Boulos, PSOL e petistas defendem Frente Popular para barrar avanço conservador

Andre Singer, professor da USP, acha que "o PT sozinho já não tem condições de dar direção para a esquerda".

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[caption id="attachment_35943" align="alignleft" width="300"]Boulos, Berna, Valente, Beto e Singer: consenso por uma Frente Popular e contra ajuste de Levy Boulos, Berna, Valente, Beto e Singer: consenso por uma Frente Popular e contra ajuste de Levy[/caption] por Rodrigo Vianna O debate ocorrido neste fim-de-semana em São Paulo, numa quadra da CUT, foi simbólico por muitos motivos. Primeiro, mostrou o grau de esgotamento do PT, como força renovadora de esquerda. Sob  impacto do avanço da direita no Brasil, militantes de esquerda se reuniram atraídos pelo tema: "Direitos Sociais e Ameaça conservadora". Mas não foi um debate organizado pelo Partido dos Trabalhadores - principal alvo da fúria direitista do dia 15. O PT segue acuado, quase mudo. Havia na plateia do debate muitos petistas, mas sem camisas nem símbolos petistas. Isso tudo num evento organizado pelo PSOL Mais que isso: na mesa, estavam dois ex-auxiliares de Lula - Frei Beto e André Singer (hoje, professor da USP, e que segue filiado ao PT). O debate, realizado na "Quadra dos Bancários" (histórico ponto de encontro dos militantes da CUT e do PT), reuniu quase mil pessoas no sábado à tarde. Foi o deputado federal Ivan Valente (do PSOL) quem cumpriu o papel de criar aquele espaço de reflexão, abrindo o microfone também para Guilherme Boulos (MTST - Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e Berna Menezes (sindicalista ligada ao PSOL). As críticas ao governo Dilma foram duras. E generalizadas. Boulos disse que "o governo é indefensável", e foi mais longe: "ou o governo reverte o modelo, baseado no ajuste liberal, ou em breve o golpismo terá base popular nas ruas". [caption id="attachment_35944" align="alignleft" width="300"]Quase mil pessoas: na casa do PT e da CUT, a esquerda se reúne Quase mil pessoas: na casa do PT e da CUT, a esquerda se reúne (mas sem a presença oficial do PT)[/caption] A avaliação do líder do MTST é de que, apesar da queda de popularidade de Dilma, quem está na rua por enquanto protestando  contra o PT é um setor mais radicalizado de direita e comandado pela classe média. Boulos, no entanto, diz que um ponto deveria preocupar os petistas: "a massa trabalhadora, que votava no PT até hoje, ficou em casa dia 15, mas  aplaudiu os protestos porque não aguenta mais". Ele reconheceu os avanços sociais da era Lula, mas reafirmou a posição do MTST de que o modelo de conciliação do lulismo se esgotou. "2013 foi um aviso, mas parece que o PT não entendeu". Boulos se mostrou preocupado com o "desfilar de preconceito e ideias fascistas" ocorrido no dia 15. E mostrou clareza de que não se trata de um ataque ao PT, apenas: "o petismo deixou de ser de esquerda, mas o antipetismo é um movimento contra toda a esquerda, é anti-movimentos sociais, anti-esquerda, anti-vermelho.  Temos uma direita venezuelana, e um governo covarde. Mas vamos enfrentar essa turminha que destila ódio. Com fascismo, não se conversa; fascismo, se enfrenta." Andre Singer concordou com a avaliação de que o início do governo Dilma é desastroso para a esquerda. Até porque o ajuste de  Levy deve provocar desemprego, enfraquecendo os trabalhadores - que são a base social da esquerda. O professor da USP, porém, discordou de Boulos na avaliação do dia 15. "Considero que a manifestação foi majoritariamente de centro. Havia, sim, setores de extrema-direita, golpistas. E havia ainda uma direita radicalizada a favor do impeachment, mas as pesquisas mostram que a maioria estava ali para rechaçar a corrupção". Singer acha que é possível "dialogar" com esses setores de centro. Mas foi contestado no debate por gente da plateia. O dia 15, disse o professor Gilberto Maringoni (PSOL) foi, sim,  "tendencialmente" em favor da