Feminista, Lola diz que Chico poderia cantar "Com Açúcar e com Afeto" até o fim dos tempos

Para professora que milita na causa feminista, a decisão do grande nome da música brasileira não foi motivada por censura. Caso teria servido como desculpa para ataque às “pautas identitárias”

Lola Aronovich e Chico Buarque (Arquivo pessoal e Instituto Lula)
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A professora da Universidade Federal do Ceará Lola Aronovich, que é ativista da causa feminista, foi às redes sociais para afirmar que não vê censura na decisão do cantor e compositor Chico Buarque de não cantar mais “Com açúcar, com afeto”, uma música composta em 1967 para ser interpretada por Nara Leão. Para a acadêmica, “Chico pode cantá-la até o fim dos tempos”.

“Adoro "Com Açúcar, com afeto", sempre cantarolei. Considero uma bela música que denuncia uma situação machista. Apesar da canção ter a minha idade (54 anos), ainda existem muitas mulheres que vivem isso... Mas a canção não está sendo censurada. Chico só disse que não vai mais cantá-la. Por mim pode cantá-la até o fim dos tempos. E acho louvável Chico falar que sempre dará razão às feministas. Ele é perfeito. Se der tempo escrevo um pouco sobre isso amanhã. E aproveito para mostrar meu autógrafo”, postou a ativista em seu perfil do Twitter.

Em contato com a reportagem da Fórum, Lola explicou de forma mais detalhada por que não viu uma ação de censura ou cerceamento na retirada da canção por parte de Chico Buarque de “Com açúcar, com afeto” de seus futuros set lists.

“Não considero a música machista. Ela pode ser interpretada como uma denúncia de uma situação machista. Uma situação que infelizmente está longe de ter ficado no passado. Inúmeras mulheres enfrentam isso ainda hoje. De todo modo, é uma personagem narrando a sua experiência. Livros, filmes, peças, poemas, histórias em quadrinho, canções, enfim, todas as obras podem incluir personagens machistas, racistas, LGBTfóbicos, capacitistas, etaristas, gordofóbicos, etc. Seria até estranho se não incluíssem, já que nosso mundo está cheio de gente assim. E essas personagens podem ser protagonistas dessas obras. Podem ser narradoras. Criar um personagem preconceituoso não faz com que a obra ou o autor seja automaticamente preconceituoso. Não vi feministas problematizando "Com Açúcar, com afeto", uma canção que eu considero belíssima, ainda mais na voz da Nara Leão. O que vi, na realidade, foi o pessoal problematizando o identitarismo em geral e as feministas em particular, pra variar. Mas alguma feminista deve ter conversado com o Chico, porque ela entendeu a canção como ultrapassada, e Chico, perfeito como sempre, decidiu não cantá-la mais. Tem gente confundindo uma decisão pessoal de um artista com censura. Não me parece nada disso. Chico tem quase 500 composições no seu repertório. Obviamente para um show ele vai escolher apenas algumas. E não vai mais escolher "Com Açúcar, com afeto" porque ele aceitou que está datada. Não significa que a gente não possa continuar cantando e adorando a música, ou que ele vai removê-la do YouTube. Não significa nem que a gente tenha que concordar com a decisão dele”, opinou Lola Aronovich.

Entenda a decisão de Chico

Chico Buarque de Hollanda, um gigante da música brasileira, afirmou durante o programa “O canto livre de Nara Leão”, dirigido por Renato Terra, para a Globoplay, que não cantará mais a canção "Com açúcar, com afeto" por conta das críticas dos movimentos feministas ao machismo da letra, que discorre sobre uma mulher que é deixada diariamente em casa enquanto o marido sai para beber todas as noites.

A decisão de Chico abriu uma interminável discussão nas redes sobre censura, uma vez que para algumas figuras do próprio campo progressista, pressionar um artista para que ele suspenda uma canção cuja letra apenas narra uma história de abusos e machismo seria o mesmo que cercear sua liberdade de pensamento e de criação. No fluxo do turbilhão de opiniões sobre a retirada da música de suas apresentações veio também uma série de acusações contra um campo da esquerda que seus críticos chamam de “identitarismo”.