Negros e pardos são mais de dois terços dos pacientes de Covid no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, diz estudo

Artigo na prestigiada revista The Lancet analisou 250 mil internações em hospital por coronavírus no país entre fevereiro e agosto de 2020 e mostra a desigualdade no acesso à saúde

Ambulatório em Manaus. Foto: Prefeitura de Manaus
Escrito en BRASIL el

Um estudo publicado na revista científica The Lancet revela a desigualdade no acesso à saúde no país. A mortalidade é maior entre os pacientes hospitalizados no Norte e Nordeste e também entre analfabetos, pretos e indígenas.

Foram analisados dados de quase 250 mil pacientes que foram internados com Covid-19 em 4407 municípios entre os dias 16 de fevereiro e 15 de agosto de 2020. “A mortalidade hospitalar foi alta, mesmo em pacientes com menos de 60 anos, e foi agravada pelas disparidades regionais existentes no sistema de saúde do país”, dizem os pesquisadores.

“As diferenças regionais também se refletiram na proporção de pacientes internados nas capitais, que foi sensivelmente menor nas regiões Sul e Sudeste, possivelmente refletindo melhor disponibilidade de serviços de saúde para atender a demanda dessas regiões”, completam.

No geral, a mortalidade hospitalar foi de 38%, sendo de 59%, entre os pacientes que foram admitidos em UTI, e 80% para aqueles que foram ventilados invasivamente. No entanto, ao comparar regionalmente há uma disparidade no percentual de pessoas internadas em UTIs que morreram: 79% no Norte; 66% no Nordeste; 53% no Sul; 51% no Centro-Oeste; e 49% no Sudeste.

“Há grande heterogeneidade entre as cinco macrorregiões (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul), incluindo heterogeneidade socioeconômica, que se reflete na qualidade dos serviços regionais de saúde, incluindo a disponibilidade de leitos hospitalares e profissionais de saúde capacitados.”

Quase metade (47%) dos 254.288 hospitalizados tinha menos de 60 anos; 56% eram do sexo masculino; e 74% tinham uma ou duas comorbidades.

A proporção de mortalidade foi maior quanto menor a escolaridade: 63% entre os analfabetos; 30% entre aqueles com ensino médio, e 23% com graduação.

As mortes também foram mais frequentes entre os pretos e pardos (43%) e indígenas (42%), contra 40% de origem asiática e 36% brancos.

No entanto, conforme o estudo, pacientes negros ou pardos representaram mais de dois terços dos casos de Covid-19 nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Para o médico infectologista Marcos Caseiro, esse índice de 80% de mortalidade para quem chegou à UTI é muito alto. “Aqueles cidadãos que fizeram congestionamento de jatinhos em Trancoso podem estar internados, mas estão no Sírio Libanês, ou no Einstein, onde certamente tem um nível de atendimento que não há em outros locais. Mas aqueles que serviram eles são internados no serviço público, correndo o risco de nem ter oxigênio. Essa é a realidade do nosso país.”

Assinam o artigo os pesquisadores Otavio T Ranzani, Leonardo S L Bastos, João Gabriel M Gelli, Janaina F Marchesi, Fernanda Baião, Silvio Hamacher e Fernando A Bozza. Veja a íntegra aqui.

Confira entrevista com Marcos Caseiro

https://youtu.be/GFRgp_qTTLw

Com BBC.