Mães se reúnem para denunciar descaso nas escolas públicas cariocas

Segundo movimento de mães, a carga horária das crianças da rede foi reduzida, assim como as refeições, e o recreio foi retirado

Foto: Agência Brasil
Escrito en BRASIL el
Um grupo de mães de alunos da rede pública municipal de ensino do Rio de Janeiro se reuniu na semana passada para denunciar o que consideram ser "uma série de arbitrariedades e irregularidades" cometidas pela prefeitura, por meio da Secretaria de Educação. Elas relataram à Fórum o que vem ocorrendo, mas preferem manter o anonimato. “No movimento, tiramos a posição de ninguém colocar nome ou aparecer. Não queremos nos expor e expor nossos filhos, pois a prática de assédio é bem comum, sobretudo sobre pais e mães que são funcionários da prefeitura”, conta a mãe de um menino, que estuda no ensino fundamental 1 de uma escola municipal. O grupo divulgou um manifesto no Facebook para relatar os fatos. “Há uma série de coisas graves acontecendo, que só quem vive o cotidiano da escola sabe, pois a Secretaria Municipal de Educação nega”, dizem. “É prática comum eles comunicarem suas diretrizes ‘de boca’ às direções das escolas, para que não existam provas. Na prática, a alimentação das crianças está chegando em menor quantidade e pior qualidade, com mais itens industrializados. Além disso, faltam professores, mas o número não é informado pela prefeitura. A escola do meu filho está sem professor de inglês, mas existem escolas sem diversos professores. Os estudantes com necessidades especiais precisam de agentes educacionais de apoio. Na sala do meu filho, por exemplo, há apenas uma agente (mediadora), para três crianças com necessidades totalmente diferentes”, conta uma mãe. O item segurança também está sendo esquecido, segundo as mães dos alunos. “Não há porteiro para garantir entrada e saída da escola em segurança. Não há esquema de combate a incêndio. Chegaram livros didáticos, porém em quantidade insuficiente e só serão distribuídos quando o restante chegar, sabe-se lá quando. Não foi distribuído material escolar”, acrescenta. De todas as unidades da rede, só 7,8% (120) têm o aval do Corpo de Bombeiros. Os dados são da própria Secretaria Municipal de Educação e foram obtidos por um requerimento de informações feito pelo vereador Paulo Pinheiro (PSOL), segundo reportagem do Extra. LDB Existem outros problemas, conforme revela uma das mães: “O descumprimento da lei maior da educação do Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A Secretaria Municipal de Educação (SME) afirma que está cumprindo os 200 dias letivos e 800 horas asseguradas em lei. Mas não sabemos como chegaram a essa conta.” Na verdade, conforme a mãe, o cálculo real aponta 185,5 dias letivos e 742 horas-aula, ou seja, abaixo do exigido. “Isso é muito grave, porque se trata do mínimo que deve ser cumprido. Quatro horas de escolaridade por dia é muito pouco.” A situação se revela mais grave ainda, na medida em que se observa o contexto de vida da maioria dos estudantes das escolas municipais do Rio. “A escola é a única referência de cidadania para muitas das mais de 600 mil crianças do município que nelas estudam. Não somos a Finlândia. Nesse calendário temos, em três semanas de todos os meses, ao menos um dia em que as crianças têm apenas duas horas de aula. Isso começou a ocorrer no segundo semestre do ano passado e agora se consolidou no calendário oficial”, protesta. Recreio Para compensar a redução de carga horária letiva, as crianças perdem o recreio, ou seja, ficam quatro horas direto em sala de aula, ou, em alguns casos, têm um pequeno intervalo para um lanche rápido, sem brincar. “Sabemos o que a brincadeira e a socialização representam na formação pedagógica das crianças. É fundamental. Ajuda a aprender, inclusive. No caso de crianças com necessidades especiais, é impossível permanecer quatro horas em sala de aula sem descanso. E as professoras? Como farão sem esse tempo para respirar, ir ao banheiro, conversar com as colegas de trabalho, se