Boatos contra Chavez agora partem do Brasil

Nessa quarta-feira, 11 de abril, faz dez anos que a direita venezuelana, com apoio dos EUA, tentou derrubar Hugo Chavez. Foi um golpe com ampla participação midiática. E a guerra continua. Serviços de inteligência venezuelanos notaram, nos últimos meses, uma mudança significativa: as especulações contra Chavez, agora, já não partem de Miami ou de Madrid, mas da imprensa brasileira.

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por Rodrigo Vianna Nessa quarta-feira, 11 de abril, faz dez anos que a direita venezuelana, com apoio dos EUA, tentou derrubar Hugo Chavez. Foi um golpe - é sempre bom lembrar - com ampla participação midiática, como mostrou o documentário "A Revolução Não Será Televisionada". E a guerra continua. Serviços de inteligência do governo venezuelano notaram, nos últimos meses, uma mudança significativa nas ondas de boato a serviço da oposição: as especulações contra Chavez, agora, já não partem de Miami ou de Madrid, como era o mais comum ao longo dos últimos dez anos. Não. Agora, o foco tem sido o Brasil. De que forma isso acontece? Normalmente, meios de comunicação brasileiros citam "fontes" importantes na Venezuela para embasar "reportagens" ou "comentários" - que depois acabam reproduzidos pela imprensa e pelas redes sociais oposicionistas venezuelanas. É um jogo de vai e volta muito bem montado. Na semana passada, tivemos mais um exemplo. Às vésperas do feriado de Páscoa, meios de comunicação brasileiros deram a notícia "bombástica": Chavez viria fazer tratamento contra o câncer no Brasil, mais especificamente no Hospital Sirio-Libanes. Aqui, a "reportagem" do G1/Globo. Reparemos em dois detalhes. 1) A fonte primária do G1 era o blogueiro venezuelano Nelson Bocaranda. Quem é ele? Se o leitor tiver curiosidade, pode acessar o twitter @nelsonbocaranda. Mas vale lembrar: reportagem do Wall Street Journal (jornal dos EUA) diz que Bocaranda deve ser leitura obrigatória pra quem vai "investir" na Venezuela. Hum... Ele recebe a chancela da imprensa dos EUA. Torna-se assim fonte "confiável" e "obrigatória". Voltaremos a isso logo adiante...  2) No quarto parágrafo do texto do G1/Globo, aparece a informação de que a notícia sobre a vinda de Chavez ao Brasil havia sido "antecipada" por um personagem bem conhecido dos leitores brasileiros: "a provável visita de Chávez já havia sido antecipada na véspera pelo jornalista Merval Pereira em seu blog no site do jornal "O Globo", no qual ele inclusive cita comentários de Bocaranda."   Vamos retomar o fio da meada. Bocaranda é fonte "obrigatória", chancelada pela imprensa dos EUA. Bocaranda diz que Chavez prepara-se para tratamento no Brasil. É uma forma de gerar incerteza e abastecer a oposição com boatos sobre a saúde do presidente. Quem "repercute" a informação de Bocaranda? Não a imprensa dos EUA (muito "manjada"). Mas o imortal Merval Pereira. A notícia publicada em "jornais brasileiros" tem mais efeito (para uso na Venezuela) do que se saísse em jornais dos EUA.  O Brasil não é visto como "inimigo", mas como um país "amigo" da Venezuela. A população local não conhece as nuances da imprensa brasileira, nem a história de alinhamento com os EUA de "O Globo", "Veja" e outros...  Ora, mas Merval apenas fez o serviço que se espera de um jornalista, certo? Deu informação... Não é assim, por um pequeno detalhe. Chavez não veio se tratar no Brasil. Os fatos desmentiram Bocaranda e Merval. Na Páscoa, como previsto, Chavez seguiu para mais uma sessão de radioterapia em Cuba. Merval e "O Globo" fizeram o que? Nada. Não registraram o erro na informação. O objetivo, parece, não era informar - mas gerar boato pra ser usado na campanha eleitoral da Venezuela. Aparentemente, isso não tem dado resultado. As últimas pesquisas mostram Chavez com cerca de 57% dos votos, contra cerca de 33% para o candidato da oposição, Radonsky Capriles. Sobre o caso específico, vale ressaltar: Chavez teria mesmo conversado com Lula, que sugeriu a possibilidade de um tratamento em São Paulo. Chavez agradeceu e ficou de pensar. Partiu para Cuba. A oposição usou uma meia-verdade para disseminar a dúvida. Vale dizer - tambem - que a falta de informação, por parte dos chavistas, ajuda a alimentar os boatos. Sobre Capriles, alguns fatos curiosos: - na juventude, ele teria sido próximo à TFP (organização católica de extrema-direita), mas na atual campanha tenta se mostrar como um "social-democrata" moderado, que se inspira em... Lula!; - no golpe de 2002 contra Chavez, Capriles esteve no grupo que cercou a Embaixada cubana em Caracas, numa clara afronta à legalidade internacional; - Capriles vem de uma família muito rica; na tentativa de se popularizar, dizem os chavistas, teria se submetido até a sessões de "bronzemanto artificial", para parecer mais moreno. E mais um dado curioso a registrar: os marqueteiros de Capriles são brasileiros. Trabalhavam no Rio, na assessoria de comunicação de Sergio Cabral. Mantem ótimo trânsito com "O Globo".  A campanha de Capriles, ao que tudo indica, vai testar as mesmas técnicas que já foram usadas por Serra na última campanha brasileira: parceria com a grande mídia antichavista (abastecida com "notícias, em parte, geradas pela mídia brasileira, como vimos no exemplo acima) e onda de boatos disseminada pelas redes sociais. Por último, vale dizer que a turma de Capriles e da direita venezuelana parece bem articulada inclusive aqui nas redes sociais do Brasil. Fiz um teste. Publiquei um video - bastante crítico - sobre Capriles no blog. Em poucos minutos, recebi comentários (no blog e no twitter) de gente defendendo Capriles e me acusando de apoiar um "ditador" esquerdista. Parecia uma esquema profissional. A batalha será duríssima na Venezuela. E é estratégica pra toda America Latina. Não custa lembrar que foi com a vitória de Chavez, em 98, que se iniciou a "virada" à esquerda que depois avançaria para Argentina, Brasil, Bolívia, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai. A direita - com apoio dos EUA e do conservadorismo brasileiro - sabe o que está em jogo na eleição de outubro de 2012. A esquerda também sabe. Vamos acompanhar a "guerra de Caracas" com muita atenção. Até porque algumas batalhas, pelo visto, passam pelas redações da imprensa brasileira.