#Vaza Jato: Eles querem tomar o país e até mesmo o bolsonarismo

Cleber Lourenço: “O círculo interno bolsonarista jamais confiou em Moro e neste final de semana o jornalista Elio Gaspari deixou claro que Bolsonaro poderá aproveitar o vendaval para despachar o risco que Moro é para o próprio bolsonarismo”

Sergio Moto (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
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Por muito tempo se acreditou que a mídia exercia tanto poder e influência em relação à sociedade quanto os Executivo, Legislativo e Judiciário como uma espécie de quarto poder. A ideia surgiu no século 19 como recurso mostrando a imprensa como um órgão responsável por fiscalizar os atropelos dos três poderes. Acontece que, não só no Brasil como no mundo, a imprensa geralmente é conivente ou simplesmente faz vista grossa para os absurdos dos três poderes, com raras exceções e ressalvas. Quando há uma ruptura democrática em algum país geralmente a grande mídia endossa e aplaude, enquanto pequenos veículos e portais mais incisivos são censurados. Inscreva-se no nosso Canal do YouTube, ative o sininho e passe a assistir ao nosso conteúdo exclusivo. Porém, em tempos de perversão da politica e da sociedade, particularmente no Brasil onde a imprensa atualmente é demonizada, o vácuo de poder deixado pela imprensa foi ocupado por um grupo que teria também como função fiscalizar os abusos dos três poderes, assim como outros tipos de crimes. Sim, o Ministério Público. Desde 2013 a regra é uma só: investigar para vazar, tripudiar e perseguir qualquer um que represente um obstáculo para as aspirações politicas do Ministério Público. Mais de uma vez assistimos vazamentos com a precisão de um bisturi na mão de um cirurgião, muitas vezes frutos de delações e delatores que estavam dispostos a falar qualquer coisa em troca de algum beneficio. Acha que estou inventando? A coisa ficou tão absurda que, em 2018, os ministros da Segunda Turma do STF decidiram que uma denúncia baseada apenas em delação premiada não pode ser recebida e, portanto, deve ser arquivada. A beligerância do Partido Lavajatista é tão grande que até mesmo seus “filiados” fora do MP já atuaram de forma descarada, como o ex-juiz Sérgio Moro, que retirou o sigilo de uma gravação de uma presidente da República. Em que democracia minimamente séria isso seria aceitável? Na meca capitalista de Jair Bolsonaro, Sérgio Moro já estaria preso e Lula solto, caso algo parecido acontecesse. Ou o que dizer do vazamento suspeito envolvendo Toffoli? Semanas após o STF barrar o partido Lavajatista de abocanhar bilhões da Petrobras e que empurrou o Supremo inteiro para uma armadilha mais evidente que tudo? Acontece que o Partido Lavajatista, em sua grande maioria composto por membros do MP, se esbalda da mesma fonte de Olavo de Carvalho, que prega o atropelo às instituições e total desrespeito pela ordem democrática. Tanto para Olavo quanto para a Lava Jato o mais correto a se fazer é conduzir o país para a ingovernabilidade e convulsão social, em uma espécie de autogolpe onde o líder amado é recolocado no poder pelas mãos do povo agora com amplos poderes e sem nada que bata de frente para impedir qualquer atrocidade. Porém, a história nos mostrou como isso acaba quando se tenta fazer isso. Você acaba abrindo caminho para a truculência. Daí em diante meu amigo é só cotovelada e atropelo. Veja a gritaria promovida por procuradores sempre que apontados os abusos da operação? Sempre aos prantos com a frase “ESTÃO QUERENDO ACABAR COM A LAVA JATO”. Então, espera aí! A Lava Jato está acima do bem e do mal? Acima das leis? Acima da Constituição e do bem-estar do país? A resposta é sim, ou pelo menos, eles julgam que sim. Isso me lembra outro episódio delicado, em 2013, quando o deputado Lourival Mendes, do PTdoB do Maranhão, apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional, a tal PEC 37, que acrescenta um novo parágrafo, o 10º, ao Artigo 144 da Constituição, que define as competências da Polícia Federal; Polícia Rodoviária Federal; Polícia Ferroviária Federal; Polícias Civis; Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares. Os parágrafos 1º e 4º especificam as funções, respectivamente, da Polícia Federal e da Polícia Civil. A PEC 37, conhecida como PEC da impunidade, defendia que a apuração das infrações penais de que tratam os §§ 1º e 4º deste artigo são de responsabilidade privativamente às