A imagem-informação, por Francisco Cannalonga

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World-War-Z-Movie-Photo-Gallery-in-1080p     Em seu consagrado ensaio De Caligari a? Hitler, Siegfried Kracauer argumenta que os filmes autorados durante o movimento expressionista na Republica de Weimar subjetivamente representavam o confuso inconsciente coletivo alema?o, ainda em processo de cicatrizac?a?o dos traumas da experie?ncia alema? na Primeira Guerra. O desejo revoluciona?rio contraditoriamente alinhado ao apego aa conceitos reaciona?rios como macheza e propriedade e o caos ideolo?gico generalizado preconizaram a ascensa?o de Hitler e do totalitarismo1. Ben Singer implica que o sensacionalismo midia?tico e o choque da modernidade no inicio do se?culo XX ajudaram a suplantar a qualidade espetacular e escapista do primeiro cinema2. Segundo Andra?s Ba?lintz Kova?cs a gerac?a?o dos baby-boomers, o surgimento da nova esquerda e contestac?o?es dos valores burgueses cla?ssicos ocidentais permitiram a radicalizac?a?o da forma fi?lmica nas New Waves do cinema Europeu3. E? evidente, portanto, que o cinema, assim como as artes em geral, e? indissocia?vel do peri?odo histo?rico, da paisagem social e poli?tica, em suma, do seu espac?o e do seu tempo. A partir desses pressupostos da i?ntima ligac?a?o do cinema com o seu tempo/espac?o, podemos levantar uma serie de questo?es: Como era vista a imagem durante esses diferentes peri?odos histo?ricos? Seria a percepc?a?o da imagem um processo em constante transformac?a?o? Seria o conceito da experie?ncia efe?mera da modernidade enquanto "choque" de Walter Benjamin aplica?vel tanto na nossa experie?ncia com a imagem hoje quanto em seu tempo? Teria o cinema digital aniquilado a ideia da imagem ontolo?gica de Andre Bazin? Qual a transmutac?a?o do valor de uma imagem ao ser dissociada de contexto original e compartilhada em rede? E? por via dessas e outras perguntas que procuro trac?ar um brevi?ssimo paralelo da forma fi?lmica hoje com a nossa percepc?a?o dessas imagens. Procuro tambe?m relacionar essas ideias com conceitos que, por mais que tenham sido criados ha? de?cadas e (em alguns casos) com outras func?o?es contextuais, sa?o extremamente bem vindos e oportunos para um possi?vel entendimento da imagem nos tempos de hoje. O fim da ontologia da imagem fotogra?fica? Em 1945 e 1950, respectivamente, o teo?rico e cri?tico de cinema Andre? Bazin escreveu dois de seus ensaios seminais, Ontologie de L'image Photographique e L'Evolution du Langage Cine?matographique. O primeiro argumento apresentado em Ontologia e? o conceito do "complexo da mu?mia", algo que pode ser definido como o impulso humano de reverter o avanc?o do tempo, uma batalha constante contra a pro?pria mortalidade. Desejo esse que e? respaldado, absorvido e suplantado pelas artes visuais, o que resultou na busca dos artistas pelo realismo picto?rico, que so? seria alcanc?ado com o advento do filme fotossensi?vel, da fotografia, portanto. Bazin aponta a ge?nese da imagem fotogra?fica - a reproduc?a?o meca?nica da realidade sem a intrusa?o da vontade humana, como sua maior qualidade criativa. Classifica, portanto, a pro?pria realidade, a "natureza", como a mate?ria-prima essencial que o artista de cinema deve trabalhar em sua arte. “Pela primeira vez, entre o objeto inicial e sua representac?a?o nada se interpo?e, a na?o ser outro objeto. Pela primeira vez, uma imagem do mundo exterior se forma automaticamente, sem a intervenc?a?o criadora do