O Mercado de Notícias

Escrito en BLOGS el

Em outubro de 2013, Bill Keller, editor do The New York Times, convidou Glenn Greenwald, advogado e jornalista que colabora com o The Guardian, para um debate público. O enfrentamento foi bem caloroso e, como todo bom debate, não deixou nenhum resultado definitivo, apenas enriqueceu uma discussão já existente: aquela do Jornalismo hoje, do futuro da imprensa, da influência das corporações e do jogo de interesses, da censura e da colaboração ou não colaboração com governos federais.

Todos esses assuntos estão na pauta de O Mercado de Notícias (Jorge Furtado, 2014) e são explorados pelo filme de maneira indesculpavelmente rasa, óbvia e, o que é pior, amigável. Nele’, Furtado coloca os entrevistados (todos jornalistas que admira, ele mesmo diz) paralelamente à encenação da peça título, do britânico Ben Jonson, contemporâneo de Shakespeare. A peça, uma ideia muito mal executada, ajuda a apontar os novos rumos da discussão, não que funcione (porque nunca funciona) ou que eles tenham coisas novas a acrescentar.

Um dos poucos momentos engenhosos da montagem de O Mercado de Notícias traz um plano de Aconteceu Naquela Noite (Frank Capra, 1934), um de meus filmes preferidos. A alusão me causou certo interesse. Afinal, Aconteceu Naquela Noite, assim como Núpcias de um Escândalo, Jejum de Amor e A Costela de Adão — todos parte do subgênero da comédia de recasamento como definido por Stanley Cavell —, analisam, mesmo que muito tímida e despretensiosamente, a relação da classe média e da alta sociedade americanas de então com a notícia. São filmes inteligentíssimos, todos com sacadas mínimas, mas geniais. Em uma piada, eram capazes de dizer muito mais sobre o jornalismo que Furtado foi aqui, pois questionavam a própria estrutura da profissão, e não só aqueles que consideram maus jornalistas. Isto é fácil, como é tudo o que não sai da zona de conforto.


O uso da peça parece uma desculpa para abraçar uma estética de interatividade televisiva um tanto datada, mas este é provavelmente o menor dos problemas do filme. Desconfiar pouco de si mesmo é o maior. É inacreditável a quantidade de frases de efeito que O Mercado de Notícias permite serem ditas como verdade. Devo admitir, como fã de Saneamento Básico: o Filme, que há marcas autorais de Jorge Furtado por todo o desastre, seus maneirismos e suas perspectivas se fazem bem presentes. Como é comum a Furtado, O Mercado de Notícias é um filme afetuoso. Infelizmente, neste assunto e neste momento o afeto não cabe.