“O mensalão petista é um erro jurídico”, diz Pedro Serrano

Para especialista, o julgamento do mensalão tucano serve como exemplo para provar que o julgamento da AP 470 foi um o julgamento mais fora de sintonia do STF

(Foto: jus.br)
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Para especialista, o julgamento do mensalão tucano serve como exemplo para provar que o julgamento da AP 470 foi um o julgamento mais fora de sintonia do STF Por Marcelo Hailer Por oito votos a um o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (28) enviou para primeira instância da Justiça de Minas Gerais a ação penal contra o ex-deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB-MG) por conta do caso que ficou conhecido como “mensalão tucano”. O ministro Joaquim Barbosa foi o único que votou pela permanência do caso no STF. Para comentar a decisão do STF, conversamos com Pedro Serrano, doutor em direito e professor de direito constitucional pela Pontifica Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Na entrevista, Serrano é enfático ao dizer que a decisão de mandar o caso de Azeredo à 1ª instância é correta do ponto de vista técnico, porém, tal decisão deixa claro que o julgamento do mensalão petista foi um “grave erro jurídico”. Serrano também comenta que o voto de Barbosa pela permanência do caso de Azeredo no STF foi “equivocado” e ainda comentou que o ministro constrói a sua coerência no “erro”. O professor também comenta que os réus do mensalão petista foram julgados “mais pelos seus acertos do que pelos seus erros”.   Revista Fórum – qual a sua opinião sobre o Supremo Tribunal Federal ter mandado o caso do Azeredo para 1ª Instância? Pedro Serrano – Tecnicamente é uma decisão correta. Pois, ao abrir mão do mandato de deputado... Vamos dizer: a regra estabelece que o STF é competente como foro privilegiado aos parlamentares, ministros etc. são uma regra de exceção à regra geral, esta diz que os cidadãos devem ser julgados pela primeira instância. Como exceção, a regra tem que ser interpretada restritivamente, é uma regra da interpretação jurídica. O que significa interpretar restritivamente essa regra? O sujeito tem que estar no mandato, se ele renuncia o mandato, ele é um cidadão comum e tem que ser julgado pelas instâncias comuns. Então, tecnicamente está correta a decisão. Agora, o problema é que o STF demorou um tempo absurdo para julgar, nove anos. Esse é um caso que iniciou antes do mensalão de ser julgado e essa demora ocorreu por conta do próprio STF vai gerar fatalmente a prescrição dos crimes dele, pelo menos boa parte deles. Ele usou a estratégia de renunciar ao mandato em um último momento, essa estratégia é um direito dele, é preciso entender isso. Dentro do STF você tinha jurisprudência para as duas situações: seja a jurisprudência nesse sentido que te falei e tinha a jurisprudência que votou o ministro Joaquim Barbosa. Fórum – Nós temos casos como o do Natan Donadon, que renunciou mas foi julgado pelo STF. Serrano – Exatamente. Isso por que se considerou em alguns casos que quando a renúncia se dá na última hora, como no caso do Azeredo, ela visa evitar o julgamento e aí haveria um princípio maior, que é o princípio da universalidade da jurisdição e da efetividade da jurisdição de que o réu não pode manipular a atividade em favor próprio, há uma má fé do réu. Então nós temos interpretação nesse sentido, eu não concordo com essa interpretação. Eu acho que no caso do réu o Estado tem o dever de punir com os instrumento que lhe dão poder pra isso, o Estado não é uma pessoa jurídica qualquer e se ele não consegue ver de forma distinta o seu poder, o problema é dele, o réu não tem nada a ver com isso. Essa é a questão no campo técnico. Agora, no campo político e de Estado eu diria que se criou um problema para o país. Você tem uma distinção brutal de tratamento. No caso do mensalão petista e o caso do mensalão do tucano. Fórum – O julgamento do mensalão petista foi político? Serrano – Político é uma palavra inadequada, por que ela é uma palavra muito genérica. Talvez a pergunta fosse: é um julgamento de exceção? Ainda é cedo pra