"História da região não depende da ONU"

Da CartaCapital: Para o professor da universidades de Belém e Beirzeit, na Cisjordânia, Mazin Qumsiyeh, a maioria dos palestinos desconhece que tipo de Estado Palestino será proposta na Onu pelo líder da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas. “Não houve consulta, nenhum tipo de envolvimento do povo palestino com o processo decisório sobre ir às Nações Unidas”, observa Qumsiyeh, que nasceu na Cisjordânia há 54 anos

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[caption id="" align="alignleft" width="300" caption=" Jovens saem às ruas da Palestina pedindo união dos governos em Gaza e Cisjordânia, em março. Foto: Mohammed Abed/ AFP"][/caption] "História da região não depende da ONU" Por Viviane Vaz, de Jerusalém, na CartaCapital Para o professor da universidades de Belém e Beirzeit, na Cisjordânia, Mazin Qumsiyeh, a maioria dos palestinos desconhece que tipo de Estado Palestino será proposta na Onu pelo líder da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas. “Não houve consulta, nenhum tipo de envolvimento do povo palestino com o processo decisório sobre ir às Nações Unidas”, observa Qumsiyeh, que nasceu na Cisjordânia há 54 anos Qumysiyeh acrescenta: “A questão não é ir ou não ir à Onu, mas qual é a natureza de ir?”, completa. Autoridade no estudo de genética na Palestina e nos Estados Unidos (é professor associado da Universidade de Yale), Qumsiyeh é reconhecido por seu trabalho na ONG “Centro para aproximação dos povos” e coordenador do Comitê “Contra o muro e os assentamentos em Beit Sahour (Cisjordânia)”. Seu último livro é Popular Resistance in Palestine (Pluto Press, 2011). CartaCapital: Qual sua avaliação da iniciciativa da Autoridade Palestina em tentar conseguir um assento na ONU? Mazim Qumsiyeh: Ainda não sabemos qual é a forma disso, ou seu conteúdo. A Autoridade Palestina (AP) de Abu Mazen (Mahmud Abbas) não publicou nada sobre em que termos vamos à Onu. E há várias maneiras de se fazer isso. Para ser país membro da Onu é necessário requeri-lo ao Conselho de Segurança – onde cinco países têm poder de veto de cinco países, incluindo os Estados Unidos. E os EUA já disseram que tendem à vetar a proposta. A AP, portanto, terá de ir à Assembleia Geral da Onu e pedir para ser um país observador, como o Vaticano, que tem representantes, mas não é membro. Os palestinos pediriam para ter um status de observador como o Vaticano? Para isso, precisarão de dois terços da maioria da Assembleia Geral. É possível que consigam isso e até mais, dependendo dos termos usados, isto é, se a linguagem for moderada. Mas eles ainda não divulgaram qual será a linguagem. Se a AP falar em dois países para dois povos, como querem as Nações Unidas e alguns países europeus, então isso significaria um maior número de votos. Talvez em vez da maioria dos dois terços, será uma maioria de 90%. Há também negociações sobre isso. Eu diria que provavelmente eles irão usar uma linguagem moderada para conseguir maioria e assim fazer do pedido uma espécie de vitória moral. Nesse contexto, a maioria dos países aceitariam um Estado Palestino com as fronteiras anteriores a 1967, mas seria um gesto sem significado. Em 1988, quando os palestinos declararam um Estado não baseado nas fronterias de 1967, mas nas fronteiras de 1947, uma grande porcentagem de países concordaram. CC:Considera que esta iniciativa atual da AP poderia ajudar a criar na prática um Estado Palestino? MQ: Eles deveriam ter ido à Onu em 1989. É crítica a forma como eles vão, hoje, às Nações Unidas. CC: Surpreende o fato de que em Ramallah, sede da Autoridade Palestina, uma grande maioria de palestinos digam que não veem mudanças possíveis com essa nova iniciativa? MQ: As pessoas não sabem qual é a natureza disto. Não houve consulta, nenhum tipo de envolvimento do povo palestino com o processo decisório sobre ir às Nações Unidas. Como eu disse, a questão não é ir ou não ir à Onu. A questão é: qual é a natureza de ir? Onde vamos fazer isso? Como vamos fazer isso? Se você me diz que vai a Jerusalém, eu vou perguntar o que você vai fazer lá. Esta é a pergunta neste caso: qual é o formato, o que vai ser feito. CC: Mas não é curioso observar muitos líderes da comunidade internacional já terem prometido apoio? MQ: Depois de anos de pesquisas para meu livro Popular Resistance in Palestine conclui que as ações dos políticos nas Nações Unidas ou em outras esferas não é o mais significativo. O mais importante são as manifestações nas ruas. É assim que a história é modificada –por pessoas comuns. Os direitos civis nos Estados Unidos não foram alcançados pelos políticos. Acabar com a guerra no Vietnã não foi conseguido pelos políticos, mas apesar deles. Porque quando as pessoas querem, conseguem. E elas têm de querer o suficiente para passar para a ação. Por isso, não estou muito preocupado em ir à Onu. Estou mais interessado nas pessoas e na pressão dos palestinos sobre a Autoridade Palestina para que se faça a coisa certa. Sou um mobilizador quando escrevo e falo às pessoas, ainda que alguns o chamem isso de incitamento. É essencial que os povos desafiem seus políticos, sejam israelenses, palestinos, americanos ou brasileiros. CC: O que tem de ser feito? MQ: O povo palestino quer sua libertação e o direito de voltar às suas casas, de onde foram removidos. E querem o direito à autodeterminação. Estes são os elementos-chaves. É nisso é devemos insistir. E temos de ter responsabilidade sobre nossos atos e parar de choramingar sobre os políticos. O que posso fazer como indivíduo? A imprensa ocidental está sempre centrada no que os presidentes fazem e dizem. Estão interessadas no que Abu Mazen decidiu fazer na Onu. Mas as notícias não estão aí, mas no que está acontecendo sobre o terreno, o que as pessoas fazem e como vão reagir.