Pedro Serrano: Plebiscito dará legitimidade para Constituinte do Sistema Político

O poder constituinte originário em verdade nem é tema jurídico, pois se encontra fora dos limites do Direito. Trata-se mais de fenômeno político, que por ter poderes ilimitados pode se autolimitar.

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Por Pedro Estevam Serrano, na Carta Capital Com as declarações pós-eleições da presidenta Dilma Rousseff (PT) volta à cena politica a questão da Constituinte exclusiva para reforma política e todas as questões que lhe são inerentes. O meio jurídico tem divergências quanto ao cabimento da convocação de uma Constituinte com o fim especifico de reforma política. A maioria dos especialistas de quem tive acesso a suas opiniões creem que seria impossível no pleno jurídico essa tal convocação. Para eles ou a Constituinte originária é um poder ilimitado ou não é Constituinte, sendo mais um mecanismo de burla aos limites procedimentais das emendas constitucionais previstas em nossa Carta. Penso de forma diversa por razões e argumentos que não cabem ser detalhados nesse espaço limitado. Mas, em suma, tendo-se em conta que o poder constituinte originário em verdade nem é tema jurídico, pois se encontra fora dos limites semânticos próprios da linguagem de competências que é o Direito (ou seja o Direito só trata de condutas limitadas ou reguladas por normas jurídicas), tratando-se mais de fenômeno político, por conta de não ser limitado por norma alguma, porque não poderia ser uma forma de poder autolimitado? Ou seja a força política que o estabelece, ao estabelecê-lo, estipular limites normativos a sua realização? Me parece uma contradição lógica, pois dizer que o poder constituinte originário não pode se autolimitar em seu objeto de deliberação significa dizer que ele não é ilimitado, isso porque ele teria o dever de ser ilimitado até por ele mesmo, o que significa uma limitação (a norma de dever ser ilimitado). O lógico me parece admitir que só é ilimitado o poder que pode se limitar. Além dessa razão de ordem lógica me indago qual seria a fonte normativa que determina que o poder constituinte originário que tudo pode não pode se autolimitar? A doutrina que o descreve? Claro que não, o papel da ciência descritiva (doutrina) nesse caso é descrever os fenômenos novos que vão sendo criados pela vida política. Descreve a realidade e não procura regrá-la ou limitá-la. Busca coincidir com a realidade e não incidir sobre ela, na clássica expressão de Lourival Vilanova. Por essas e outras razões que já expendi em livro e artigos creio como possível sim a convocação de uma Assembleia Constituinte originária com o fim exclusivo de deliberar sobre reforma política, desde que a autolimitação partisse da força política instituidora desta forma de poder constituinte. E aí coloca-se outra questão, mais no território da política e da Teoria do Estado do que no da dogmática jurídica. Para que essa Constituinte originária seja legítima do ponto de vista democrático o que seria necessário? Aqui não se discute juridicidade. O poder constituinte originário é dotado de uma força fundacional, o que possibilita até fontes autoritárias de seu surgimento, como se verifica pela história humana. A questão é do que seria necessário para considerá-lo democrático. Vou ser sintético: como democrático é o poder constituinte que é instaurado pelo povo, quanto mais clara sua origem popular mais nítida sua legitimidade democrática. Na atual conjuntura creio que posso afirmar, portanto, que seria democrático uma constituinte autolimitada que fosse convocada diretamente pelo povo em plebiscito e por ele limitada já em sua convocação. Isso não significa dizer que o plebiscito necessitaria ingressar no mérito das questões de reforma política, até porque limitar temas tão complexos a respostas binárias reduziria antidemocraticamente o debate social sobre tais questões, que deveriam ser entregues aos representantes escolhidos pelo povo para tanto. Apenas a convocação da constituinte e a estipulação de seu limite geral deveriam ser objeto da deliberação. Tal plebiscito de objeto limitado em nada contraria a realização de referendo posterior para aprovação popular do texto aprovado pelos constituintes, o que só enriqueceria o debate e a legitimidade democrática do processo, embora não seja condição necessária a legitimidade democrática da deliberação. Prefiro aqui me abster de manifestar sobre a conveniência política de tal convocação, da qual tenho sentidas dúvidas, pela porteira que poderia abrir de instabilidade institucional e democrática no futuro.