Uma Ação Civil Pública foi protocolada por diversas entidades do movimento negro nesta sexta-feira (17) e pede a condenação das vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton ao pagamento de indenização de R$ 207 milhões por dano moral coletivo. As vinícolas, localizadas na região de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, são acusadas de manter 207 trabalhadores da colheita em condições análogas à escravidão.
O valor da indenização, de acordo com os propositores da ação, deve ser distribuído igualmente entre todos os trabalhadores afetados pelas práticas das empresas. Na prática, cada um levaria R$ 1 milhão.
Proposta por entidades de São Paulo, Tocantins e Rio Grande do Sul, a ação foi distribuída para a 2ª Vara Cível de Bento Gonçalves. Entre as associações envolvidas estão o Coletivo Cidadania, Antirracismo e Direitos Humanos, composto pelos advogados que articulam a ação; a Associação Maria Mulher, organização de mulheres negras do RS; o Coletivo de Advogados pela Democracia (COADE) de São Paulo; a também paulista Soeuafrobrasileira; e a Associação Estadual de Direitos Humanos do Tocantins.
As entidades são representadas pelos advogados Antônio Carlos Côrtes (RS); André Moreira (ES); Cláudio Latorraca, Ed Mattos, Dojival Vieira, Carlos Alberto Silva, Francisco de Assis da Silva Filho e Anália da Silva (SP); Lucílio Bastos Casas e Maria Rosa Bahiano Pedral Sampaio (BA); além de Maria de Fátima Dourado da Silva (TO). O time de advogados lembra na ação que o resgate dos 207 trabalhadores encontrados em alojamento na cidade de Bento Gonçalves chocou o Brasil e o mundo.
A operação de resgate dos trabalhadores contou com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público Federal do Trabalho (MPFT), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Contratados por uma terceirizada, os trabalhadores atuavam na colheita das vinícolas Garibaldi, Salton e Aurora, que são rés na ação. Cooptados em sua maioria na Bahia, recebiam promessas de empregos bem pagos, mas, ao chegarem a Bento Gonçalves, começava o terror. Além de serem colocados em alojamentos desumanos, trabalharem jornadas exaustivas, terem de comer alimentos em estado de putrefação e restrições desde a locomoção até o mantenimento de objetos pessoais, ainda sofriam com a vigilância constante dos capatazes que jamais hesitavam em demonstrar sua força bruta e preconceito regional.
“A gravidade da violação de direitos dos trabalhadores foi ainda mais profunda porque os nordestinos relatam sessões de espancamento com cabos de vassouras, cadeiras, mordidas, choques elétricos e spray de pimenta, além de ameaças de morte”, relatam os advogados. De acordo com relatos das vítimas, os trabalhadores nordestinos, a maioria negros, recebiam castigos físicos dos capatazes da terceirizada enquanto os gaúchos não sofriam com esse tipo de punição.
Juntas, as três empresas tiveram faturamento superior a R$ 1 bilhão em 2022. A ação também critica o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) assinado pelas vinícolas, que as obriga a pagar R$ 7 milhões aos resgatados como dano moral coletivo. Só a Salton, líder do mercado de espumantes há 18 anos, faturou mais R$ 500 milhões no último ano. “É uma vergonha, um escárnio, um deboche”, afirmam os advogados sobre o valor proposto pelo TAC.