Carta de um cidadão indignado com os rumos do país

Escrito en BLOGS el
Era uma vez um país maravilhoso. Lá, os adolescentes não praticavam e nem sabiam o que é sexo, não existia homossexualidade, ninguém fumava maconha ou usava drogas, todo mundo falava a língua nos moldes impostos pela Academia de Letras, ninguém fazia abortos. Obedientes, uma maioria da população aceitava, resignada, ser conduzida como rebanho pelas elites redentoras. Eventualmente, em alguns lugares secretos, escondidos, transar, fumar um baseado, falar errado e, se for necessário, interromper a gravidez indesejada era permitido, desde que os praticantes tivessem dinheiro - tanto para fazer como para esconder o que foi feito. Mas, um dia, houve certa reviravolta. Primeiro, um trabalhador que falava errado resolveu – pasmem! - candidatar-se a presidente. Foi defenestrado em várias tentativas até ser eleito. Foi o fim deste mundo maravilhoso. Isto porque ele resolveu – absurdo! - garantir que negros e pobres pudessem fazer universidade. E também que ninguém deveria passar fome e o governo deveria garantir um mínimo para o seu sustento. O pessoal começou a estudar, a construir oportunidades melhores e as elites ficaram sem domésticas e faxineiras. O absurdo foi tanto que estas subalternas começaram a exigir ganhar mais e ter registro em carteira. E este trabalhador atrevido ainda quis garantir que a informação não fosse emitida apenas pelos ilustres donos dos meios de comunicação, senhores vestutos comprometidos com a liberdade e a democracia, ainda que, para tanto, tivessem que apoiar um golpe militar e a instauração de uma ditadura que, por 21 anos, prendeu, torturou, assassinou quem ousasse falar contra. Este subalterno, que a patuléia colocou na presidência, passou a direcionar a verba da propaganda governamental para mais e mais meios de comunicação, implementou uma televisão pública e quis discutir a legitimidade dos vestutos senhores monopolizarem os meios de comunicação. Aí, este mesmo atrevido resolveu apoiar uma mulher para ser presidente. Depois de um trabalhador, agora uma mulher, que tinha combatido o regime militar, ousava subir ao lugar mais alto do comando. Como é que pode? A mulher ganha a eleição, e o governo dos atrevidos continua. O ministério da Educação resolve discutir um material para ser distribuído às escolas para fazer um campanha contra a homofobia. Como assim explicitar entre os puros adolescentes que existe sexo, homossexualidade, masturbação, desejo? Psicopedagogos são mobilizados para darem seus pareceres “técnicos” contrários a este abuso do governo. “As famílias é que têm que cuidar disso”, bradam os especialistas, sem se atentar que hoje as crianças passam a maior parte do seu tempo em frente a televisão e não com a família (mas esta televisão é propriedade dos vestutos senhores que defendem a liberdade!). Mas o ministério da Educação continua atrevido e decide também que no ensino não se deve discriminar pessoas que tem uma fala diferente das normas gramaticais. E ainda informar que um escritor ícone da literatura infantil era racista e que os professores deveriam discutir isto em sala de aula! Com assim questionar a idoneidade de um outro vestuto senhor, ainda que ele tenha sido um admirador confesso da Ku-Klux-Klan, organização racista e terrorista dos EUA? Aí vem um pessoal mais atrevido ainda defender que o uso da maconha seja liberado. Isto já é demais: “maconheiros” querendo o direito de liberdade de expressão, coisa privativa dos donos dos meios de comunicação? Uma passeata de nazistas que defendem a homofobia ainda vá lá, afinal é coisa de moral e bons costumes. Cidadania não é para qualquer um. Sinceramente, o que estão fazendo com o mundo maravilhoso que existia onde crianças e adolescentes eram puros (sacanagens só por baixo do pano, mas o que os olhos não veem, o coração não sente), pobres e negros sabiam bem o seu lugar, a mulher ficava em casa, liberdade de expressão era algo dos vestutos senhores proprietários dos meios de comunicação e cidadania era coisa de pessoas preparadas. Que saco este povo alienado!