homem, segundo um rigoroso determinismo.”4 E? importante atentar, entretanto, que essa visa?o defendida por Bazin foi considerada uma afronta a? vigente corrente teo?rica que dominava o meio acade?mico ate? o final da Segunda Guerra. Historiadores e teo?ricos como Georges Sadoul, Paul Rotha, Iris Berry, Henri Langlois e Rudolf Arnheim proclamavam a forma fi?lmica, a manipulac?a?o da imagem como o verdadeiro objetivo do cinema e, numa formulac?a?o hegeliana da histo?ria, batizado por David Bordwell como histo?ria-ba?sica, defendiam a ideia de uma evoluc?a?o pragma?tica do cinema. Apontando como ponto de partida o primeiro cinema dos irma?os Lumie?re e Thomas Edisom e que o cinema engatinhava em direc?a?o a uma forma ideal, passando pelos experimentos de Melie?s, encontrando sua forma definitiva com Griffith e finalmente, encontrando sua expressa?o ma?xima nos cinemas vanguardistas do final da de?cada de 20, como o formalismo sovie?tico de Eisenstein, Pudovkin e Vertov e o Expressionismo alema?o. Estes pensadores desprezavam qualquer ideia de um cinema realista, julgavam que a mera reproduc?a?o meca?nica da natureza jamais poderia ser considerado uma expressa?o arti?stica. Na?o e? de se imaginar que o advento do som na?o foi bem recebido por esses intelectuais, que afirmavam que o som representaria um retrocesso na evoluc?a?o da linguagem cinematogra?fica, um regresso ao cinema expositivo de Edison e dos Lumie?re e o fim das grandes vanguardas cinematogra?ficas. Bazin foi um dos idealistas e protagonistas do movimento de jovens intelectuais franceses, a Nouvelle Critique, que se opunha a tais conceitos e afirmava que o advento do som e a da composic?a?o em profundidade representavam um novo passo numa proverbial “evoluc?a?o" conti?nua da linguagem. Como apontado por David Bordwell, Bazin, Malraux, Leenhardt, Astruc e outros nasceram e viveram suas juventudes durante a ascensa?o do cinema sonoro, resultando numa maior aceitac?a?o e entendimento dos processos histo?ricos que o cinema sonoro representava. A melhor formalizac?a?o das ideias defendidas pela Nouvelle Critique encontra-se, justamente, no artigo L'Evolution du Langage Cine?matographique, no qual e? apontada, a despeito de aceitar algumas dos pressupostos teo?ricos da histo?ria-ba?sica de que alguns cineastas procuravam criar sua arte com o intento de uma dissociac?a?o sistema?tica da reproduc?a?o meca?nica da fotografia (o que declara como “expressionismo da montage”), uma segunda tende?ncia este?tica - o realismo. Bazin volta sua atenc?a?o para os filmes de Dreyer, Murnau, Stroheim e Flaherty, indicando os esforc?os destes de alcanc?ar uma reproduc?a?o fidedigna da realidade espacial e temporal. Bazin prossegue apontando o advento do som como uma progressa?o natural da este?tica do realismo, tal como a composic?a?o em profundidade de campo, nos filmes de Orson Welles, William Wyler e Jean Renoir, que substituem a montagem anali?tica das vanguardas do cinema mudo e preserva uma relac?a?o realista de espac?o e tempo, ale?m de permitir ao espectador uma maior liberdade de observac?a?o e significac?a?o. “A narrativa de Welles ou de Wyler na?o e? menos expli?cita que a de John Ford, mas ele tem sobre o u?ltimo a vantagem de na?o renunciar aos efeitos particulares que se pode tirar da unidade da imagem no tempo e no espac?o. Com efeito, na?o e? indiferente (pelo menos numa obra que consegue ter estilo), que um acontecimento seja analisado por fragmentos ou representado em sua unidade fi?sica. [...] Por