policias federal e civis dos estados e do Distrito Federal, respectivamente. Embora atrapalhada, a PEC naquela ocasião levantou uma questão importante: e se o MP e seus parceiros se tornassem “independentes demais” (entenda como independente fazer o que bem entender, sem se importar com a Constituição ou a segurança institucional e jurídica desse país) quem iria pará-los? Essa bola foi levantada também pelo então presidente da OAB-SP, Marcos da Costa, que afirmou que a PEC 37 tinha como principal objetivo evitar, em suas palavras “um grande desequilíbrio de armas entre acusação e defesa, num claro prejuízo à Justiça e ao cidadão”. A nota do presidente da OAB-SP é assustadora e também sinaliza o primeiro caso de vidência jurídica do país. A nota descreve e se preocupa com todos os problemas que passamos atualmente. Leia a nota da íntegra aqui. Em tempos onde procuradores tentam abocanhar bilhões da Petrobras, promovem panfletagem em pedágios e se tornam Youtubers, começo a ver que erramos como sociedade quando falamos um retumbante “não” para a PEC 37. Triste por um lado, reconfortante por outro, o sentimento de “eu avisei” vem sendo uma constante desde primeiro de janeiro. É óbvio que não tinha como a coisa dar certo, a falta de uma agenda e um plano de governo para nortear o caminho trouxe o país (e o presidente recém-eleito) para a única palavra que poderia definir o que estamos vivendo: destrambelho. É flagrante que Jair Bolsonaro se elegeu com a crença de que bastaria deixar a coisa toda ser tocada por seus ministros, enquanto escrevia sobre Golden Shower e vociferava contra grupos sociais e políticos específicos. Felicidade para nós, infelicidade para o presidente, governar não é apenas mandar e se comportar como se estivesse em um filme da sessão da tarde. Somos seres humanos Bem, se por um lado Bolsonaro não entendia que assumir a presidência significava efetivamente governar, por outro também se esqueceu que somos todos humanos com aspirações e vontades próprias. Achou que todos os seus ministros e assessores seriam como seus seguidores: apaixonados por ele, fiéis que concordam sem mesmo se questioner. Erro crasso. O vice escolhido, após a recusa de tantos outros, foi o primeiro a mostrar que não havia cordas em suas costas. Como uma sequência de peças de dominó, um a um ministros, assessores e deputados da base fizeram o que fizeram nos últimos meses: declarações controversas, gravações, barracos em grupos de Whatsapp. O motivo disso? Vacância na cadeira da presidência. Em Brasília, todos sabem, há um vácuo de poder. E o problema de se cercar de gente faminta por poder, audiência e holofote é que, assim como piranhas, basta o menor sinal de sangue na água para que a presa seja atacada por um feroz cardume. Quando Bolsonaro se atrapalhou com seus filhos e suas declarações, não deu em outra, havia sangue na água. Moro Aos poucos, o ex-juíz federal, famoso por prender o principal oponente de Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018, pretende aparelhar todas as instâncias do Estado de repressão ao crime e investigação. A Lava Jato, defendida de forma aguerrida pelos bolsonaristas, é um partido, esse sob o comando de Moro, que seria uma espécie de Lula às avessas desse pessoal. E esse grupo é composto por integrantes do Ministério Público, Judiciário e, por fim, Polícia e Receita Federal, ainda não possuem CNPJ, razão social e legenda, mas atuam ativamente na política nacional, preocupante? Certamente. Acontece que esse mesmo partido colocou Bolsonaro onde está pelo mesmo motivo em que o governo está uma bagunça: vácuo de poder. O esperneio de Deltan, MP-Paraná e MPF com o STF é um só. Com a chamada de atenção que levaram do Supremo de que a “Fundação Lava Jato” era ilegal, o partido perdeu sua chance de se oficializar com um caixa na casa dos bilhões. O STF que não é santo, percebeu o que estava se desenhando: uma retroescavadeira política, cujo o objetivo era limpar o terreno (perseguir seja quem fosse) e quando o mesmo estivesse limpo, fossem plantados os seus candidados. Estranhamente, Gilmar, conhecido durante anos por: o prevaricador geral da República, decidiu verbalizar aquilo que só era dito nos bastidores entre os togados do Supremo e afirmou: “O combate contra a corrupção é um negócio lucrative”. Círculos bolsonaristas começam a perceber que não criaram um monstro, mas que, na verdade, foram criados por ele. A criação Ontem mesmo