Ataques à petrolífera saudita acirram tensão entre EUA e Irã

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POR VERÔNICA D'ANGELO No último sábado, 14 de setembro, uma série de ataques realizados por meio de drones armados atingiram instalações de processamento de petróleo da Arábia Saudita, a maior exportadora mundial do produto. O bombardeio da maior planta de refinamento do mundo conseguiu  paralisar cerca de 50% da produção de petróleo do país por alguns dias e cerca de 6% da produção mundial de petróleo. Com isso, o valor do barril do produto chegou a aumentar até 20% no mercado inglês no início da segunda-feira, 16, trazendo questionamentos sobre as consequências para o mercado mundial e o impacto na política de preço aplicada nacionalmente pela Petrobrás. This image provided on Sunday, Sept. 15, 2019, by the U.S. government and DigitalGlobe and annotated by the source, shows damage to the infrastructure at Saudi Aramco's Abaqaiq oil processing facility in Buqyaq, Saudi Arabia. The drone attack Saturday on Saudi Arabia's Abqaiq plant and its Khurais oil field led to the interruption of an estimated 5.7 million barrels of the kingdom's crude oil production per day, equivalent to more than 5% of the world's daily supply. (U.S. government/Digital Globe via AP) Na segunda-feira, 16, Yahya Sarea, porta-voz dos Houthis, reivindicou a autoria dos ataques. Os houthis são um grupo rebelde iemenita que estão fortemente envolvidos na guerra civil do país, onde controlam uma boa parte do território na parte noroeste do Iêmen - e inclusive sua capital - desde 2015. Enquanto isso, uma coalizão liderada pela Arábia Saudita tenta restituir o governo de Abd Rabbuh Mansur Al-Hadi - o presidente atual reconhecido internacionalmente - por meio da intervenção militar, Operação Tempestade Decisiva, iniciada em março de 2015.  A autoria, porém, vem sendo contestada tanto por autoridades sauditas como por membros do governo norte-americano. Segundo essas autoridades, os ataques de sábado teriam vindo mais, provavelmente, do território iraniano - o que o governo do Irã refuta. Além das alegações envolvendo a análise da direção de onde vieram os drones, existem ainda afirmações de que os armamentos utilizados seriam de produção iraniana.  A recusa por parte dos governos de Arábia Saudita e Estados Unidos de reconhecer a autoria dos ataques por parte dos Houthis pode ser atribuída a uma série de questões. Primeiramente, mesmo que os ataques tenham sido elaborados pelo grupo iemenita, é essencial para a narrativa saudita que ele seja vinculado, de alguma forma, ao Irã. Apesar de ser difícil de mensurar a profundidade dos vínculos entre Houthis e os iranianos, essa ligação é frequentemente utilizada por parte da coalizão como meio de deslegitimar politicamente os Houthis - caracterizando-os como um grupo proxy do Irã e, portanto, ilegítimo para a disputa de poder no Iêmen - e justificar a própria intervenção militar de apoio ao governo de Hadi. Além da questão da disputa de narrativa, existe um constrangimento de cunho material nessa recusa. Segundo especialistas, os drones utilizados no ataque podem ter um custo médio de cerca de 15 mil dólares cada - valor completamente desproporcional ao investimento militar empregado pela Arábia Saudita que é atualmente a maior importadora de armamentos do mundo. Admitir que um ator não-estatal teria potencial de ameaçar não apenas seu território mas uma planta vital da empresa responsável pelo principal recurso que mantém o país seria entendido como reconhecimento de ineficiência de toda sua estratégia militar  de defesa. É difícil - ou até mesmo impossível - definir quem realmente foi responsável pelo ataque e, se tiver mesmo sido os Houthis, se houve ou não participação do Irã e qual a extensão desse apoio. Porém, já não seria a primeira vez que o grupo reivindica ataques contra embarcações sauditas ou mesmo em solo saudita. Além disso, é inegável a dificuldade que a Arábia Saudita vem enfrentando contra esse grupo no Iêmen, sem conseguir grandes avanços com a intervenção que já dura mais de quatro anos - o que pode demonstrar que os Houthis não são tão fracos como querem fazer crer os sauditas. Quanto às consequências no abastecimento de petróleo e os possíveis impactos causados pelo ataque, parece que a situação já dá sinais de normalização. O governo saudita deu uma previsão bastante otimista de retomada da produção, enquanto o governo americano respondeu à alta do dólar liberando suas reservas nacionais e, com isso, a alta apresentada na segunda-feira já caiu pela metade desde a quarta-feira, 18, e tudo parece indicar que deva ser normalizado em um curto espaço de tempo.  Os ataques de sábado e as  acusações de envolvimento iraniano ainda serviram para o governo norte-americano voltar a subir o tom em relação ao Irã. Em uma relação que já apresenta sinais de tensão, o acontecimento do último final de semana e a repercussão causada pode ser usada para legitimar novas  pressões internacionais nos iranianos. Porém, para além da questão do mercado de petróleo é preciso ressaltar   que a guerra do Iêmen - já é considerada a maior crise humanitária em curso atualmente no mundo, levando cerca de 80% da população iemenita a precisar de ajuda humanitária urgente. Com as disputas de narrativas criadas e reforçadas para a manutenção dos conflitos e interesses, quem continua saindo perdendo, como sempre, é a população civil - em sua maioria, mulheres e crianças para o “bem” do funcionamento da economia mundial