isso a profundidade de campo na?o e? uma moda escolhida pelo ca?mera como o emprego de filtros ou de determinado estilo de iluminac?a?o, mas uma aquisic?a?o capital da mise-en-sce?ne: um progresso diale?tico na histo?ria da linguagem cinematogra?fica.”5 Bazin tambe?m sugere uma noc?a?o de classicismo do cinema americano da de?cada de 40, na?o muito diferente dos teo?ricos da historia-ba?sica, apontando uma suposta perfeic?a?o da forma cinematogra?fica em sua tende?ncia ao realismo. O que David Bordwell descreve como uma Versa?o Diale?tica da Histo?ria Ba?sica. “As produc?o?es americanas e francesas bastam, em todo o caso, para definir claramente o cinema falado anterior a? guerra como uma arte que visivelmente alcanc?ou o equili?brio e maturidade.” A Evoluc?a?o da linguagem cinematogra?fica. O que e? Cinema?. Por realismo da imagem nos escritos de Bazin pode-se interpretar, na?o obstante aos valores este?ticos e formais, um registro de um espac?o e do seu tempo, de suas caracteri?sticas sociais, poli?ticas e humanas. Deleuze reitera essa afirmac?a?o, apontando que “Bazin invocava a necessidade de crite?rios formais e este?ticos. Tratava-se, segundo ele, de uma nova forma de realidade, que se supo?e ser dispersiva, eli?ptica, errante ou oscilante, operando por blocos, com ligac?o?es deliberadamente fracas e acontecimentos flutuantes.”6 Contudo, a partir do surgimento e subsequente adoc?a?o da ca?mera digital, novos problemas teo?ricos surgiram, problemas esses que colocam as formulac?o?es de Bazin em cheque. Se Andre? Bazin enterrou o ideal vanguardista da histo?ria-ba?sica, novos pensadores apontam o anacronismo das de suas teorias na contemporaneidade. Nos e? destacado, por Laura Mulvey, que “Nos anos 90 a tecnologia digital trouxe de volta o elemento humano e as iluso?es manufaturadas [...] A conversa?o de informac?a?o gravada em sistemas nume?ricos quebrou a conexa?o do material que havia definido a historia anterior.”7. A reproduc?a?o meca?nica da fotografia da? lugar a co?digos bina?rios, a imagem produto de uma reac?a?o fotoqui?mica da luz em contato com a superfi?cie fotossensi?vel da peli?cula da lugar a um complexo conjunto de informac?o?es e, ate? mesmo, os efeitos especiais como sobreposic?a?o de imagens na peli?cula e? substitui?da e afastada de seus co?digos mime?ticos em func?a?o da tecnologia da computac?a?o gra?fica, a qual remete a criac?a?o de imagens de “pra?ticas pre?-cinematicas do se?culo XIX, quando as imagens eram pintadas e animadas a? ma?o”8. Em 1936, Walter Benjamin colocava em pauta o valor arti?stico de uma obra numa e?poca de reprodutibilidade te?cnica, Benjamin menciona a xilogravura, a mu?sica e, principalmente, a fotografia e o filme. E? oportuno, portanto, ponderar as indagac?o?es de Benjamin no a?mbito moderno. Se o pensador se preocupava com a questa?o da reprodutibilidade te?cnica da arte, num tempo onde tal reproduc?a?o se dava atrave?s de operac?o?es meca?nicas (a agulha que corre o disco para produzir som e ja? mencionada qualidade meca?nica da fotografia analo?gica), que diria sobre o presente, em que todas essas operac?o?es meca?nicas ja? foram substitui?das por dados, co?digos, bytes circulando indefinidamente pela internet. A partir desses pressupostos, apresenta-se um novo problema teo?rico, se o cinema digital po?s fim a? antologia da imagem fotogra?fica, o que e? essa nova imagem baseada em informac?a?o e qual o seu papel no cinema, em especial, no cinema de massas? Para prosseguir nessa discussa?o, a chamarei de imagem-informac?a?o. Capitalismo 24/7, espeta?culo e fluxo de informac?a?o24/7 anuncia um tempo sem tempo, um tempo sem demarcac?a?o material ou identifica?vel, um tempo sem seque?ncia nem recorre?ncia. Implacavelmente redutor, celebra a alucinac?a?o da presenc?a, de uma permane?ncia inaltera?vel composta de operac?o?es incessantes e meca?nicas.” 9 Existia algo de radical e fascinante quando um filme fazia o uso de um frame congelado, como na aparic?a?o do personagem de James Steward no filme A Felicidade Não Se Compra,de Frank Capra, ou no ja? antolo?gico final de Os Incompreendidos,de Franc?ois Truffaut, ou ate? mesmo quando o jovem Harry apanha do pai em Os Bons Companheiros de Martin Scorsese. O fasci?nio existia na ideia de um frame em si, o que e? um frame descolado de sua homogeneidade enquanto filme? Num filme de duas horas, um frame, em si e? apenas uma parti?cula, uma mole?cula de um organismo, que, entretanto, pode exercer uma func?a?o extraordina?ria. O frame congelado e? o momento ma?gico da quebra da diegese fi?lmica, onde o cineasta nos mostra que, por mais real, por mais sensi?vel que a experie?ncia do filme aparente, segue sendo um filme, uma construc?a?o, uma ilusa?o. E somente ele, o realizador, o cineasta, detinha o poder de romper com essa ilusa?o. Na era da imagem-informac?a?o, entretanto, qualquer um com um reprodutor de DVD ou Blu-ray ou com um filme em arquivo, baixado da internet, tem esse poder de quebrar a diegese no momento que lhe parecer mais oportuno. Tal imagem congelada, por sua vez, pode ser removida do contexto do filme, manipulada, ressignificada e jogada na rede. Esse processo, que num primeiro momento pode ser interpretado como uma liberdade democra?tica e que, acima de tudo, contestaria as noc?o?es retro?gradas de autoria ou ate? mesmo uma emancipac?a?o do culto, tal qual apontado por Benjamin, carrega consigo uma significac?a?o um tanto quanto perversa - a imagem, dissociada de seu contexto prima?rio, ao ser compartilhada na rede, torna-se, sobretudo um commodity, um produto a ser consumido e descartado, uma imagem-informac?a?o. A dissociac?a?o da imagem de seu conteu?do original a transforma em um objeto auto?nomo e autossuficiente. Pore?m, ao ser disponibilizada em rede, torna-se parte de uma ama?lgama maior de imagens e fluxo constante de informac?a?o, que se na?o impossibilitam, desamparam uma ana?lise e um entendimento pleno de seu conteu?do. Walter Benjamin traduz a experie?ncia da observac?a?o moderna como um sucessa?o conti?nua de choques image?ticos que invariavelmente resultam na impossibilidade de uma apropriac?a?o contemplativa e plena de uma imagem. Jonathan Crary leva a discussa?o adiante afirmando que nem “mesmo o frio espac?o do museu e? incapaz de transcender um mundo em que tudo esta? em circulac?a?o”10 visto que o pro?prio museu e? um espac?o de multi-interac?a?o e multissensorial, na?o somente no que se refere aos objetos expostos, mas a diversas telas interativas, textos explicativos, projec?o?es e ate? mesmo sua pro?pria arquitetura, que condensa um projeto este?tico auto?nomo. Para Crary, “A modernidade, nesse caso, coincide com o colapso dos modelos cla?ssicos de visa?o e seu espac?o esta?vel de representac?o?es. Em vez disso, a observac?a?o torna-se, cada vez mais, uma questa?o de sensac?o?es e esti?mulos equivalentes, desprovidos de refere?ncia espacial.” A interface da internet torna-se uma propi?cia fonte de ana?lise com relac?a?o a essa condic?a?o da