Uma reportagem do Zero Hora que foi ao ar nesta segunda-feira (29) conversou com um ex-funcionário das Pousadas Garoa, onde na última semana ocorreu um incêndio que deixou 10 mortos e 15 feridos. Ele fez revelações bombásticas sobre o caso.
Entre outras coisas, revelou que uma servidora da Prefeitura de Porto Alegre - encabeçada pelo prefeito Sebastião Melo (MDB) - avisava com antecedência as datas em que o poder público faria vistorias no local dedicado a abrigar a população que vive em situação de rua na capital gaúcha.
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De posse dessas informações, o proprietário e os gestores então conseguiriam agilizar uma limpeza e maquiar problemas estruturais e de higiene do local antes que os funcionários da Fundação de Assistência Social e Cidadania chegassem.
Esses funcionários jamais teriam entrado nos quartos disponibilizados para a população de rua e faziam apenas “inspeções rápidas”. O jornal conversou com a servidora que confirmou a prática e a justificou por conta da “privacidade dos hóspedes”.
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Uma tabela referente a julho de 2023 mostra as datas das inspeções em diversas unidades, incluindo a que sofreu com o incêndio. O documento foi divulgado pela reportagem. Entre outras coisas, aponta que as vistorias estavam agendadas para os dias 5, 12, 19 e 27 daquele mês.
Por sua vez, o ex-funcionário - que trabalhou por 5 anos nas Pousadas Garoa - afirmou que o arquivo foi compartilhado num grupo de WhatsApp da empresa semanas antes.
Algumas mensagens trocadas no grupo de WhatsApp revelaram preocupação com as vistorias. Uma pessoa identificada com o nome da empresa diz que os funcionários não devem deixar as inspeções serem realizadas sem a presença de um representante das Pousadas Garoa.
Na mesma mensagem, a pessoa também afirma que um segurança identificado como “Sanchez” chegou a impedir a entrada de funcionários da Prefeitura que fariam inspeções.
Em outra mensagem, um usuário identificado como “Pousada Escritório” reclamou da sujeira em uma das unidades, que não correspondia “com as fotos mostradas no site”. “Uma verdadeira imundice”, escreveu.
O incêndio
Um incêndio em uma pousada na região central de Porto Alegre na madrugada da última sexta-feira (26), acabou com a morte de dez pessoas e outras 15 feridas. O fogo, de acordo com os bombeiros, começou por volta das 2h da madrugada e só foi controlado em torno das 5h.
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), o estado de saúde de duas das pessoas resgatadas é grave e elas estão entubadas. Outra, também grave, teve 20% do corpo queimada.
Ainda segundo o Corpo de Bombeiros, o espaço funcionava de forma irregular, não tinha alvará ou plano de proteção contra incêndio. A corporação informa também que a proximidade dos quartos fez com que o fogo se alastrasse rapidamente e que as pessoas fossem impedidas de sair.
O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), afirmou através de suas redes que acompanha com "profunda tristeza" a apuração do incêndio.
"A prioridade agora é o atendimento aos cidadãos resgatados e encaminhados ao HPS. A prefeitura trabalha para acolher os moradores e apoiar a investigação dessa tragédia", disse ele em sua conta no X (antigo Twitter).
Incêndio criminoso?
O coordenador municipal de Proteção e Defesa Civil de Porto Alegre, coronel Evaldo de Oliveira Junior, informou ao Zero Hora, de Porto Alegre, que, "preliminarmente, a informação é que se trabalha também com a hipótese de um incêndio criminoso".
“Existem informações de que o indivíduo poderia ter entrado na pousada na madrugada”, disse.
Já a capitã Barbara Oliveira, oficial de serviço, disse que os moradores do local “são pessoas em situação de vulnerabilidade, de rua, que estavam na edificação. Com as chamas, eles se assustaram e alguns deles acabaram pulando da marquise para escapar das chamas”.
Os quartos no local custavam cerca de R$ 550 por mês. O site do local informa que "nossas pousadas tem como perfil moradores solteiros e sem filhos. Tanto para mulheres, quanto para homens. Cada morador tem o seu quarto individual", diz a Pousada Garoa.
A Lei assinada por Bolsonaro
A lei sancionada por Bolsonaro, conhecida como Lei da Liberdade Econômica, estabeleceu “normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica”.
Em Porto Alegre, a lei ganhou uma variação local, de autoria de Ricardo Gomes (PL-RS), Felipe Camozzato (Novo) e Pablo Mendes Ribeiro (MDB.
“Não é o Estado, não é a mão pesada do governo que cria emprego e renda, são as pessoas, os indivíduos – todos e cada um dos indivíduos – quando atuam no fenômeno mais social que existe que é a economia livre, onde todos nós podemos atuar”, disse Ricardo Gomes.
Na época, o então vereador Felipe Camozzato (Novo) – hoje deputado estadual – disse que uma das “vantagens” da lei era “impedir que sejam exigidos documentos não previstos em lei”.
“Acreditamos que o Estado não deve representar um obstáculo para aqueles que empreendem e querem ser formalmente empreendedores. Em Porto Alegre, são 57 atividades (…) classificadas como de baixo potencial poluidor (…) que podem ser positivamente impactadas pela lei de liberdade econômica”, disse Camozzato na sessão de 2019.