Moro nunca quis ficar com Bolsonaro até o fim e trabalhou diariamente para prestar o depoimento de hoje

O Partido Lavajatista sempre teve a intenção de chutar o Bolsonaro e tomar tudo. Quer o controle do Poder Executivo e o que mais estiver ao seu alcance

Bolsonaro e Sérgio Moro (Foto: Divulgação/MJSP)Créditos: Presidência da República
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Um sábado (2) no mínimo histórico, Moro prestando depoimento na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, no mesmo lugar onde, meses atrás, Lula esteve preso e prestando depoimento para Sergio Moro.

E agora, aquele que já foi virtualmente o vice-presidente do país no auge das brigas do presidente com o General Mourão, se tornou um algoz do governo.

Para o azar do ex-ministro da Justiça, a troca de direção da PF (Polícia Federal) acabou adiantando os planos do Partido Lavajatista. A pergunta principal é: como Moro se manterá na mídia até 2022? Irá atacar o bolsonarismo de forma homeopática? Precisamos observar.

Quando entraram no governo, nem Moro, nem os lavajatistas pensaram em quando iriam sair. O “parceirinho de Moro”, Deltan Dallagnol, e os demais procuradores do núcleo da Lava Jato, tinham suas ressalvas com relação a Jair Bolsonaro, algo que ficou evidente quando surgiu a Vaza Jato, a série de reportagens do The Intercept Brasil.

Não só o ex-ministro como também o procurador Deltan evitavam a todo custo uma vinculação aos radicais de direita, e só o fizeram quando já era inevitável o dramático desfecho das eleições de 2018. Até então, Moro chegou até mesmo a desprezar Bolsonaro diante das câmeras.

Mas antes de avançar para o olho do furacão, gostaria de fazer uma única ponderação para que a leitura dessa coluna seja possível: há anos, a Lava Jato já não é uma operação, e o MPF (Ministério Público Federal) deixou de ser uma instituição faz tempo. O primeiro se tornou um partido sem legenda e o segundo se colocou como uma espécie de quarto poder da República, que se permite perseguir e intimidar os demais poderes, sem se importar com implicações legais ou com a Constituição do Brasil. Esqueçam aquela conversa fiada de que Moro queria o STF.

Vamos aos fatos: você já viu operação da MPF ou da própria PF fazendo campanha aberta e panfletagem? Então, na Lava Jato isso acontece.

Voltemos para a Vaza Jato. Em uma conversa entre Deltan e Moro, na qual o primeiro buscava utilizar 38 mil reais da 13ª Vara de Curitiba para um vídeo de propaganda das 10 medidas contra a corrupção, algo que nunca foi apurado é se esse dinheiro saiu de fato das contas da 13ª Vara. Uma vez comprovado, estaríamos diante de corrupção ativa e passiva cometidas respectivamente por Moro e Deltan:

Art. 333 – Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício.

Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem …

Caso o crime seja confirmado, então as coisas mudam: de partido para quadrilha, sim, quadrilha lavajatista!

Detalhe: Segundo o Intercept Brasil, os diálogos aconteceram em janeiro de 2016. O vídeo foi produzido em abril do mesmo ano.

Em março de 2019, a concessionária Rodonorte, que opera parte do pedágio nas rodovias do Paraná, firmou um acordo de leniência com o Ministério Público Federal. Além do “desconto” de 30% na tarifa, a empresa teria que veicular uma propaganda da Lava Jato. A propaganda que foi entregue continha o seguinte texto:

“O valor do pedágio foi reduzido em 30% (ou percentual aplicado no momento) porque recursos provenientes de corrupção foram recuperados pela Operação Lava Jato e aplicados em benefício do usuário”.

Eu quero que me respondam: quando que na história deste país uma operação, seja da PF ou da MPF, se prestou a fazer panfletagem política usando decisões e acordos na justiça?

Também naquele março, o então ministro da Justiça estava empenhado na busca do nome para Procuradoria-Geral da República, que seria anunciado em setembro.

A mídia chegou até revelar qual seria a lista de Sérgio Moro, que era composta de apenas 2 nomes: José Robalinho Cavalcanti, presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), e Deltan Dallagnol, o procurador e coordenador da Lava Jato, e youtuber nas horas vagas.

Moro já havia acumulado poder com a transferência do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e do DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), lembrando ainda que a pasta possui o controle da própria PF, e que o ex-juiz conta com uma seita com parcelas consideráveis do Ministério Público Federal. Com isso, Moro acumularia o maior poder de acesso à informação na história deste país. Poderia ir atrás de qualquer um, fazer o que quiser. O ex-juiz seria quase o chefe do presidente.