impossibilidade de contemplac?a?o e entendimento pleno - os dados armazenados pela ma?quina, os cookies coletados na experie?ncia da internet sugerem imagens, vi?deos, propagandas, perfis pessoais, ao internauta, ale?m das infinitas janelas que podem ser abertas num u?nico navegador, cada uma com sua pro?pria ama?lgama de conteu?do. E? importante ressaltar que na?o somente a imagem dissociada de seu conteu?do tem esse destino, mas toda e qualquer imagem torna-se parte do espeta?culo moderno do capitalismo 24/7. Capitalismo 24/7 e? o termo sugerido por Jonathan Crary para designar os processos e resultados do avanc?o constante na vida civil das mi?dias digitais, redes sociais, sistemas de vigila?ncia e outras inu?meras formas de solicitac?a?o e consumo midia?tico. Crary, e outros cri?ticos da po?s-modernidade, apontam que o pro?prio conceito de mercadoria sofreu transformac?o?es, na?o e? mais mercadoria o objeto ou item fi?sico que se compra ou troca, a fisicalidade da mercadoria, tal como os processos meca?nicos da fotografia, transmudaram-se em co?digos nume?ricos, bytes, isto e?, informac?a?o. Tal imensa disponibilidade e intensas formas de solicitac?a?o midia?tica e consumo demandam a todo o tempo respostas cognitivas do indivi?duo, em outras palavras, sa?o processos constantes que subvertem o conceito de tempo de repouso ou contemplac?a?o, o tempo de contemplac?a?o ou repouso e? geralmente acompanhado da interac?a?o social ou individual atrave?s de redes sociais e ou dispositivos eletro?nicos mo?veis. Portanto, tal subversa?o transforma todo o tempo em um tempo de consumo/resposta, ou como Guy Debord coloca, o tempo de consumo de imagens e a imagem do consumo de tempo. “O tempo pseudoci?clico consumi?vel e? o tempo espetacular, em sentido restrito, tempo de consumo de imagens, em sentido amplo, imagens de consumo de tempo. O tempo de consumo das imagens, me?dium de todas as mercadorias, e? o campo onde atuam em toda a sua plenitude os instrumentos do espeta?culo e a finalidade que estes apresentam globalmente, como lugar e como figura central de todos os consumos particulares: sabe-se que os ganhos de tempo constantemente procurados pela sociedade moderna - que se trate da velocidade dos transportes ou da utilizac?a?o das sopas de pacote...” A partir dessa conceituac?a?o de Debord sobre o papel da imagem na contemporaneidade, que podemos tirar disso em relac?a?o ao cinema contempora?neo, especialmente o cinema de massas, que invariavelmente esta? mais em sintonia com esses processos imagem-temporais supracitados, como parte intri?nseca do espeta?culo, dos signos de representac?a?o do capitalismo tardio? E? nota?vel como os filmes de entretenimento contemporâneo, em especial de ac?a?o/aventura e filmes de super- hero?is, apresentam um ritmo de montagem e elipses exponencialmente mais veloz que o mesmo cinema em outras etapas histo?ricas. Uma observac?a?o superficial demonstra essa relac?a?o: numa sequencia de ac?a?o no primeiro ato do filme World War Z, quando o protagonista tenta escapar do engarrafamento em meio a um ataque de zumbis, a montagem apresenta uma me?dia aproximada de 1.1 cortes de planos por segundo. Na?o apenas a velocidade que os eventos se desenrolam enquanto narrativa, mas a multiplicidade de eventos que ocorrem simultaneamente nos set-pieces (rudimentarmente - seque?ncias de ac?a?o) também é notável com relação a dificuldade moderna de plena contemplação da imagem. Em um vi?deo-ensaio, o cri?tico Tony Zhou apresenta um conceito