Coronavírus mostra que crise econômica é sistêmica e que políticas sociais não são custos, diz Ladislau Dowbor

"Na área da saúde, nós precisamos de sistemas públicos universais e gratuitos para conter as doenças. Isso é o que reduz os custos", diz o professor da Puc-SP e consultor da ONU, Ladislau Dowbor

O professor de economia Ladislau Dowbor (Reprodução/Facebook)
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Em entrevista exclusiva à Fórum nesta segunda-feira (16), o professor titular de Economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e consultor de diversas agências da Organização das Nações Unidas (ONU), Ladislau Dowbor afirma que o pânico nos mercados gerado pela pandemia de coronavírus revela um lado que até há pouco tempo o sistema econômico procurou manter oculto e que o clima de corresponsabilidade nos leva à percepção de que as políticas sociais não são custos, como quer fazer acreditar a linha neoliberal, comandada hoje no Brasil pelo ministro Paulo Guedes.

"O principal impacto que a gente sente hoje em termos econômicos, e isso repercute nas bolsas, é que não há crise em um só país. Os circuitos econômicos são profundamente articulados e interdependentes e a gente precisa começar a pensar, obviamente, na regulação mundial", diz o professor.

Segundo ele, "essa crise nos fez tomar consciência de que a que ponto o sistema econômico mundial está articulado". "Grande parte das empresas americanas estão paralisadas porque peças vêem da China, a Europa depende que seus medicamentos venham da China e de outros países. Ou seja, nós não temos políticas nacionais apenas. Nós temos uma economia que está em escala mundial e temos políticas nacionais fragmentadas em 196 países. Isso simplesmente não funciona", afirma.

Dowbor diz que uma outra chamada à consciência que o coronavírus provoca é justamente no pensamento neoliberal, que prega que a mão do mercado tudo regula e que trata o investimento nas políticas sociais como gasto.

"Nós não vamos pensar agora o quanto vai render, em termos de lucro, elaborar uma vacina. Ou se os laboratórios que se adiantarem em um vacina contra o coronavírus vão registrar patente e vender a preço de ouro, em conta-gotas. Na área da saúde, nós precisamos de sistemas públicos universais e gratuitos para conter as doenças. Isso é o que reduz os custos".

Para o professor, o próprio sistema precisa ser revisto, dentro de modelos colaborativos que propiciem a interação entre as políticas nacionais e os sistemas internacionais de produção.

"É uma revisão de como a gente concebe os processos colaborativos em níveis nacionais - políticas sociais não são custos, são investimentos nas pessoas e protegem a sociedade. E o ponto dois, que esse sistemas têm que ser colaborativos internacionais, como tantos países estão fazendo, trocando entre laboratórios informações para facilitar pesquisas sobre a vacina", afirma.

"O essencial é que a economia globalizada sem políticas de regulação internacionais, inclusive sistemas tributados correspondentes, simplesmente não funciona", conclui Ladislau Dowbor.