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| Gustavo Jahn e Irma Brown em O Som ao Redor, 15 indicações |
Há onze anos, a Liga dos Blogues Cinematográficos tem tentado compreender de maneira institucional uma nova e crescente manifestação da cinefilia: aquela dos críticos independentes na sua recente manifestação virtual. Todo ano faz um ranking para celebrar os filmes mais bem cotados do ano que passou e um muito despretensioso “prêmio” — por falta de uma definição melhor — que os reúne, o Alfred.
Em 2013, a Liga optou por criar uma segunda versão do Alfred, uma que contemplasse profunda e exclusivamente o Cinema Brasileiro. Empurrando o seu processo de votação para o segundo trimestre do ano seguinte, buscando acesso a filmes que, onde moram alguns membros da Liga, nunca estiveram disponíveis e se organizando comissões quando necessárias, tornou-se possível a concretização do Carlão.
Uma homenagem a Carlos Reichenbach, o Carlão teve sua primeira lista de indicações publicada na última quinta-feira (19/06) e pode ser vista completa aqui. Entre o que já era esperado, está o belo número de menções fenômenos O Som ao Redor (Kleber Mendonça Filho, 2012) e Tatuagem (Hilton Lacerda, 2013), que lideram a lista com 15 e 14 indicações respectivamente. O cinema autoral demonstra sua força entre a crítica independente também pelas outras indicações a Melhor Filme: O Que se Move (Caetano Gotardo, 2013), que teve surpreendentes 12 indicações — contrastando com a cotação mediana que recebeu no Ranking 2013 da mesma Liga —, Elena (Petra Costa, 2012) e Educação Sentimental (Julio Bressane, 2013), a participação mais tímida entre os filmes da categoria principal, tendo apenas duas outras indicações.
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| Bernardo Marinho e Josi Antello em Educação Sentimental, 3 indicações |
O cinema blockbuster brasileiro, no entanto, não foi completamente excluído do Carlão, como aponta Francisco Carbone, membro e votante: “Eu tinha algum medo da Liga, porque me parece um ambiente acertadamente evoluído e sensato, mas com dois pés num cinema mais desafiador. Então eu achei que tudo que não fosse autoral, denso e exigente, não teria vez. Ou seja, foi uma surpresa muito bem-vinda ver Paulo Gustavo, Fabrício Boliveira e Wagner Moura, em filmes que não foram completamente abraçados. E Faroeste Caboclo ainda teve outras indicações bacanas”.
Para Kleber Mendonça Filho, a força dos filmes independentes e de circulação limitada no Carlão e na Liga se justifica pelo próprio processo natural da Crítica de Cinema: “A Crítica, a meu ver, é formada por gente que tem um interesse especial pelo Cinema. Munido desse interesse, o crítico, seja ele da mídia chamada oficial ou de um blog, irá naturalmente virar uma espécie de pesquisador, indo atrás do que está sendo feito no Cinema. Se a Crítica descobre filmes brasileiros mesmo que eles não tenham ampla e maciça distribuição, ela estará fazendo nada mais do que a sua obrigação. Seria muito triste ver uma Crítica cujo raio de atuação é o multiplex de 12 salas que exibe três filmes. Cada vez mais, o Cinema mostra uma diversidade que o mercado teima em tentar neutralizar.”
O Som ao Redor está circulando mundialmente há mais de 2 anos, conquistando cerca de 30 prêmios em diversas categorias. Em 2013, foi escolhido pelo Ministério da Cultura como o representante brasileiro na disputa pela categoria de Filme Estrangeiro no Oscar. É — precoce, mas certamente — considerado um marco do Cinema de Pernambuco, um dos estados que apresenta mais força criativa desde a Retomada. “Que bom ver o filme ainda ecoando”, diz Kleber. “Observo essa comunidade de produção de filmes com interesse e espanto já há algum tempo, e é curioso que eu mesmo faça parte dessa comunidade. Espero que continuemos fazendo os filmes que nos der na telha, com liberdade e estrutura digna de produção, que é o que vem acontecendo já há anos.”
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| Rodrigo Garcia e Irandhir Santos em Tatuagem, 14 indicações |
Maeve Jinkings também se diz contente com a indicação como Atriz Coadjuvante no Carlão, apesar de o coadjuvantismo da personagem ser passível de questionamentos. “Que bacana os críticos de cinema independentes se organizando dessa forma. Durante o lançamento de O Som ao Redor pude ler críticas de blogues cinéfilos, que a meu ver deram um banho na maior parte das críticas dos grandes jornais. Textos superinteligentes. Fico lisonjeada com a indicação.”