alimentar?”, questiona. Sem satisfação As mudanças foram efetuadas sem aviso prévio às mães e pais dos alunos. “Vimos o calendário publicado tardiamente e aí notamos as mudanças. Uma semana antes do início das aulas houve reuniões com responsáveis em algumas escolas, outras fizeram suas reuniões já na primeira semana de aula”, conta. Agora, o grupo está recorrendo ao Ministério Público e à defensoria pública para que os direitos de seus filhos sejam garantidos. “Recorremos, também, à Câmara de Vereadores para que os parlamentares nos ajudem a abrir canais de escuta na SME.” Direito básico O grupo faz questão de deixar claro que não é uma associação. “Somos pais e mães que nos encontramos em portas de escolas e num grupo do Facebook criado há tempos para troca de informações sobre o ensino público em todo o país. Percebemos que nossas insatisfações eram as mesmas que víamos nas redes sociais, nos grupos de WhatsApp das escolas, e, começadas as aulas, nas próprias escolas. Reunimos essas queixas e colocamos em textos e ações”. “Gostaria de acrescentar que nossa pauta não é ideológica, a favor ou contra deste ou daquele governo, partido etc. Estamos apenas defendendo um direito básico de cidadania garantido constitucionalmente: educação pública de qualidade para todos. Educação não é favor, nem caridade. É direito”, completa. Posição da SME Em nota, a Secretaria Municipal de Educação do Rio, como era de se esperar, nega as denúncias do grupo de mães. “Não houve diminuição da alimentação e nem houve baixa de qualidade. Pelo contrário. A partir deste ano, todos os alunos de Ensino Fundamental de horário parcial passam a receber além do almoço, mais um lanche, composto de leite (com farinha láctea, chocolate ou banana) ou iogurte, além do tradicional pão com manteiga ou biscoitos. Todos os dias são servidas mais de um milhão de refeições nas escolas municipais do Rio. O cardápio das unidades escolares da Rede Municipal é elaborado por nutricionistas do Instituto Annes Dias, órgão vinculado à Secretaria Municipal de Saúde. Não faltam agentes educacionais. Inclusive, nos últimos dois anos, a Secretaria Municipal de Educação convocou 2.274 Agentes de Apoio à Educação Especial, zerando o banco de aprovados do concurso realizado em 2014. Não faltam professores. Nos últimos dois anos, a Secretaria Municipal de Educação convocou mais de 2.100 professores, sendo mais de 100 profissionais chamados em janeiro último. Por conta da necessidade de observância ao limite prudencial em gastos com pessoal, previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal, as convocações ocorrem para cobrir as vagas decorrentes de vacância de professores da Rede por motivo de óbito e aposentadoria. A SME está realizando contratação de funcionários para controlar o acesso das unidades. Além disso, está previsto novo concurso para Agente de Educador. Não procede a informação sobre a falta de esquema de combate a incêndio. Mais de 12 mil funcionários estão treinados para atuar em caso de emergência nas escolas. Todas as unidades da Rede são dotadas de extintores de incêndio em todos os pavimentos. Para este ano letivo, todos os alunos do 1º ao 9º do Ensino Fundamental receberão um exemplar de livro didático por semestre e o material foi desenvolvido por professores da própria SME. O material é mais um instrumento pedagógico para suporte ao professor junto aos seus alunos. Também há livros didáticos oferecidos pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Diretores e professores das unidades escolares têm autonomia para analisar e escolher as obras que serão utilizadas pelos alunos em suas escolas. Outra informação falsa. Estão garantidos no calendário escolar 202 dias letivos e 875 horas, quantitativo acima do mínimo previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional”, finaliza a nota. Nossa sucursal em Brasília já está em ação. A Fórum é o primeiro veículo a contratar jornalistas a partir de financiamento coletivo. E para continuar o trabalho precisamos do seu apoio. Saiba mais.