dizer. Julgamento de exceção não é um mero erro jurídico, isso é muito mais complexo do que um mero erro judiciário. Agora, de que houve um erro judiciário no caso do mensalão petista, eu não tenho a menor dúvida. É um julgamento absolutamente fora da curva, usando uma expressão do ministro Barroso. Um julgamento que produziu um erro judiciário grave e prejuízo humano em algumas pessoas. O maior exemplo disso é o que está ocorrendo com o julgamento do mensalão tucano. Não é que o mensalão tucano está errado, errado foi o mensalão petista. Eles não dividiram o processo como o do mensalão tucano. Tiveram uma atitude muito mais punitivista no mensalão petista do que estão tendo no mensalão tucano. Então, o erro não está no mensalão tucano, eles estão agindo de acordo com a Constituição no mensalão tucano. No mensalão petista é que desvirtuaram a Constituição, abriram mão de direitos fundamentais dos réus. O mensalão petista é fechado no caso jurídico, não há mais o que fazer, mas ele é aberto no campo político e no plano das relações internacionais, a imprensa internacional está atenta a isso. Houve, evidentemente, um julgamento fora da sintonia de todo o resto do supremo. O julgamento de agora serve como exemplo. A aceitação dos embargos infrigentes do mensalão petista foi correta juridicamente, mas gerou uma indignação na sociedade. E essa decisão de agora, que é correta, mas você não vê indignação. Existe hoje nas elites e na mídia brasileiras uma indignação seletiva e um moralismo seletivo e isso acabou gerando a pior situação que podia haver no Estado democrático de direito que é uma jurisdição seletiva. Uma jurisdição para o caso do mensalão petista e outra para todo o resto. E é a de todo o resto que está certa, ou seja, a relação promíscua entre mídia e judiciário, no caso do mensalão petista, gerou um problema grave para o judiciário, nós temos que estar atento a isso. Fórum – Você falou sobre danos para o judiciário. Que tipo de danos esse caso pode trazer? Serrano – O de agora (tucano) não, ele foi correto. Eu tenho certeza que a história vai julgar isso como uma perseguição política pelo que os réus do mensalão fizeram de bom e não de ruim. Que eles fizeram algumas coisas ruins, eu não tenho dúvida. Mas a realidade é que eles foram punidos aparentemente pela mídia pelo que eles fizeram de bom. Por eles representarem um partido que resolveu utilizar o desenvolvimento do capitalismo, não tem nada de socialismo. Eles desenvolveram um capitalismo brasileiro, procuraram estabelecer um projeto desenvolvimento capitalista brasileiro com a garantia de direitos sociais, como tem no primeiro mundo, que a classe média idolatra. E eles foram punidos, aparentemente, por causa disso. Há uma indisposição da sociedade com essa pessoas que não é justificável no plano nem dos fatos nem no plano jurídico e essa indisposição acabou influenciando os julgadores do supremo a cometerem um grave erro judiciário. O julgamento do Eduardo Azeredo é muito positivo não só por reconhecer o direito dele, não só por fazer a Constituição, mas também para demonstrar o erro que foi o mensalão petista. Ele é o maior exemplo pra mostrar pra sociedade de como foi errado o julgamento do mensalão petista. Onde não foram observados os direitos como foram observados no caso do Eduardo Azeredo. Fórum – Então, dentro desta perspectiva o voto do ministro Joaquim Barbosa no caso do Azeredo foi equivocado? Serrano – Foi totalmente equivocado como foi equivocada toda a conduta dele no julgamento do mensalão petista. Eu o respeito como pessoa, como ser humano, mas como juiz ele se equivocou. A conduta dele no mensalão petista é absolutamente equivocada, ele tem uma coerência no erro. Então, não dá pra acusa-lo em nada no sentido subjetivo, ele é um homem honesto, não dá pra negar isso, mas ele errou no mensalão petista como errou no voto de ontem. Assim como há outros juristas que votaram de uma maneira no mensalão petista, sem dar a devida atenção aos direitos dos réus, com uma dada forma de interpretação judicial e agora, neste julgamento deram outra atenção diferente aos réus do mensalão tucano.