SOCIALISTA MORENA

Estupro e feminicídio são crimes contra a humanidade

Não estamos seguras nem no centro cirúrgico na hora do parto e nem depois de mortas, sobre a mesa do necrotério. Basta!

Imagem da mostra “Presenças Invisíveis”, no Museu da Justiça do Rio. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
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RITA ANDRADE

Se você demorar 10 minutos para ler esse texto, uma mulher ou menina terá sido estuprada no Brasil. Se você decidir dormir e deixar o texto para ser lido amanhã, uma mulher terá sido assassinada, vítima de feminicídio. É real essa revoltante cronologia.

A cada 10 minutos uma mulher é vítima de estupro em alguma Unidade da Federação do país e a cada sete horas uma mulher é morta simplesmente por sua condição de mulher, crime que caracteriza o feminicídio. A informação toma por base no período de março de 2020 a dezembro de 2021 e foi divulgada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Não é nossa roupa, o que dizemos, o que escrevemos ou como andamos na rua que nos mata, mas a cultura do machismo, o desinteresse do Estado, a falta de trajetos seguros e de iluminação pública, o descumprimento da lei e a ausência de uma educação voltada para a cidadania e o respeito

No Distrito Federal, o Fórum registrou 532 casos de estupros de mulher ou menina e 25 de feminicídio no período analisado. Aqui no DF, 80,3% dos estupros ocorrem dentro de casa, espaço que deveria ser de segurança para as mulheres e as crianças, mas que se tornou uma armadilha. Na maioria dos casos, o estuprador é um parente da vítima, amigo ou conhecido da família, raramente é um estranho.

E o número pode ser ainda muitíssimo pior. O Fórum destaca que nos primeiros meses de 2020, por conta da quarentena provocada pela pandemia de Covid-19, o acesso aos órgãos de segurança ficou limitado e as mulheres e as meninas não tiveram como pedir ajuda e denunciar as agressões sofridas. Em muitos casos, elas tiveram de conviver com o agressor dentro de suas casas por muito tempo. Sinistro…

As instituições falharam. O Estado falhou. O desgoverno, mais uma vez, mostrou sua incapacidade para garantir a segurança de mulheres e crianças. Não foram criadas estratégias de proteção e defesa das pessoas vulneráveis, não foi criado um sistema rápido de alerta e nem rondas nas regiões do DF onde os órgãos de segurança já sabem onde há maior ocorrência de crimes desta natureza.

As vítimas contaram apenas com o suporte de suas redes de proteção, como vizinhas e amigas, e com algum apoio das organizações não-governamentais que, por mais que façam, não conseguem assumir uma missão que compete ao Estado. Ninguém vai nos salvar a não ser nós mesmas.

Nós, mulheres, temos de ampliar as redes de proteção existentes e construir novas estratégias. Não é nossa roupa, o que dizemos, o que escrevemos ou como andamos na rua que nos mata. O que nos mata é a cultura do machismo, o desinteresse do Estado, a falta de trajetos seguros na cidade, a falta de iluminação pública, o descumprimento da lei e a falta de uma educação voltada para a cidadania e o respeito, entre outros aspectos. Nós, mulheres, exigimos políticas de proteção e novas estratégias de prevenção desses crimes bárbaros.

Hoje sabemos que não estamos seguras nem no centro cirúrgico na hora do parto e nem depois de mortas sobre a mesa do necrotério. O estupro é uma ferramenta de poder, onde o estuprador submete a vítima e a reduz a objeto disponível para seu prazer bestial, é uma arma. Basta! Vamos implementar políticas públicas que acabem com esses crimes "hediondos" que são o estupro e o feminicídio, que deveriam ser enquadrados dessa forma. Embora a Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, estabeleça as condições em que o estupro é um crime hediondo, não vemos, de fato, sua aplicação no Brasil.

É de extrema urgência que se tenham políticas preventivas contra tanta violência contra as mulheres, não podemos continuar sendo violentadas e mortas aos montes. Não podemos permitir que mais mulheres entrem nessas estatísticas de morte.

Basta, tirem as mão dos nossos corpos!

*Rita Andrade é feminista militante do Levante Feminista Contra o Feminicídio, Ativista da cultura, Radialista, Professora de Artes, po´s graduada em Desenvolvimento Humano de Gestores pela FGV. Conselheira Nacional de Cultura - CNPC e Presidenta do Conselho de Curadores da FBT (Fundação Brasileira de Teatro)