eu grifei a estranha movimentação quando Thompson Flores foi recebido como amigo do General Mourão. Nesse mesmo texto eu também apontei, agora em novembro de 2018, sobre a revelação de que Moro já havia sido contatado pela equipe de Jair Bolsonaro em plena campanha eleitoral. O resultado da reunião? Moro revelou a delação de Antônio Palocci, uma delação falaciosa e que depois se mostrou fruto de uma ânsia por liberdade a qualquer custo. A revelação veio de Mourão que até então era (e ainda é) tratado como um pária por Bolsonaro e seus filhos. Exagero? Alguns episódios me chamaram atenção Em mais de uma ocasião, o blog O Antagonista, de Diogo Mainardi (GloboNews), assumidamente opositor de Lula e seu partido, demonstrou estar à frente de outros blogs ou meios de notícia com vazamentos prévios sobre a Lava Jato, chegando a exibir online, e sem autorização, o depoimento de Marcelo Odebrecht que, por ordem judicial, deveria ter ficado sob o mais rigoroso sigilo. Fato questionado pelos advogados do acusado durante o depoimento, mas que fora diminuído pelo juízo no episódio, alegando impossibilidade de determinar a fonte do vazamento dentro da sala do fórum, pois não caberia a ele exigir a apresentação dos celulares por envolver quebra do sigilo profissional dos presentes. Cabe ressaltar que esse mesmo site que obtém vazamentos que outros não conseguem - e que teoricamente é um fato “lamentado” - teve suas notícias compartilhadas frequentemente pela já mencionada página “Eu MORO com ele”. “É de se lamentar” foi o que Sérgio Moro disse sobre o episódio do vazamento do depoimento de Odebrecht e fez declaração semelhante sobre os outros vazamentos que ocorreram para sites como O Antagonista. Em outra situação, o Blog da Cidadania teve um de seus colunistas - Eduardo Guimarães, apoiador de Lula - conduzido coercitivamente para interrogatório com o fim de quebrar o sigilo profissional do jornalista sobre sua fonte, que o teria vazado sobre outra condução coercitiva, a de Lula em 2016, previamente, da mesma forma que outros jornalistas, como Diego Escosteguy (Época/Globo), mas que não chegou a ser alvo de investigação por parte de Moro. O juiz se justificou afirmando que não via jornalismo no Blog da Cidadania, enquanto sua esposa viu em O Antagonista; afirmou também que Guimarães não deveria ter seu direito ao sigilo de fonte respeitado por não ser jornalista de formação, mas enxergou sigilo de “fonte” em advogados quando da transmissão ao vivo do depoimento de Odebrecht. Brasília toda sabe, Bolsonaro não governa, uma junta de ministros e militares tenta aos trancos e barrancos levar o governo na medida do possível e impossível. Isso explica o motivo do presidente passar tanto tempo nas redes sociais, enquanto indústrias importantes fecham as portas, a criminalidade assume aos poucos o Rio de Janeiro e o desemprego aumenta enquanto o poder de compra diminui. Agora sob a luz dos vazamentos do The Intercept Brasil, fica claro que em conversas entre Moro e Deltan eram discutidas até formas de se governar o país de forma indireta. Sim, falei no Facebook, no Twitter e em meu Instagram mais de uma vez, o Lavajatismo tem como principal objetivo controlar o país, tomar o país. É assustadora a desfaçatez destes diálogos, veja o trecho da conversa entre Moro e Dallagnol que sinalizam o desejo de controlar o país: Dallagnol – 22:19:29 – E parabéns pelo imenso apoio público hoje. […] Seus sinais conduzirão multidões, inclusive para reformas de que o Brasil precisa, nos sistemas político e de justiça criminal. […]. Moro – 22:31:53. – Fiz uma manifestação oficial. Parabens a todos nós. 22:48:46 – Ainda desconfio muito de nossa capacidade institucional de limpar o congresso. O melhor seria o congresso se autolimpar mas isso nao está no horizonte. E nao sei se o stf tem força suficiente para processar e condenar tantos e tao poderosos. Junte a revelação de hoje, com meu texto de ontem e veja só. Chegaremos à única conclusão possível: o lavajatismo quer tomar o país. Muita conpiração? Paranoia esquerdista? Não, acontece que também cantei lá no Twitter, ainda em março, que o círculo interno bolsonarista jamais confiou em Moro e neste final de semana o jornalista Elio Gaspari deixou claro que Bolsonaro poderá aproveitar o vendaval para despachar o risco que Moro é para o próprio bolsonarismo. A Lava Jato se tornou um monstro imparável.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.