extrema-direita, abrindo espaço para ex-torturadores e golpistas na Paulista. O dia 15, lembraram outros, significou a proibição para que qualquer cidadão vestisse vermelho num amplo raio em torno da Paulista. Essa não é atitude de "centro", disse um militante anônimo. Frei Beto definiu as manifestações do dia 15 (e também as de junho de 2013) como "manifestações de protesto, mas não de proposta." E ressaltou que o PT colhe os frutos por ter governado 12 anos, sem ter feito - nem encaminhado  - uma reforma estrutural sequer. A sindicalista Berna Menezes destacou que não se pode igualar os governos FHC e Lula/Dilma, mas lembrou que o PT é responsável pelo avanço da direita, porque jamais enfrentou a mídia, nem fez uma Reforma Tributária em favor dos trabalhadores. Outra avaliação comum entre os presentes: a crise será longa, pode durar 4 anos ou mais. Boulos disse que há riscos de ruptura pela direita, devido à "forte presença de setores golpistas" nas ruas. Já Singer, não vê riscos imediatos de ruptura. "A turbulência será grande, o estresse democrático é parecido com 64, mas não há mais a Guerra Fria". Não há mesmo? O que os Estados Unidos fazem no Oriente Médio e na Ucrânia é o que?  Hum... Os debatedores defenderam uma "Frente Social", ou uma "Frente Popular", para combater o avanço da direita. Uma frente que não seja dos partidos de esquerda, mas agregue amplos setores em defesa de uma pauta mínima. "O meu partido, o PT, não tem mais condições para dar direção à esquerda. É preciso formar logo essa frente", disse Singer. Ele lamentou que o PSOL e o MTST não tenham ido ao ato do dia 13 na Paulista. "Com uma formação mais ampla, poderíamos ter chegado a cem mil pessoas, e não 40 mil, como tivemos", afirmou. A lembrança de Singer indica as dificuldades que ainda impedem as forças de esquerda e os movimentos sociais de agirem juntos - num momento de forte avanço conservador. O deputado Ivan Valente listou cinco pontos em torno dos quais poderia ser construída essa frente, aberta a entidades, partidos e cidadãos interessados em barrar a direita - dentro e fora do governo: - combate ao ajuste fiscal de Levy; -  democratização dos meios de Comunicação; - reforma agrária e combate ao latifúndio; - defesa da Democracia e rechaço ao golpismo; - defesa dos direitos trabalhistas. Formou-se, entre  os debatedores, um consenso de que é possível unificar a esquerda. Não contra o governo Dilma, que em nenhum momento foi citado como inimigo principal. Mas contra o ajuste de direita - que significa o sequestro, pela direita, de um governo eleito com discurso de esquerda. E, especialmente, contra a direita que baba de ódio nas ruas e no Congresso. Ivan Valente disse que é preciso levar pras ruas "os nomes de Cunha e Renan, como parte da corrupção que se precisa derrotar." O deputado do PSOL lembrou que o discurso udenista, de falso moralismo, hoje é o mesmo de 54 e 64. Mas dessa vez, lembrou, parte importante da direita está afundada na lama da corrupção: "há 33 parlamentares indiciados, inclusive os presidentes da Câmara e do Senado - que não podem ser poupados, como a direita tentou fazer no dia 15." Foi um encontro curioso, em que a turma do PSOL usou a '"casa" da CUT e do PT. Um encontro em que o PSOL se definiu claramente contra o impeachment, e fez questão de ressaltar que PT e PSDB não são iguais. Um encontro em que petistas ou ex-petistas não tiveram dúvidas em atacar o ajuste de Levy - ainda que isso significasse atacar frontalmente o governo Dilma. Havia uma presença de militantes de esquerda, para além do PSOL. E havia a certeza de que a Frente Popular vai nascer com ou sem o governo. Vai nascer nas ruas. E parte importante da base social do PT vai ajudar a compor essa frente - ainda que o partido, como lembrou Singer, tenha perdido a capacidade de liderar a esquerda. Já não se trata de defender o governo ou o PT. Mas de recompor o campo da esquerda, e impedir a completa restauração conservadora no Brasil.