Um erro de uma letra no nome foi suficiente para transformar a vida do eletricista Jabson Andrade da Silva, de 56 anos, em um pesadelo. Morador do Grajaú, na Zona Sul de São Paulo, ele passou nove dias preso injustamente no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Pinheiros, Zona Oeste da capital, acusado de um crime cometido por outra pessoa — com nome quase idêntico.
O verdadeiro alvo da Justiça era Jabison Andrade da Silva, acusado de estuprar a enteada entre 2008 e 2015 na cidade de Ubatã, interior da Bahia. Mas o mandado de prisão expedido trazia o nome de Jabson — com erro de grafia desde o inquérito inicial — o que levou à prisão do eletricista, que vive em São Paulo desde 1991, é casado há mais de três décadas e nunca teve passagem pela polícia.
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A prisão ocorreu no dia 7 de julho, durante uma megaoperação para prender foragidos. Jabson estava em casa com a esposa quando foi surpreendido pelos policiais. “Disseram que era um mandado da Bahia, por estupro de vulnerável. Eu falei na hora que era um erro, que minha consciência estava limpa. Minha mulher começou a passar mal”, contou ele ao g1.
Apesar de insistir na inocência, foi levado para a delegacia, passou por audiência de custódia e acabou recolhido ao CDP Pinheiros, onde viveu dias de medo e humilhação. “Me chamaram de ‘arrombado’, rasparam minha cabeça. Lá dentro, é um lugar desumano. Te tratam como se você fosse lixo”, relatou.
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Ele foi mantido isolado na ala conhecida como “Seguro”, onde ficam presos que correm risco de agressão. A situação só começou a mudar quando a família conseguiu reunir provas de que se tratava de um caso de homonímia.
Mobilização da família e erro reconhecido
A filha de Jabson, Catherine Lourenço, foi uma das primeiras a notar a incoerência. “A mulher que denunciou o crime disse que o acusado era seu companheiro, com quem viveu por seis anos na Bahia. Meu pai nunca teve enteada, nem morou lá nesse período. Ele trabalhava como zelador em São Paulo, com carteira assinada”, explicou.
A família acionou um advogado, reuniu documentos, entrou em contato com a imprensa baiana e conseguiu que o caso fosse noticiado na cidade da denunciante. A repercussão ajudou a acelerar o processo.
Em nota, o Tribunal de Justiça da Bahia informou que o juiz responsável determinou a soltura de Jabson após o Ministério Público e a Polícia Civil reconhecerem o erro no inquérito e na denúncia. O MP baiano confirmou que emitiu parecer no dia 11 de julho pedindo a revogação da prisão preventiva.
O advogado Carlos Magno, que representa Jabson, criticou a falta de diligência da Justiça. “Não houve checagem básica de RG, CPF, data de nascimento. Prenderam um inocente sem verificar o mínimo. Um erro desse não pode acontecer.”
Liberdade e pedido de indenização
O alvará de soltura foi expedido no dia 15 de julho. Jabson reencontrou a família na porta do CDP, visivelmente emocionado. “Foi um alívio. Eu só queria voltar para casa. Quero entrar com ação contra o Estado. Não pelo dinheiro, mas para que isso não se repita com outros”, afirmou.
Ele ainda tenta lidar com o trauma. “Eu via reportagens sobre gente presa por engano, mas nunca imaginei que aconteceria comigo. Foi uma experiência que não desejo nem para o meu pior inimigo.”
Até o momento, a Polícia Civil da Bahia não informou se o verdadeiro acusado, Jabison, foi localizado ou preso.
O que dizem as autoridades da Bahia
Tribunal de Justiça:
"O juiz Eduardo Camillo, Titular da Vara de Ubatã, comunicou que: 'o Ministério Público e a Polícia Civil acusaram que erraram no Inquérito Policial e na denúncia informando outra pessoa. Com isso, eu decidi pela liberdade dele ontem à tarde. Alvará de soltura já devidamente assinado'."
Ministério Público:
"Informamos que o Ministério Público do Estado da Bahia apresentou parecer à Justiça, na última sexta-feira (11), manifestando-se pela revogação da prisão preventiva de Jabson Andrade da Silva. No documento, o MPBA registra que, após detida análise dos autos e da petição apresentada pela defesa, constatou-se a existência de indícios de possível equívoco na qualificação do custodiado, apontando possível homonímia entre ele e o real autor dos fatos."
Polícia Civil:
A Polícia Civil da Bahia foi procurada, mas não respondeu.
O que dizem as autoridades de São Paulo
Secretaria da Segurança Pública:
"A Polícia Civil esclarece que a prisão do homem citado ocorreu com base em um mandado de prisão em aberto expedido pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia e cadastrado no Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões (BNMP). Após a detenção, o mesmo permaneceu à disposição da Justiça. Informações sobre o inquérito policial e indiciamento do homem devem ser solicitadas junto aos órgãos competentes do Estado da Bahia."
Tribunal de Justiça:
"Como se trata de processo de outro Estado, a única informação que temos aqui é que ele passou por audiência de custódia no TJSP em 8/7/25, por um cumprimento de mandado de prisão."
Secretaria de Administração Penitenciária:
"A Secretaria da Administração Penitenciária informa que a pessoa citada foi colocada em liberdade ontem (15), em virtude de revogação de prisão preventiva concedida pelo Poder Judiciário."