Bolsonaro percebeu o movimento do ministro e, na ocasião, pediu para o seu então partido, o PSL, votar por manter o Coaf na Economia. Foi quando Moro notou a arapuca em que havia se metido, já era tarde demais.

Desde junho de 2019, Bolsonaro tentou despachar inúmeras vezes o ministro e se livrar do monstro que havia alimentado. No mesmo mês, o jornalista Elio Gaspari comentou que: "talvez o chefe esteja desconfiado de que o chefiado quer seu lugar”. E não foi só ele, o jornalista Reinaldo Azevedo e, por fim, este humilde colunista, foram pela mesa direção.

Em um dos diálogos revelados pela Vaza Jato, Deltan disse a Moro: “e parabéns pelo imenso apoio público hoje (…) Seus sinais conduzirão multidões, inclusive para reformas de que o Brasil precisa, nos sistemas político e de justiça criminal (…)”.

Em julho o clima entre Bolsonaro e Moro já tinha azedado de vez, e então, se antes era reservada a ele a possibilidade de concorrer à presidência como uma alternativa coesa e moderada ao bolsonarismo, agora só lhe restou incorporar o que há de pior na política brasileira, foi quando virou um extremista de primeira linha para “drenar” os apoiadores do presidente:

Aqui mesmo, para a Revista Fórum, eu já havia falado sobre a prepotência do ministro, e havia alertado sobre o fato de que não seria a primeira vez na Lava Jato que o ministro avançaria com agressividade contra a sensatez e o Estado democrático de direto.

Acha exagero? Vamos lá. São duas hipóteses: ou Moro foi o juiz e Ministro da Justiça que sequer soube interpretar o Código Penal ou ele queria jogar fogo no país para agradar as hordas do extremismo.

Tudo que ele dizia querer liberar no suposto pacote anticrime (que eu chamo de pacote pró-barbárie) já é previsto nos artigos 23 e 25 precisamente. O pior é que eu sou um leigo em Direito e preciso dizer isso: MORO QUERIA A BARBÁRIE!

Tudo isso enquanto parte do país ficava indignada com os soldados que deram mais de 80 tiros em um carro de família e ainda mataram duas pessoas inocentes.

Quando Moro foi chamado para falar sobre a Vaza Jato no Congresso Nacional, e acabou  encurralado pela oposição, foi quando decidiu apelar para teorias conspiracionistas, dignas do “acepipe” da Virgínia, e sugeriu que as revelações que vieram a público eram parte de uma complexa trama para acabar com a Lava Jato. A atitude também é algo corriqueiro do Partido Lavajatista. Sempre que são apontados os abusos da operação, eles dizem: “ESTÃO QUERENDO ACABAR COM A LAVA JATO”.

Em dezembro, a relação dos dois já tinha se deteriorado de vez, porém Bolsonaro não podia demitir Moro, tampouco Moro poderia sair do governo sem que levantasse qualquer suspeita.

Quando decisão do STF sobre a prisão segunda instância virou água, o ex-ministro tentou cornetar os ministros do Supremo e acabou levando uma invertida do ministro Marco Aurélio, que chamou Moro de leigo. Moro abraçou a postura da militância bolsonarista e atacou o STF da forma que eles gostam.

Vale lembrar que Moro e o STF nunca foram muito próximos, pelo menos da maioria dos ministros. Dias Toffoli, durante uma entrevista para o Estadão, disse que a Lava Jato “destruiu empresas”, e que o Ministério Público é pouco transparente.

Mas, vejam só que interessante! No dia seguinte, Jair Bolsonaro foi na contramão do seu ministro e até mesmo dos seus apoiadores, e fez um aceno ao STF.  O gesto ocorreu durante uma fala, em um evento da Marinha. Ele declarou: “sem esquecer do Poder Judiciário, em especial o nosso STF, que em muitas medidas tem nos ajudado a garantir a governabilidade”.

Ainda em dezembro, o ministro da Justiça foi para o Twitter e escreveu: “sancionado hoje o projeto anticrime. Não é o projeto dos sonhos, mas contém avanços. Sempre me posicionei contra algumas inserções feitas pela Câmara no texto original, como o juiz de garantias. Apesar disso, vamos em frente”.

Foi assim que Moro fez a estreia da sua plataforma para o público. Algo do tipo “eu tenho um bolsonarismo para chamar de meu”. Além de, é claro, promover a fritura de seu chefe.

Na ocasião, eu também já havia dito que Bolsonaro não demitiria o quinta-coluna (Moro) de suas fileiras, pois tem medo dele. Inclusive, ele manifestou para círculos próximos o temor das atitudes de seu próprio ministro em relação ao caso Flávio Bolsonaro. O ex-juiz segurava o presidente pelo colarinho através do Caso das Rachadinhas.

