Hospital da PM no RS usou proxalutamida contra Covid sem aval da Anvisa

Cerca de 50 pacientes infectados foram medicados com remédio defendido por Bolsonaro, que foi criado para tratamento de câncer de próstata e de mama

Foto: Fábio Pozzebom/Agência Brasil
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Pacientes com Covid-19, que estavam internados no Hospital da Brigada Militar (HBMPA) de Porto Alegre (RS), foram medicados com proxalutamida, remédio fabricado na China e tratado por Jair Bolsonaro como “a nova cloroquina”.

A questão é que, à época, não havia liberação para importação, por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e, tampouco, para testá-lo em humanos, de acordo com reportagem de Pedro Nakamura, no site Matinal Jornalismo.

Em um dos casos, uma policial militar, que prefere não revelar o nome, precisou ser encaminhada às pressas para o HBMPA, em março. Ao ser internada, ela afirmou ter sido abordada por dois capitães-médicos. Eles perguntaram se ela aceitaria participar de um “estudo” com um novo medicamento, a proxalutamida, que estava sendo testada contra o coronavírus no hospital.

Ela revelou que, apesar de estar “tonta” e “sem pensar claramente”, por estar com falta de ar, concordou. “Tomei porque quando a gente tá mal, se for para ficar bem, tomamos o que o médico oferecer”.

Na sequência, assinou às pressas uma espécie de termo de consentimento, sem ler direito. A policial relatou que, além de não ter recebido uma cópia, nunca mais viu o documento, o que é um direito seu.

Somente depois de curada, quando já estava em casa, a paciente descobriu, por meio de uma pesquisa na internet, o que era o medicamento.

Assim como ela, cerca de 50 pacientes internados no hospital, em março de 2021, receberam a proxalutamida, conforme o major e médico Christiano Perin, que foi chefe da Unidade de Terapia Intensiva do hospital até 2016.

O medicamento foi administrado sem autorização da Anvisa para ser importado. Além disso, o “estudo” ocorreu no HBMPA sem que tivesse cadastro da instituição na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), responsável por liberar pesquisas clínicas com humanos. O suposto “estudo” também não está registrado na Plataforma Brasil, que concentra todas as pesquisas em seres humanos no país.

Ainda segundo a reportagem, os responsáveis pela “experiência” foram o endocrinologista Flávio Cadegiani e o infectologista Ricardo Zimerman, que atua como terceirizado no hospital desde 2017.

Em maio de 2021, Zimerman foi ouvido na CPI do Genocídio e orientou o uso de medicamentos ineficazes contra a Covid-19, de remédios antiparasitários a antimaláricos. Na oportunidade, ele também defendeu a utilização de antiandrogênicos, como a proxalutamida.

O que é

A proxalutamida inibe os efeitos de hormônios masculinos. Inicialmente, foi criado para tratamento de câncer de próstata e de mama, em estágio avançado. Desde o início da pandemia, especula-se que poderia, também, ter efeitos positivos contra o coronavírus, o que jamais foi comprovado, inclusive em estudos realizados com a droga.