Áudios indicam que Flávio Bolsonaro tentou negociar vacina sem aprovação

Reportagem da IstoÉ revela que o filho do presidente participou de “negociação paralela” do imunizante norte-americano Vaxxinity

Flávio Bolsonaro - Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado
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O senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) se envolveu, pessoalmente, na compra da vacina norte-americana Vaxxinity, contra a Covid-19, não aprovada pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) e FDA (agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos). A denúncia foi feita em reportagem de Ricardo Chapola, na IstoÉ.

Uma troca de e-mails mostra fortes indícios de que o filho do presidente participou, em junho de 2021, de uma negociação paralela para a aquisição do imunizante, que ainda estava em fase de testes e sem aprovação, durante viagem que o senador fez aos Estados Unidos.

O envolvimento do filho do presidente teve início em 9 de junho. O advogado e dono de uma pousada em Itacaré (BA), Stelvio Bruni Rosi, encaminhou um e-mail ao gabinete de Flávio Bolsonaro, solicitando uma reunião entre o parlamentar e representantes do laboratório Vaxxinity, sediado em Dallas (EUA).

Stelvio Rosi enviou o e-mail pelo endereço “[email protected]”. Ricardo Horácio é um advogado do Rio de Janeiro. “Senador Flávio Bolsonaro, estivemos juntos na festa em Washington onde foi conversado sobre a vacina da empresa/laboratório/fabricante americana Vaxxinity (antiga Covaxx and United Neuroscience do Grupo UBI — United Biomedical Inc). Solicitamos reunião entre o senhor e a Vaxxinity nos EUA ainda hoje ou amanhã (ou enquanto estiver nos USA). Oportunidade para o governo obter preferência para solicitar a reserva de lote de vacinas estabelecendo negociação prioritária com a Vaxxinity”, disse o e-mail.

Já no dia seguinte, o gabinete de Flávio enviou a mensagem de Stelvio Rosi ao secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz. Na mensagem, encaminhada por Branca de Neves José Luiz, funcionária do senador, ele solicita que Cruz analise o pedido para “eventual interesse” na aquisição da vacina.

“Prezado senhor, por ordem do senador Flávio Bolsonaro, retransmito a V.Sa. a mensagem a seguir, tendo em vista eventual interesse desse ministério em realizar contato e obter informações”, disse a correspondência.

Arrependimento

Em entrevista à IstoÉ, Stelvio Rosi afirmou ter se arrependido por pedir a intervenção de Flávio na operação junto ao Ministério da Saúde.

“Não era o caso também de eu ter tentado acessar um senador que não tem muito a ver, né? Tinha que ser por outro caminho”, declarou.

O autor do e-mail ao filho do presidente disse, também, que não estava nos EUA naquele dia e que se “expressou mal” ao redigir o texto daquela forma. “Eu mesmo não saio do Brasil desde 2002. Na pandemia, nem de Itacaré eu saí, que é onde moro hoje. Esses caras recebem muitos e-mails. E conversam com muitas pessoas toda hora. Acho que não me expressei muito bem no e-mail. Tentei criar um e-mail para chamar um pouco a atenção”, afirmou.

“Eu tentei fazer a apresentação de uma empresa para um político, que é filho do presidente do Brasil e que eu tinha conhecimento de que estava nos EUA”, relatou o suposto representante da Vaxxinity no Brasil.

Equipamentos hospitalares

Ainda segundo a reportagem, Rosi também atua como diretor operacional da Malugue Comércio Ltda, empresa do Rio de Janeiro que se apresenta como especializada na distribuição de equipamentos hospitalares.

“Fechamos contrato com um dos maiores distribuidores de vacinas do mundo. Hoje, seguimos rigorosamente os critérios de condutas pré-definidos por ministérios de saúde dos países fabricantes e dos países compradores e está totalmente amparada para orientar e promover o processo de aquisição de diversas vacinas para combater a Covid-19”, disse a empresa na internet.

Ou seja, essas informações não correspondem ao que Stelvio Rosi disse à reportagem. “Quando essa coisa de vacina começou a abrir a possibilidade para a venda aos estados, prefeituras e iniciativa privada, a gente tentou fazer uma movimentação nesse sentido”, afirmou.

Logo em seguida à entrevista de Stelvio Rosi, o site da Malugue foi retirado do ar.

Porém, além dele, integram o corpo diretivo da empresa o advogado Ricardo Horácio e o coronel da reserva do Exército, Gilberto Gueiros. O militar foi presidente da Loterj, na gestão do governador Wilson Witzel no Rio de Janeiro, e foi afastado do cargo por desvios na Saúde.

Investigação

A CPI do Genocídio abriu investigação para apurar denúncias de corrupção em contratos envolvendo hospitais do Rio. Um dos nomes sob suspeita é o de Flávio Bolsonaro.

Três pessoas ouvidas pela reportagem afirmaram que Gueiros é um velho conhecido da família do presidente da República. O militar foi colega de Jair Bolsonaro na academia militar. Ele, inclusive, é alvo de um processo no Superior Tribunal Militar (STM), no qual é réu por crimes de fraude em licitação e improbidade administrativa.

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