O dia internacional de combate a discriminação racial, o racismo e a globalização

Escrito en BLOGS el
Dia 21 de março celebra-se o Dia Internacional de Combate à Discriminação Racial. A data foi instituída em 1976 pela Organização das Nações Unidas para lembrar o triste episódio do massacre de Shaperville, na África do Sul, durante o regime do apartheid. Em 1960, nesta data, 69 negros foram assassinados e outros 186 feridos gravemente pela polícia por estarem prostestando contra a exigência do “passe” para circular livremente nas regiões hegemonizadas pela minoria branca. Passou-se mais de cinquenta anos depois deste episódio, o regime do apartheid não vigora mais na África do Sul, o mundo mudou muito desde então, mas o racismo continua no centro da agenda política global. Ele é evidenciado no crescimento das manifestações de cunho nazifacista na Europa e, por aqui, em episódios como o trote racista de alunos do curso de Direito na Universidade Federal de Minas Gerais. Um aspecto importante a ser considerado na reconfiguração do racismo nos dias de hoje está na mudança do cenário político-econômico. As condenações internacionais ao regime do apartheid nos anos 1960 e 1970, a luta pela emancipação das nações do continente africano, o movimento dos direitos civis nos EUA, entre outras experiências, aconteciam em um cenário do mundo bipolar, em que o capitalismo se via “ameaçado” pela opção socialista, em que ex-colônias se emancipavam e buscavam construir seus projetos de Estado-Nação, em que o capital buscava construir e incorporar novos mercados para escoar a sua produção crescente. Nos países de riqueza intermediária, como o Brasil, que experimentaram processos de modernização industrial rápida sob o controle do capital transnacional, houve a incorporação de parcelas de afrodescendentes no mercado formal de trabalho, ampliando a presença negra na classe trabalhadora. Isto deu a falsa impressão de criação de uma “classe média negra” (a confusão de ampliação da classe trabalhadora com o aumento de uma classe média foi criticada aqui pela filósofa Marilena Chauí). Das rápidas mudanças nos anos 1990 destacamos: a derrota do bloco “socialista”, a contra-revolução conservadora do neoliberalismo e a implantação de um circuito de ordenamento global do capitalismo.  Neste circuito, territórios nacionais se especializaram e se hierarquizaram em determinadas funções fazendo com que a “formação social global do capitalismo” articulasse lugares de produção com alta sofisticação tecnológica (concentrando recursos informacionais e materiais) com outros em que os sistemas produtivos se aproximam de lógicas escravagistas. Esta formação social capitalista global articula, por exemplo, a sofisticação tecnológica da produção e concepção de um aparelho celular de última geração (que demanda uma mão de obra qualificada e manutenção de centros de pesquisa de ponta) com a extração do tântalo e tungstênio por crianças exploradas por verdadeiros grupos mafiosos na República Democrática do Congo que, inclusive, protagonizam uma guerra civil. (clique aqui para ler). Internamente no Brasil observa-se fenômeno semelhante com a articulação do trabalho escravo com grandes conglomerados comerciais e industriais. Por isto, que a luta contra o racismo nos tempos atuais ocorre dentro de um contexto de resistência ao capitalismo neoliberal e na construção de uma nova perspectiva societária. A procura de alternativas societárias que se observa em algumas nações no continente latino-americano que tem em comum o questionamento a submissão a esta ordem global do capitalismo (em maior ou menor grau) é de grande importância para ser discutida no movimento anti-racista. Em outras palavras, o combate ao racismo tem natureza, antes de tudo, política e ideológica. Fora disto, como disse o pensador jamaicano Stuart Hall, não terá qualquer importância. Veja abaixo trailler do documentário "Blood in the mobile", sobre a guerra civil e o trabalho escravo na República Democrática do Congo motivada pela extração do tântalo.