divertido: Bayhem, em referecia ao estilo do cineasta Michael Bay, que, em suas pro?prias palavras, procura alcanc?ar a maior dinamicidade possi?vel em cada plano de seus filmes. Por dinamicidade entende-se eventos em simultaneidade - exploso?es (muitas), perseguic?o?es, pessoas correndo, carros em colisa?o, movimentos de ca?mera, etc. Tal dinamicidade de planos e velocidade sequencial dos eventos vem se tornando uma tende?ncia comum no cinema de massas (Bordwell nota). Na sua brilhante formulac?a?o do conceito de espeta?culo, Guy Debord afirma que um dos pilares de sustentac?a?o do conceito espetacular e? a sua aceitac?a?o passiva "que, na verdade, ele ja? obteve na medida em que aparece sem re?plica, pelo seu monopo?lio da apare?ncia"11. Tal formulac?a?o dialoga perfeitamente com as observac?o?es a respeito do observador passivo de Jonathan Crary e a impossibilidade de uma percepc?a?o contemplativa de Benjamim, em virtude da quantidade de informac?a?o presente no raio de visa?o do observador. E? interesse, portanto, estabelecer um paralelo com a forma fi?lmica dos "espetaculares" filmes de consumo e a desnorteante velocidade de sua montagem, que impede o espectador de estabelecer uma significac?a?o a partir das imagens em movimento frene?tico – pois esta o reduz, ora, a uma posic?a?o de passividade em relac?a?o a? imagem-informac?a?o. Ve?-se, portanto, que o conceito da imagem-informac?a?o, teve sua origem dentro de outros contextos da po?s-modernidade, mas que foi absorvido e realocado para a linguagem cinematográfica. Um estudo mais aprofundado dessa relac?a?o entre modernidade e forma fi?lmica exigiria uma dissertac?a?o maior e maior pesquisa, e? um tema que teria muito aprec?o a discutir num momento mais oportuno.   1 Siegfried Kracauer, From Caligari to Hitler: A psychological history of the German Film (1947, Princeton University Press). 2 Ben Singer, art. Modernity, Hyper stimulus, and the rise of Popular Sensationalism. (Edic?a?o brasileira: Modernidade, hiperesti?mulo, e o ini?cio do sensacionalismo popular, no livro O cinema e a invenc?a?o da vida moderna organizado por Leo Charney e Vanessa R. Schwartz, Cosac Naify). 3 Andra?s Ba?lintz Kova?cs, Screening Modernism (2007, The University of Chicago Press). 4 Andre? Bazin, Ontologie de L'image Photographique, no livro Qu'est-ce que le cine?ma vol 1 (1958, Les E?ditions du Cerf) - Edic?a?o brasileira: O que e? o cinema? (Cosac Naify). 5 Andre? Bazin, L’Evolution du Langage Cine?matographique no livro Qu'est-ce que le cine?ma vol 1 (1958, Les E?ditions du Cerf) - Edic?a?o brasileira: O que e? o cinema (Cosac Naify). 6 Gilles Deleuze, L’Image-Temps, pg 9 (1985, E?ditions du Minuit). Edic?a?o brasileira: A Imagem-tempo (Editora Brasiliense) 7 Laura Mulvey, Death 24x a second, pg 21 (2006, Reaktion Books Ltd) - traduc?a?o livre. 8 Lev Manovich, What is Digital Cinema?, no livro The Digital Dialectic: New Essays on New Media, editado por Peter Lunenfeld (2000, Cambridge) - Traduc?a?o livre. 9 Jonathan Crary, 24/7: Late Capitalism and the Ends of Sleep, pg 39 (2013, Verso Books). Edic?a?o Brasileira: 24/7: Capitalismo Tardio e os Fins do Sono (Cosac Naify). 10 Jonathan Crary, Techniques of the Observer: On Vision and Modernity in the Nineteenth Century, pg 28 (Massachusetts Institute of Technology, 1990). Edic?a?o Brasileira: Tecnicas do Observador (Contraponto). 11 Guy Debord, la socie?te? du spectacle, pg 6 (1967, Buchet-Chastel). Edic?a?o Brasileira: A Sociedade do Espeta?culo (Contraponto).