Sobre a falta dágua e o projeto de nação dos tucanos

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Peço licença aos leitores de Quilombo mas não vou falar especificamente de racismo, embora o problema que vou tratar aqui afeta também a população negra de São Paulo e do Brasil. A Sabesp, empresa estatal responsável pelo abastecimento de água e saneamento básico no estado de São Paulo, tornou-se uma empresa de capital misto em 1994. O governo estadual permaneceu com a maioria do seu capital (50,4%) e a outra parte foi distribuída entre investidores nacionais e estrangeiros. De 2003 a 2013, cerca de um terço do lucro líquido da Sabesp foi repassado aos acionistas, o que significa 4,3 bilhões de reais, o dobro do que foi investido em saneamento básico. Os dados são da própria empresa (clique aqui para ver). Quando da descoberta do pré-sal, houve um intenso debate de como seria o gerenciamento desta nova riqueza nacional. A Petrobrás também é uma empresa que contém acionistas privados vindo de investidores, as suas ações são vendidas em bolsas de valores ao redor do mundo. O interesse do investidor é que os lucros da empresa investida sejam repassados imediatamente aos seus cofres, principalmente quando estes investidores são fundos e outros especuladores do mercado de ações. Por isto, várias lideranças de movimentos sociais defendiam a constituição de uma empresa 100% estatal para gerenciar o pré-sal de forma que pudesse garantir que os recursos advindos com esta nova riqueza fossem direcionados para investimentos sociais e na própria economia do país. Estes dois exemplos mostram as diferentes concepções que existem acerca dos rumos da economia do país. Vejam o modelo Sabesp: a empresa priorizou o pagamento de dividendos aos acionistas, não investiu na sua capacidade de tratamento e fornecimento de água e o povo paulista está enfrentando este problemão da falta d’água que o governo estadual insiste em culpar a natureza. Na sabatina feita pela Confederação Nacional da Indústria com os três principais candidatos à presidente, o senador Aécio Neves, do PSDB, afirmou que, se eleito, irá propor uma agenda de relações internacionais “não ideológica” e sim “comercial”. O que ele quer dizer com isto? Que o redirecionamento da política externa brasileira a partir do governo Lula para os países ao sul do Equador teria uma “perspectiva ideológica” e não “comercial”. Ora, a política externa atual possibilitou e vem possibilitando a abertura de novos mercados, de constituição de novas parcerias e até fontes de financiamento (como o caso do novo banco dos BRICS) por fora das nações hegemônicas do capitalismo, EUA principalmente. São novos mercados que se abrem na América Latina, África, Oriente Médio com perspectivas a médio e longo prazo. Assim como priorizar os investimentos de estatais na sua ampliação e modernização e não na distribuição de dividendos. Esta discussão é importante para demonstrar que o projeto do PSDB é semelhante a tratar o país como uma feitoria, na qual se extrai o que se tem de riqueza para uma minoria. Não se trata apenas, embora isto também seja importante, de defender a manutenção de políticas sociais ou não, mas sim de se pensar ou não em um projeto de país, ainda que capitalista. O PSDB não pensa em um projeto nacional de longo prazo, apenas a amplifica as reclamações de interesses imediatos contrariados de determinados setores hegemônicos do capitalismo. A voz do PSDB atua como a de um colonizador que quer extrair as riquezas aqui encontradas para acumulação privada e ser usufruída, preferencialmente, fora do país. Enfim, o que está em jogo nas eleições é a possibilidade de se construir um cenário onde é possível discutir um projeto de nação ou continuar tratando-a como uma feitoria, uma colônia de exploração. A falta de água em São Paulo dá uma exata dimensão das consequências de um dos projetos.