Chilenos voltam às ruas e denunciam que há fome em bairros pobres em meio à quarentena

País usado como modelo econômico por Paulo Guedes e Jair Bolsonaro vive situação caótica em regiões pobres, e também começa a perder o controle da quantidade de contágios e mortes por covid-19

"Se não morremos pelo vírus, morremos de fome", diz a faixa dos moradores de bairro pobre, em Santiago do Chile (foto: La Cuarta)
Escrito en GLOBAL el

Nesta quarta-feira (20), moradores do município de La Pintana, um dos mais pobres da Região Metropolitana de Santiago, realizaram um protesto com barricadas das principais ruas do setor, para denunciar que ainda não chegou a ajuda financeira e as cestas básicas prometidas pelo governo para que as famílias possam enfrentar a quarentena.

A situação não é nova, já que, desde segunda-feira, outros municípios da Região Metropolitana, como El Bosque, San Miguel e Lo Hermida denunciaram situação similar, e mescla a crise atual pela pandemia com a crise social que despertou a revolta popular que se viu entre outubro de 2019 e janeiro de 2020, quando os movimentos sociais chilenos fizeram manifestações diárias no centro de Santiago, pelo fracasso do modelo econômico neoliberal no país – inspiração das políticas econômicas de Paulo Guedes e Jair Bolsonaro.

Na noite de segunda-feira, um coletivo de artistas projetou a palavra “FOME”, em letras garrafais, sobre um dos edifícios mais altos da capital, manifestando a nova realidade vivida pelo país em meio à pandemia.

Durante a transmissão, pela televisão local, da manifestação em La Pintana, uma moradora não identificada reclamou que “nos bairros ricos, onde estão os que tomam as decisões, eles acham que está tudo bem, porque eles têm a geladeira cheia, não falta carne, não falta nada. Aqui faltam produtos básicos, faltam alimentos básicos, e a gente tem que se organizar pra ver quem tem algo sobrando para as famílias que tem algum parente em casa doente com covid”.

Na semana passada, o Congresso chileno aprovou uma lei que estabelece um auxilio de 65 mil pesos (cerca de 460 reais) por família para o mês de junho, mais 55 mil pesos (390 reais) em julho e 45 mil pesos (320 reais) em agosto. O benefício seria entregue apenas às famílias consideradas socialmente mais vulneráveis, para enfrentar a quarentena.

A oposição criticou fortemente a medida, dizendo que ela é insuficiente para permitir que as famílias se mantenham em quarentena.

Crise também na saúde

Os manifestantes nos bairros pobres também reclamam que o atendimento nos hospitais do país tem sido negligente, o que pode ser explicado pelo fato de que também na questão da saúde o Chile vive um problema crescente: no começo, o país parecia ter a pandemia controlada, com menos de mol contágios diários. Porém, nos últimos dias passou a ter entre 3 e 4 mil novos infectados por dia, e o que antes eram 10 a 15 mortes diárias, agora são entre 30 e 35.

A subsecretária de Saúde Paula Daza negou que o sistema hospitalar já esteja colapsado, mas reconheceu que foram habilitadas cerca de 300 novos leitos de urgência nas últimas 24 horas, o que permitiu lidar com os novos casos. Contudo, essa estrutura não deve suportar muitos dias mais se o número de contágios continua evoluindo no ritmo atual.

Na semana passada, a presidenta da Associação dos Médicos do Chile, Izkia Siches, afirmou que a estratégia do governo de Sebastián Piñera era equivocada, e entregou uma série de propostas para mudar os protocolos, no que denominou um “segundo tempo da resposta do país à pandemia”.

Porém, a oferta foi rejeitada. O ministro do Interior, Gonzalo Blumel, afirmou que “este não é um momento para confrontações, e sim para apoiar o trabalho que está sendo feito pelo Ministério da Saúde”.