O crime e o julgamento do século

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Os meios de comunicação hegemônicos estão chamando o julgamento do chamado “mensalão” como “o julgamento do século” – inclusive esta foi uma das manchetes da revista Veja; semanas atrás. Um aparato midiático está sendo mobilizado para este julgamento, mais de 500 profissionais da imprensa foram credenciados e o noticiário está pautando isto como central na sua agenda, superando até mesmo o escândalo de Carlos Cachoeira.

Quando vi o nome “julgamento do século” me veio à memória uma coisa semelhante. Lembrei-me: o “Crime do Século”, filme que trata do caso Lindenbergh, em 1932, nos Estados Unidos. Lindenbergh era um verdadeiro herói norte-americano devido a ter cruzado o Atlântico em 1927 em um avião monomotor, uma verdadeira aventura para a época.

Cinco anos mais tarde, seu filho foi sequestrado e assassinado gerando uma grande comoção nacional. O carpinteiro imigrante alemão Hauptmann é envolvido na trama e há uma grande conspiração para condená-lo. Toda a ação judicial foi marcada por um viés midiático, de atender ao clamor de uma opinião pública ávida por uma resposta a um crime que comoveu o país.

Não houve um julgamento, mas um verdadeiro linchamento. Hauptmann foi condenado a morte e eletrocutado na cadeira elétrica. A sessão de interrogatório conduzida pelo promotor Wilentz foi toda documentada por filmes da época e assumiu contornos abertamente de espetáculo midiático. Ficou demonstrado, mais tarde, a grande farsa que foi aquele julgamento, movido pelo clamor da paixão da opinião pública que deixou de lado os princípios básicos do Direito contemporâneo.

Embora em circunstâncias diferentes, a midiatização que está sendo feita do julgamento do mensalão apresenta os mesmos riscos: a postura do procurador geral, que tem apresentado nas suas declarações mais qualificativos que fatos objetivos (“o maior caso de corrupção da história do Brasil” e por aí adiante); a pressão da mídia contra um dos juízes do Supremo por ter ligações com o PT (e um silêncio sobre o fato de Gilmar Mendes já ter sido da Advocacia Geral da União no governo do PSDB). Nas matérias veiculadas, há um evidente destaque para a denúncia e quase nada para as contra-argumentações da defesa.

O linchamento pela midiatização de um julgamento pode repetir-se no Brasil, 80 anos depois do caso Hauptmann.