Diretoria da Petrobras avança na venda de refinaria da Bahia por valor bem abaixo do avaliado

"A operação, engendrada na calada da noite e no apagar das luzes de vários mandatos dos dirigentes, é suspeitíssima", afirma o senador Jean Paul Prates (PT-RN)

Foto: FUP
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O presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, a poucos dias de deixar o cargo, enviou um comunicado ao Conselho de Administração da empresa recomendando a aprovação da venda da Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia, mesmo admitindo que o valor de R$ 1,65 bilhão fechado com um fundo dos Emirados Árabes é menor do que o valor que a empresa realmente vale.

A informação do comunicado de Castello Branco veio à tona nesta terça-feira (23) através de matéria do Estadão, um dia antes da reunião do Conselho de Administração que vai votar a venda da refinaria.

Em fevereiro, petroleiros iniciaram uma greve contra a venda da Rlan. “São cerca de 900 trabalhadores próprios da Petrobras e 1.700 terceirizados que não receberam da empresa qualquer atenção durante o processo de venda, não foram ouvidos, e agora não sabem como será seu futuro. A legislação diz que a empresa tem de negociar com o sindicato todas as questões que envolvam sua força de trabalho, mas a gestão da Petrobras ignora isso e ainda tenta politizar uma greve que é legítima e justa pelos direitos dos trabalhadores”, afirmou Deyvid Bacelar, coordenador geral da FUP.

Levantamento do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), aponta que a Rlam estaria avaliada entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões, mas está sendo comercializada por R$ 1,65 bilhão.

“Um prejuízo não só para a Petrobras, como para os consumidores, que pagarão mais caro pelos combustíveis, pois a privatização das refinarias, como apontam vários especialistas, criará monopólios regionais privados, que irão determinar os preços dos derivados, sem qualquer controle do Estado brasileiro”, diz trecho de nota divulgada pela Fup.

Em nota, o senador Jean Paul Prates (PT-RN) denunciou o que considera uma "operação suspeita" para a venda da refinaria. "Conforme noticiado pelo Estado de S. Paulo, o documento reconhece que a refinaria está sendo vendida a preço 'inferior à faixa média de referência' estimada para o seu valor e salienta que o TCU fez questionamentos, sem encerrar a análise do negócio. Mesmo assim, a diretoria em fim de mandato insta os conselheiros para que tomem logo sua decisão a respeito da questão tormentosa amanhã mesmo, apesar de o presidente da empresa já ter seu mandato vencido e vários conselheiros já terem deixado seus cargos enquanto outros encontram-se em processo de substituição", escreveu o parlamentar.

"É um absurdo este processo, sem transparência, sem lógica, repleto de conflitos de interesses - com dirigentes cuja remuneração é proporcional à arrecadação pelos ativos alienados. Pairam suspeitas que associam à diretoria uma pressa extraordinária na venda, o que põe em xeque os incentivos por trás da política de bônus e prêmios", completou Prates, anunciando, ainda, que vai notificar o Conselho de Administração da Petrobras "e toda a cúpula do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre a potencial responsabilidade concorrente deles nesta operação".

Confira, abaixo, a íntegra da nota do senador sobre o assunto.

REFINARIA DA BAHIA SERÁ VENDIDA NA XEPA DA PANDEMIA E NA CALADA DA NOITE

Enquanto os brasileiros são impactados pelo recorde de 3.251 óbitos de hoje pelo coronavírus, e o Presidente da República faz mais um pronunciamento inócuo em cadeia nacional, a imprensa noticia o envio, por parte da diretoria da Petrobras, de uma suspeitíssima recomendação de fechamento da venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, para o seu Conselho de Administração.

Conforme noticiado pelo Estado de S. Paulo, o documento reconhece que a refinaria está sendo vendida a preço “inferior à faixa média de referência” estimada para o seu valor e salienta que o TCU fez questionamentos, sem encerrar a análise do negócio. Mesmo assim, a diretoria em fim de mandato insta os conselheiros para que tomem logo sua decisão a respeito da questão tormentosa amanhã mesmo, apesar de o presidente da empresa já ter seu mandato vencido e vários conselheiros já terem deixado seus cargos enquanto outros encontram-se em processo de substituição.

O Banco BTG Pactual afirmou que a proposta está 35% abaixo do limite inferior projetado por sua equipe de analistas. Outros especialistas afirmam que a refinaria vale, mesmo hoje, mais que o dobro do valor oferecido pelo fundo árabe interessado no preço promocional.

A operação, engendrada na calada da noite e no apagar das luzes de vários mandatos dos dirigentes, é suspeitíssima e, a meu ver, deverá jogar holofotes intensos sobre os interesses que motivam todo o processo.

Desde o início, considero que esta venda foge à lógica de qualquer gestão responsável de uma empresa integrada de petróleo - mais ainda de uma empresa estatal mista com atribuições especiais como a Petrobras. O financiamento do Pré-Sal é pretexto para incautos, pois é garantido pelo próprio valor das imensas reservas já comprovadas com investimentos da própria Petrobras.

A alegação de que a empresa está sendo obrigada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) também é estapafúrdia, já que foi a própria gestão Castello Branco quem foi voluntariamente ao Cade oferecer a venda de oito de suas principais refinarias, em 2019.

O Cade, por sua vez, nunca realizou análise específica dos mercados atendidos por estas refinarias. Portanto, nunca foi oficialmente comprovada e condenada a dominância da estatal em cada um deles e para cada um dos produtos (que se destinam a diferentes usuários ou compradores), sobretudo diante do pleno acesso de importadores a esses mercados, e da abertura para autorizações privadas de construção e operação de refinarias vigente desde 1997.

E pior: a Petrobras nunca se defendeu das minúsculas e especificas denúncias que geraram o processo no Cade, originalmente. Apenas aquiesceu, e ofereceu seu patrimônio.

A meu ver, esta diretoria da Petrobras já merece ser investigada profundamente, não apenas por possível prevaricação na defesa junto ao Cade, quanto por jamais ter solicitado que o órgão de defesa da concorrência suspendesse o prazo dado para tais alienações diante de uma pandemia que paralisou praticamente tudo no Brasil. Além disso, poderá ser responsabilizada, na pessoa de cada um de seus componentes, pela venda destes ativos por preço vil, sem poder, portanto utilizar o contexto da pandemia como desculpa.

É um absurdo este processo, sem transparência, sem lógica, repleto de conflitos de interesses - com dirigentes cuja remuneração é proporcional à arrecadação pelos ativos alienados. Pairam suspeitas que associam à diretoria uma pressa extraordinária na venda, o que põe em xeque os incentivos por trás da política de bônus e prêmios.

Estamos notificando neste momento cada um dos membros remanescentes do Conselho de Administração da Petrobras e toda a cúpula do Cade sobre a potencial responsabilidade concorrente deles nesta operação. A lupa da opinião pública, da imprensa, do Judiciário e do Legislativo (incluindo, mas não se limitando ao TCU) já está sobre cada um dos responsáveis por esta afoita e suspeita transação.

Jean Paul Prates
Senador da República
Estado do Rio Grande do Norte