David Miranda: Um alerta ao Rio

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Homofobia, intolerância religiosa, xenofobia e a forma como Crivella incentiva esses e outros retrocessos no Rio de Janeiro. Leia no artigo de David Miranda Por David Miranda* No conjunto de diferenças e semelhanças que caracterizam os seres humanos, a convivência livre de discriminação é o nosso bem maior. E, para esse fim, devemos exigir sempre o respeito à diversidade. Melhor seria que não precisássemos reforçar a importância da aceitação do “outro”, mas, infelizmente, nos dias atuais falar sobre a diversidade se tornou necessidade premente. Uma parte da população não se constrange mais de exibir seus preconceitos e ódios com palavras e gestos violentos. Não aceita a convivência plural entre os grupos que formam a sociedade e revela, cada vez mais, discriminações baseadas em critérios que abrangem etnia, gênero, religião, imagem corporal, classe, território, pessoa portadora de deficiência, pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros). Neste contexto, vou situar o Rio de Janeiro, que de vanguarda nacional em termos de costumes e pluralidade hoje deixa a desejar em muitos aspectos. Podemos citar alguns exemplos mais recentes como o rapaz sírio ameaçado porque vendia esfirras em Copacabana; pessoas transexuais que são atendidas em hospitais do município semanalmente vítimas de agressões; o casal de gays atacado por vizinhos na Tijuca; as invasões em centros de candomblé e umbanda; a adolescente que ouvia com frequência frases como “macumbeira tem que morrer”; as bombas caseiras jogadas no centro espírita Casa do Mago; entre tantos outros casos. Por essas inaceitáveis atitudes, que a bem da verdade não estão restritas ao Rio, podemos afirmar que é muito prejudicial a maneira como o prefeito Crivella vem tratando as manifestações públicas e tradições festivas da cidade. Como demonstração da inexistência de respeito à diversidade, o administrador do município escolheu como um dos primeiros alvos a Parada LGBT. Por meio de notas plantadas em jornais e blogs e boatos generalizados, os movimentos LGBT souberam que a prefeitura não iria oferecer estrutura e ajuda financeira à Parada de Copacabana. Claro que não faltaram declarações públicas de uma parcela da sociedade contra a Parada enumerando razões homofóbicas para acabar com o evento. O movimento organizado exigiu respeito e, após tal conflito, o prefeito divulgou uma proposta de licitação para empresas se responsabilizarem pela montagem da caminhada, uma decisão ainda nebulosa. Uma nova polêmica não tardou a surgir: a declaração do corte de verba pública para o carnaval, em que Crivella semeou a falsa controvérsia “É melhor investir no carnaval ou em creche?” E as redes sociais foram tomadas por ataques à festa do Momo. Nenhuma dessas críticas levara em conta o fato de o carnaval gerar lucro e empregos para a cidade. Dias depois, saiu no Diário Oficial o decreto criando uma medida centralizadora e autoritária: a obrigatoriedade de autorização prévia do gabinete do prefeito para a realização de “eventos de cunho religioso”. Outra grita foi formada e não faltou quem afirmasse que esses tradicionais festejos cariocas, como o Dia de Iemanjá, causassem transtornos à cidade. Dessa vez, Crivella retirou, na semana seguinte, o termo que se referia à religião, deixando sob a batuta de seu gabinete a decisão sobre “eventos gerais” na cidade, mesmo tendo órgãos competentes para tratar da questão. Seguindo o mesmo formato, Crivella provocou diversas reações quando suspendeu, no primeiro semestre, parte das tradicionais apresentações de roda de rima nas praças cariocas. Com essas iniciativas, o prefeito vem gerando ciclos de tensão. Ele tem lançado grupos da sociedade contra outros, revelando uma postura dissimulada de incentivar a negação à pluralidade. Um perigoso comportamento, pois estamos longe de imaginar o que pode acontecer se atitudes de não aceitação ao que é diferente fizerem aflorar novos adeptos, sejam da intolerância religiosa ou a festas de matriz africana, da homofobia ou de outras formas de exclusão. Apesar dos crescentes ataques ao povo carioca, o Rio de Janeiro tem um histórico de resistência popular muito forte, também protagonizado por quilombolas, pelo povo de santo, por mulheres e LGBT. Esses grupos vão saber fazer frente à postura desrespeitosa e obscurantista de Crivella, defendendo a maior riqueza da nossa cidade que é a diversidade. *David Miranda é vereador pelo PSOL do Rio de Janeiro