Dizer que ditadura foi gloriosa é ignorância sobre período, afirma especialista

De acordo com o professor Flávio de Leão Bastos Pereira, especialista em Direito Constitucional da Universidade Presbiteriana Mackenzie, “esse tipo de declaração é fruto da ignorância e da baixa escolaridade no Brasil.”

Escrito en BRASIL el
Mesmo com notórios casos de corrupção, mordomias e violações de direitos humanos, a ditadura militar ainda é vista por algumas pessoas como um período de glória para o Brasil. Alguns chegam até a pedir pela volta do regime. Porém, essa exaltação é um equívoco de quem ignora o que aconteceu entre 1964 e 1985. De acordo com o professor Flávio de Leão Bastos Pereira, especialista em Direito Constitucional da Universidade Presbiteriana Mackenzie, “esse tipo de declaração é fruto da ignorância e da baixa escolaridade no Brasil”. Segundo ele, isso mostra que muitos brasileiros não conhecem a sua própria história e, com isso, correm o risco de repetirem erros do passado. Para ilustrar a situação, Pereira diz que países como Alemanha, que conviveu com o nazismo, e África do Sul, que amargou o apartheid, reconhecem os problemas que viveram. Pessoas que apoiam os regimes são punidas por lei nos países. Já no Brasil, quem exalta a ditadura, na maioria das vezes, não responde a nenhum processo. “O brasileiro precisa entender a dinâmica da sua própria história, se não, vai cometer os mesmos erros”, diz o especialista. “O brasileiro não gosta de estudar e isso tem esse efeito, que é perigoso”, afirma o professor, que diz que o trabalho realizado pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) foi bom, mas que foi apenas um “pontapé inicial” para se revelar todos os crimes cometidos na época. Como acontece em todos os regimes ditatoriais, as verdades sobre inúmeras violações eram escondidas da população e só vieram à tona depois de duas décadas do final do regime. Muitos dos militares que cometeram os crimes na época, nem estavam mais vivos quando o Brasil soube dos horrores que aconteciam na ditadura. “Como era um regime hermético e pouco transparente, aconteciam inúmeros casos de corrupção”, diz Pereira lembrando que é impossível fazer denúncias contra o governo quando as instituições públicas não podem atuar livremente em investigações e quando a imprensa não é livre. “Era comum que o cidadão se deparasse com uma receita de bolo ou um verso de Camões quando a notícia tinha sido censurada. Então, os casos de corrupção não vinham à tona”, afirma o professor. Sendo assim, é necessário que a gestão da coisa pública seja transparente, para se ter um controle do que está sendo feito no país. “A liberdade de imprensa é essencial para a democracia”, constata. Um exemplo dado pelo especialista é o caso do envolvimento de Sérgio Fernando Paranhos Fleury, que era delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), com o chamado “esquadrão da morte”, que atuava nas periferias de São Paulo durante os anos 60 e 70. “O homem que deveria representar a lei não o fazia. Era um criminoso. E nós temos vários casos assim. Você não tinha mecanismos de controle dessas situações”, afirma o professor. Além de todos os problemas para coibir e denunciar os crimes cometidos pela ditadura, o tipo de relação de corrupção que se fortaleceu entre poder público e privado se mantém até hoje no Brasil. “A dinâmica da promiscuidade continua”, diz. Isso, segundo ele, é um dos legados mais nefastos deixados pelo regime no Brasil.

Temas