Militares querem dar golpe e conselhos de medicina querem curandeirismos

"O país vive um verdadeiro distúrbio organizacional", no artigo de Cleber Loureço

O general Eduardo Pazuello, ministro interino da Saúde, e Jair Bolsonaro (Foto: Montagem)
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O país vive um verdadeiro distúrbio organizacional. O desejo de golpe ronda a caserna e conselhos de medicina, principalmente o federal, se tornam adeptos do curandeirismo. Por pouco não temos cientistas endossando a pseudociência da homeopatia também.

Infelizmente, virou moda não se restringir em seus moldes institucionais, começando com o Conselho Federal de Medicina que, sem embasamento algum, orientou o uso da “panaceia  de Bolsonaro” conhecida como cloroquina, um medicamento sem qualquer recomendação cientifica, pesquisa ou estudo que endosse a percepção do paraquedista que preside o país e agora receita remédios para a população.

Porém, o presidente do conselho, Mauro Luiz Britto Ribeiro, tentou amenizar a situação:

 "O Conselho Federal de Medicina não recomenda o uso da hidroxicloroquina. O que nós estamos fazendo é dando ao médico brasileiro o direito de, junto com o paciente, em decisão compartilhada com o paciente, utilizar essa droga. Uma autorização. Mas não é recomendação, isso é muito importante ficar bem claro".

Não mudou o teor da nota. Agora o paciente é quem receita os próprios remédios? E o que sustenta a decisão de autorização do uso de um medicamente que não tem sua ineficácia contra o coronavírus comprovada?

A nota é vergonhosa e destrambelhada, para dizer o mínimo. Uma nota posterior do mesmo órgão diz: “o documento do CFM ressalta que o profissional fica obrigado a explicar ao doente que não existe, até o momento, nenhum trabalho científico, com ensaio clínico adequado, feito por pesquisadores reconhecidos e publicado em revistas científicas de alto nível, que comprove qualquer benefício do uso das drogas para o tratamento da COVID-19".

Logo, sim, o CFM recomenda o uso de um remédio sem qualquer eficácia. Se receitassem balinha de hortelã ou até mesmo pastilhas de vitamina C, o feito seria o mesmo e até menos cáustico! Afinal, os dois últimos não possuem efeitos colaterais que vão de paradas cardíacas a cegueira.

O motivo disto? O CFM segue envergonhado com a escolha infame que fez em anos anteriores onde optou por uma oposição sistemática aos governos petistas e uma campanha descabida em defesa de Jair Bolsonaro em 2018. A ideia é não admitir o erro, seguir para o precipício até o fim.

Menção honrosa para a Associação Medica Brasileira que foi pelo mesmo caminho em uma infame nota.

Em resumo: organizações médicas adotando o curandeirismo puro e velado, e o pior sou eu! Um colunista político apontando isso!

Militares

Ao mesmo tempo, temos mais uma manifestação do generalato brasileiro sobre a valsa na beira do abismo. Agora foi a vez do general Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, que surpreendeu e afirmou que não há risco de golpe. O mesmo Heleno que, em outubro do ano passado, afirmou que, para anunciar um “novo AI-5”, conforme sugerido na ocasião pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), é preciso “estudar como vai fazer”. Observe: não repudiou, não rechaçou.

Surpreende-me ver Heleno, que já foi achincalhado pelos filhos do presidente, principalmente por Carlos Bolsonaro, que já esteve no alambrado da costumeira demissão com fritura do Planalto e, depois do calvário, seguiu firme e ainda mais coligado com a ala ainda mais extremada das forças armadas e do governo, agora subir no palanque do legalismo.

Justo Heleno, eterno aprendiz e ajudante do general radical, Sylvio Frota, que tentou um golpe dentro da própria ditadura militar por ser contra a reabertura política iniciada com o general Geisel.

Porém, não vai haver golpe, faltam condições dentro do país para tal, condições sociais, políticas e até mesmo da cúpula que não é favorável à uma intentona.

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Mas Heleno não faz isso de graça. Heleno sabe que há quem defenda, dentro das próprias forças armadas, um golpe, uma aventura contra a democracia – principalmente dentro dos quarteis das Polícias Militares no país, que estão sendo radicalizados de forma gradual.

E, mais uma vez, o exército saí de seu dever institucional de manutenção da estabilidade e segurança nacional e permanecerá assim enquanto estiver coligado ao governo de Jair Bolsonaro.

Quantas democracias no mundo possuem seus comandantes militares negando uma ameaça do governo? Nenhuma. Isso já é um indicativo de que há algo errado.

Não que tenham coragem, não que tenham êxito. Mas está claro que, quando militares precisam constantemente sinalizarem o seu compromisso com a legalidade, há algo errado. Não na cúpula, mas na tropa.

No início desse mês eu já havia pontuado:

"Em nenhuma democracia uma nota política dada por um ministério militar é sinal de normalidade e estabilidade".

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum