a mesma quantia depois do pleito, caso Carlaile seja eleito. As imagens evocam, tristemente, o folclore do tempo dos coronéis, quando lavradores descalços recebiam o pé direito do sapato antes da eleição, e o pé esquerdo depois, apenas no caso de vitória do candidato.”

Uma denúncia contra tucanos na Época é coisa rara de se ver, embora os editores tenham tido o cuidado de, na capa, não escrever o nome do PSDB na chamada para o texto. Lá está assim: “O vídeo que mostra carroceiros mineiros recebendo R$ 140 em troca de apoio”. Imagine se o corruptor fosse do PT... Bom, mas isso não tira o mérito da matéria, muito menos da informação.

Os repórteres, no entanto, não tiveram muito tempo para se cobrir de glórias. No mesmo dia em que a revista chegou às bancas, o site da Época foi obrigado a publicar uma nota oficial do PSDB de 5,5 mil caracteres desqualificando o trabalho dos jornalistas. (grifos meus) Contra eles, a incrível acusação de utilizarem um vídeo que não havia sido produzido por eles. E esse não é o único argumento ridículo levantado contra a reportagem. A coordenação da campanha do tucano Carlaile duvida até do sotaque dos personagens do vídeo. Tentam, assim, explicar o inexplicável.

E Época submeteu seus leitores a isso.

Ao que parece, houve um ruído de comunicação dentro das Organizações Globo sobre o assunto. Como se sabe, a blindagem do PSDB em Minas Gerais tem sido absoluta desde o primeiro governo de Aécio Neves, sobretudo na imprensa. Nada sai sem o crivo dos tucanos. Mas a Globo é uma família muito desunida, basta reparar na quantidade de matérias que o Jornal Nacional repercute da Veja, e quantas da Época.

O tal vídeo com a compra de votos de carroceiros em Betim estava nas mãos da TV Globo Minas havia duas semanas, mas a direção da emissora decidiu ignorar a denúncia. Como nada saía na televisão, a coordenação de campanha da candidata Maria do Carmo Lara, do PT, de posse do vídeo, procurou a revista Época. De Brasília e do Rio, os repórteres foram a Betim e fizeram o dever de casa bem feito. Como prêmio, receberam a nota-reprimenda do PSDB.

Fato consumado, a TV Globo de Brasília solicitou as fitas que estavam na Globo Minas, no fim de semana, para verificar a possibilidade de ao menos repercutir no Jornal Nacional ou quiçá no noticiário da Globo News a reportagem da coirmã Época. Mas não saiu nem uma nota coberta. Por que será? ______________ Publicidade