A atriz também comenta a sua relação com o Cinema feito no Estado: “Falar do Cinema Pernambucano pra mim significa falar de filmes muito pessoais, inteligentes, de coragem de correr riscos, de pluralidade, de política e de paixão pelo audiovisual. E, claro, significa também falar do mérito de terem conquistado condições privilegiadas de produção do audiovisual dentro do Estado. O destaque desses filmes é um reflexo disso tudo. Fico sempre muito feliz vendo isso transbordar as fronteiras. E olha que, ao contrário do que muita gente pensa, não sou pernambucana! Apesar de já me sentir pernambucaníssima”.
O destaque de Pernambuco no Carlão, na verdade, vai além dos longas. Na categoria de Curta-Metragens, o muito especial e político Em Trânsito (Marcelo Pedroso, 2013) conquistou uma indicação. O filme foi destaque no último Janela Internacional de Cinema do Recifee parece ter uma força crescente com o projeto Novo Recife sendo forçado a debate e as eleições presidenciais se voltando para campanhas e contracampanhas cada vez mais personalistas. Confrontado com a indicação ao Carlão (“Achei sensacional”, ele diz), Pedroso apresenta o filme: “O curta foi pensado como um documentário: a ideia era filmar uma concessionária de veículos, mapear um pouco os desejos e as negociações em volta do objeto carro. O documentário terminaria com o plano de um engarrafamento. Mas, aos poucos, esse recorte se mostrou insuficiente. O problema da mobilidade no Brasil é político, englobando diversas questões sociais, econômicas e culturais de fundo. Então o filme cresceu e caminhou para uma ficção onde associamos questões como o personalismo do poder político, o financiamento de campanha, a vinculação do Estado a grandes grupos econômicos, a remoção de populações para a expansão da malha viária, o crescimento econômico e industrial ligado a um ideário de progresso obsoleto... São temas que nos mobilizaram e que talvez se tornem ainda mais sensíveis no Nordeste, região que tem conhecido um grande impulso de crescimento na última década”. A este blogueiro, Em Trânsito recorda a potência política e a maturidade do maravilhoso Tudo Vai Bem (Jean-Luc Godard, Jean-Pierre Gorin, 1972).
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| Em Trânsito, indicado na categoria Curta-Metragem |
Também na categoria de curta-metragens estão Pouco Mais de um Mês (André Novais Oliveira, 2013) e Pátio (Aly Muritiba, 2013), que dividiram a sessão Câmera Escura no Janela, Jessy (Paula Lice, Rodrigo Luna e Ronei Jorge, 2013) e Lição de Esqui (Leonardo Mouramateus, Samuel Brasileiro, 2013). Pouco Mais de um Mês é um dos indicados com carreira internacional mais notória, tendo recebido menção honrosa na Quinzena dos Realizadores no Festival de Cannes 2013. Thiago Macêdo Correia, produtor do filme, aprecia iniciativas como o Carlão. “Eu acho que tudo que ajude a promover o cinema nacional e despertar o interesse de mais pessoas neste cinema é relevante. O que leva um leitor a se interessar por um filme varia bastante, seja por sistemas de cotações, listas, textos, pequenas resenhas, logo esse tipo de idiossincrasia deve ser respeitado para que o Cinema Nacional siga desviando de antigos conceitos que o público eventualmente possa ter em relação aos filmes”, ele diz.
Kleber Mendonça Filho mantém um posicionamento semelhante diante da manutenção do ato de listar por esta cinefilia virtual. “Há muito o que questionar em listas e premiações. Mas elas fazem parte do ecossistema, gostando ou não. Minha postura é a de simplesmente entender isso. Listas de associações geram interesse natural em torno dos filmes e fortalecem os associados. No caso dos blogs independentes, atuam livremente, muitas vezes por puro e simples tesão por filmes, e isso é lindo”, e completa censurando-me pelo uso da palavra amador: “Ideias na internet, para mim, têm o mesmo peso, sejam elas articuladas no The New York Times e Le Monde ou no blog de um garoto de 17 anos no interior de Santa Catarina”.
Os vencedores do Carlão serão divulgados no próximo domingo, 29/06.
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| Pouco Mais de um Mês, indicado na categoria de Curta-Metragem |