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Bolsonaro ataca a mídia, mas ela é sua maior cabo eleitoral hoje

Ao ver suas opções de "terceira via" fracassarem, Globo e jornalões tentam sabotar Lula, único candidato com reais chances de derrotar a extrema direita

Lula com Alckmin e Paulinho da Força ao receber apoio do Solidariedade. Foto: Ricardo Stuckert
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CYNARA MENEZES

A "terceira via", até o momento, flopou. Deu chabu. E, segundo vários analistas, tem pouca ou nenhuma chance de fazer frente à polarização entre Lula e Bolsonaro até outubro. Diante do fracasso do seu candidato de preferência (como aconteceu em 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018), o que faz a mídia comercial, que diz ser oposição ao governo? Tenta por todos os meios sabotar o único candidato com chances reais de derrotar a extrema direita, de acordo com as pesquisas.

Nesta quarta-feira, 4 de maio, conseguiram o feito de transformar a histórica capa da revista Time com Lula em um "gol contra", como surrealmente definiu um comentarista na Globo News. O ex-presidente cometeu o "erro" de apontar que o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, é tão culpado pela guerra quanto seu homólogo russo, Vladimir Putin –muito embora o papa Francisco tenha dito praticamente a mesma coisa ao declarar que "a origem da guerra foi a Otan latindo às portas da Rússia". Francisco não recebeu críticas pela frase.

Lula na capa da Time. Foto: reprodução

É chocante constatar que, enquanto indígenas desaparecem do mapa, a inflação galopa, a fome volta a assombrar as famílias brasileiras e o presidente ameaça o país com um golpe militar, as metralhadoras da mídia comercial continuem voltadas para o petista. Toda vez que Lula faz um discurso público ou dá entrevista a algum veículo, suas palavras são escarafunchadas sob uma lupa (quando não distorcidas) para extrair delas a pior interpretação possível.

Na Time, o ex-presidente falou sobre sua preocupação com o desmonte dos programas sociais desde o golpe contra Dilma, sobre o ódio que Bolsonaro despertou na sociedade, sobre a necessidade de paz no mundo. Nada disso pareceu relevante para a mídia corporativa. Era preciso achar algo que fosse possível atacar na fala de Lula; e a crítica a Zelensky foi a deixa encontrada.

Mas o quê exatamente o petista disse sobre o presidente ucraniano? Que ele e Putin deveriam ter conversado mais, que os EUA deviam ter ajudado no processo, que a influência da OTAN foi nefasta no processo, e, sendo assim, tanto o presidente russo quanto o ucraniano não mercem defesa. É importante destacar que, ao contrário de Bolsonaro, Lula condenou a invasão da Ucrânia pela Rússia desde o começo. "Se o presidente Putin tivesse pedido para que a gente dissesse se ele deveria ou não invadir a Ucrânia, a gente teria de dizer que não", afirmou, em março, durante sua visita ao México.

Para a mídia, se a tal terceira via não mostrar que está no páreo, o péssimo, incompetente e autoritário Bolsonaro é o "mal menor", não Lula, que governou o país democraticamente, com êxito, durante oito anos. "Se a terceira via não vingar, nossa via é Bolsonaro." Assustador

Um mês antes, Lula já havia condenado com veemência a invasão, que chegou a comparar com a promovida pelos EUA no Iraque e no Afeganistão. "A gente está acostumado a ver potências fazendo isso de vez em quando sem pedir licença. Foi assim que os EUA invadiram o Afeganistão e o Iraque. Foi assim que a França e a Inglaterra invadiram a Líbia. E é assim que a Rússia está fazendo com a Ucrânia", opinou, sempre apelando ao diálogo em busca da paz.“É lamentável que, na segunda década do século 21, a gente tenha países tentando resolver suas divergências, sejam territoriais, políticas ou comerciais, através de bombas, de tiros, de ataques, quando deveriam ter sido resolvidas numa mesa de negociação.”

Seu chanceler, Celso Amorim, foi no mesmo caminho, em entrevista a Breno Altman em fevereiro: "Não posso deixar de condenar o que a Rússia está fazendo. É uma violação grave do direito internacional. Eu acho um erro. Um erro e um ato ilícito”, declarou. Instado a comentar as declarações de Lula, Amorim reafirmou nesta quinta-feira, 5 de maio, que o ex-presidente condena a invasão russa.

Estamos, portanto, diante de um factoide, uma falsa polêmica criada pela mídia com o objetivo de prejudicar Lula e mais uma vez recorrer à falsa simetria, equiparando-o a Bolsonaro, que em nenhum momento condenou a Rússia e Putin, a quem, aliás, visitou amigavelmente em Moscou poucas semanas antes de a guerra ser deflagrada. Pelo contrário: sobre o conflito, o mandatário brasileiro garantiu que o Brasil iria adotar uma postura "neutra".

Nada do que Lula diz ou faz é digno de respeito ou pelo menos da "imparcialidade" que a velha mídia tanto apregoa ter. Se uma hora é "Lula não quer frente ampla", na outra é "Lula se une a Alckmin, a quem criticou"; se uma hora é "Lula evita falar sobre aborto", na outra é "Lula comete erro político ao falar que aborto é questão de saúde pública". O intuito é claro: dinamitar, implodir a candidatura do principal rival do extremista de direita no poder. É lógico que o maior beneficiado com este jogo será Bolsonaro –na última eleição, com idêntica postura, a "terceira via" favorita do establishment midiático (por sinal, Alckmin) não alcançou os 5% dos votos.

O mais triste é ver progressistas participando da patifaria anti-Lula nas redes sociais, em busca de, quem sabe?, conquistar um lugar ao sol na "imprensa profissional". O que esperam acontecer com o Brasil para caírem na real? Tortura de seres humanos?

Até onde vai o desamor da mídia comercial pelo Brasil? Derrotados mais uma vez em 2014, apoiaram a desestabilização do país para arrancar o PT do poder e patrocinaram a prisão de um ex-presidente inocente, sem se importar a mínima que efeitos isso teria sobre nossa jovem democracia; em 2018, lavaram as mãos diante da virtual eleição de Bolsonaro, alegando ser "uma escolha difícil" optar entre um defensor da ditadura e um professor, ex-ministro da Educação; agora, sabotam a oportunidade que o Brasil tem de sair da enrascada em que eles próprios enfiaram o país.

A impressão que fica é que os poderosos da imprensa já decidiram: se não for o candidato deles o possível vencedor da eleição, ou seja, se a tal terceira via não mostrar que está no páreo, o péssimo, incompetente e autoritário Bolsonaro é o "mal menor", não Lula, que governou o país democraticamente, com êxito, durante oito anos. "Se a terceira via não vingar, nossa via é Bolsonaro." Assustador.

A Globo e os jornalões se recusam a admitir o que o mundo inteiro já viu, que o ocupante do Planalto é o principal inimigo a combater neste momento, ainda que Bolsonaro passe os dias assacando contra a imprensa e a liberdade de expressão (dos outros), a ponto de acionar a Lei de Segurança Nacional contra jornalistas e um cartunista. Nem as agressões e o assédio moral do presidente a seus repórteres foram capazes de desarmá-los contra Lula e o PT. Bolsonaro a ataca sem trégua, mas a mídia comercial é sua maior cabo eleitoral hoje.

O mais triste de tudo é ver figuras progressistas participando da patifaria anti-Lula nas redes sociais, em busca de, quem sabe?, conquistar um lugar ao sol na "imprensa profissional". Qual o limite dessa gente? O que esperam acontecer com o Brasil para caírem na real? Censura? Prisão de opositores? Tortura de seres humanos?

Para a mídia comercial, não há perda: se novamente acontecer o pior, sempre é possível culpar... o Lula. E o nosso país? Aguenta mais quatro anos de Bolsonaro? "Melhor do que o PT", repetem, uníssonos, encastelados em seus aquários, os chefes de redação, como sempre alheios ao sofrimento do povo lá fora.