MPF vê incentivo a grilagem em terra indígena com regra da Funai e processa órgão

Instrução normativa exclui territórios não homologados, mas em processo de delimitação, de sistema que faz a gestão fundiária; Bolsonaro prometeu não ampliar demarcação de áreas indígenas no país

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O Ministério Público Federal (MPF) em Rondônia está processando a Funai e o Incra devido à Instrução Normativa 09 (IN 09), que excluiu as terras indígenas não homologadas do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef). Para o MPF, essa instrução incentiva a grilagem em terras indígenas. Isso porque permite que posseiros tenham uma declaração emitida pela Funai de que os limites de determinado imóvel não estão dentro de terra indígena homologada, mesmo que estejam em áreas reivindicadas por indígenas, em processo de delimitação e de demarcação.

A procuradora da República Gisele Bleggi e o procurador da República Raphael Bevilaqua argumentam na ação que “a IN 09, ao retirar do Sigef as terras indígenas nas demais fases do processo de demarcação, gera uma gravíssima insegurança jurídica, pois atestará para terceiros a falsa ausência de sobreposição com terras indígenas quando, na verdade, a Funai já tem conhecimento dessa sobreposição”.

Uma das promessas de campanha de Jair Bolsonaro (sem partido) era não demarcar “nenhum centímetro a mais de terra indígena” em seu governo.

Na ação civil pública, o MPF pede que a Justiça obrigue a Funai e o Incra a incluírem todas as terras indígenas no Sigef e no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar), mesmo que o processo de demarcação não esteja concluído.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) tem entendimento diferente. Em nota publicada em abril deste ano, o órgão justificou a medida dizendo que incluir as terras sob estudo de delimitação no Sigef “impedia a emissão de atestados administrativos aos respectivos proprietários, impedindo o usufruto pleno sobre as glebas”. Também usou pareceres segundo os quais tal medida, que a nova IN suprimiu, seria “inconstitucional”.

Mas o MPF afirma na ação que a IN 09 contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação, além de criar uma “indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição, cuja aplicabilidade se impõe inclusive aos territórios não demarcados”.

Na região norte de Rondônia, as terras indígenas que devem ser incluídas no Sigef são Igarapé Lage, Pacaás Novos, Rio Guaporé, Sagarana, Rio Negro Ocaia (localizadas em Guajará-Mirim), Karitiana (em Porto Velho e Candeias do Jamari) e a Reserva Indígena Cassupá/Salamãi (Porto Velho).