Na Câmara dos Deputados, Moro é fortíssimo entre as fileiras do PSL (partido chutado por Bolsonaro) e, no Senado, ele possui até mesmo um grupo organizado, o “Muda Brasil”, que conta com uma parcela considerável de senadores.

No natal, o assunto #BolsonaroTraidor foi o assunto mais comentado no Twitter e evidenciou a cisão entre Seu Jair e Sergio Moro. Mas Moro ainda não poderia sair do governo. Não até concluir a desidratação total do bolsonarismo e levar seus seguidores.

Não por acaso, em janeiro desse ano, o deputado federal Eduardo Bolsonaro saiu do prumo ao atacar a jornalista Vera Magalhães depois da mesma fazer um tweet afirmando que “À 0h25 de hoje, o vídeo da entrevista do ministro @SF_Moro rompeu a marca de 1 milhão de visualizações no @YouTube. Já é o vídeo mais visto do canal do #RodaViva, quebrando o recorde anterior, da entrevista com Glenn Greenwald”.

 Logo na sequência, Eduardo Bolsonaro respondeu também via Twitter:

 “Cara Playmobil @veramagalhaes, não sou jornalista, mas posso te ensinar o básico: jornalismo de verdade não se faz com mentiras”.

Em fevereiro deste ano, Moro já tinha vestido de vez a indumentária extremista. No auge do motim dos policiais no Ceará, o então ministro da Justiça decidiu aproveitar para passear de tanque pelas ruas de Brasília. Pergunto: em que ano, em que democracia, um ministro da Justiça sai desfilando em tanque? Mas o problema não é apenas o ato em si. O contexto importa, e muito!

A extrema-direita havia começado com a agitação de manifestações pedindo veladamente uma espécie de AI-5, com fechamento do Congresso, avançada soldadesca, intervenção militar e ditadura. E foi nesse contexto, onde o presidente e seus filhos chancelaram a sublevação de policiais militares ao redor do Brasil, que Moro decidiu passear de tanque.

Se, por um lado, Moro estava reduzindo a pena de milicianos com seu pacote anticrime, por outro, transformava um showzinho de bandinhas em questão de Estado.

E então, no final de março quando, a pandemia já havia desembarcado no país, Moro decidiu se afastar completamente do presidente que fazia (e ainda faz) pouco caso com a morte de brasileiros.

Ao se afastar, o ministro permitiu que a fritura começasse de forma deliberada, sem que ocorressem danos colaterais. Em uma edição, William Bonner e o Jornal Nacional passaram 1h30min espezinhando os descalabros do Bolsonaro.

Após 4 dias da minha coluna sobre o embate do presidente e seu ministro, fui ainda mais contundente e apontei: Moro decidiu descer do muro e vai avançar contra Bolsonaro.

O namoradinho de parcelas consideráveis imprensa brasileira já tinha dado a senha e a cobertura incisiva dos descalabros do presidente já estava rolando a todo vapor.

No auge da crise com o ex-ministro da Saúde, Moro se reuniu com Paulo Guedes e os militares nos bastidores, para falar sobre um apoio a Mandetta, na defesa da manutenção das medidas de distanciamento social e isolamento da população para o combate à pandemia do coronavírus.

Em entrevista à CNN, o ministro da Justiça, Sergio Moro, afirmou que a responsabilidade de orientar sobre a covid-19 é do Ministério da Saúde, assim reafirmando a autoridade do ministro perante o presidente.

E o resto da história você já sabe.

Moro fala a verdade quando diz que nunca teve interesse de ir para o STF. Não é objetivo do seu partido. O PLJ (Partido da Lava Jato) quer o poder, quer o controle do Poder Executivo e o que mais estiver ao seu alcance.

Tanto é que hoje tivemos a revelação de que Moro preparou dossiê de 15 meses sobre desavenças com Bolsonaro.

Só reforça o que eu sempre falei. O Partido Lavajatista sempre teve a intenção de chutar o Bolsonaro e tomar tudo. Vide os prints com a deputada Carla Zambelli, milimetricamente feitos de forma totalmente publicitária.

Prezada, não estou a venda? Ah! Conta outra!

O que Moro não contava é que precisaria sair do governo antes do tempo. A situação com a PF tornou sua permanência insustentável, tendo em vista sua imagem e reputação. Era uma aposta alta demais para se fazer. Então, saiu.

E tudo isso ocorre enquanto o Brasil passa por um dos seus piores momentos desde a fundação da República. Um horror proporcionado pela Lava Jato e pelo bolsonarismo. O país não irá prosperar enquanto estas duas correntes existirem. Não teremos paz.

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