Chega às plataformas digitais o lendário álbum “Cabelos de Sansão”, de Tiago Araripe

Lançado em 1982, o álbum chega às plataformas digitais tão moderno quanto quando foi lançado, em pleno caldeirão da vanguarda paulistana

Foto: Divulgação
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O álbum “Cabelos de Sansão”, do cantor cearense Tiago Araripe, resgatado para o CD em 2008, pelo selo Saravá Discos, do cantor e compositor Zeca Baleiro, chega finalmente às plataformas digitais. E é mais do que justo que o primoroso disco siga galgando o seu resgate, não importa o meio por onde se deseje ouvir música boa. Ao contrário de muitos outros que entram para a história, o disco sobrevive com galhardia à própria lenda. Não era conversa de senhores de seu tempo. “Cabelos de Sansão” é de fato um excelente disco, inovador, cheio de lindas canções, bem arranjado e executado. Estão nele Itamar Assumpção, Tetê Espíndola, Vânia Bastos, Felipe Wagner, Jica, Turcão, Cid Campos, Mané Silveira e mais um sem fim de figurinhas carimbadas do teatrinho Lira Paulistana, da Teodoro Sampaio, em São Paulo. Todos tocaram, arranjaram, cantaram e palpitaram no disco sem ganhar um tostão. “Cabelos de Sansão” foi o segundo disco lançado pelo selo Lira Paulistana, de Wilson Souto Jr., o Gordo. O primeiro foi o antológico “Beleléu, Leléu, Eu”, de Itamar Assumpção que, segundo o próprio Gordo, teria sugerido o artista a ele. O disco, lançado em 1982, deve ter tido uma tiragem de poucos milhares de exemplares em long-play e nunca mais foi relançado. O cantor e compositor cearense Tiago Araripe, ao contrário de todos os seus companheiros de geração, deu uma sumida da cena musical tempos depois do lançamento de “Cabelos de Sansão” para reaparecer em 2013, com o lindo álbum “Baião de Nós”. No ano passado, o cantor foi de mala e cuia para Portugal. De lá, mandou o clipe da linda canção “Tudo no Lugar”, segundo ele, “uma composição de travessia e de esperança, de renovação e de amor”, e acrescenta: “uma canção de amor, como resposta aos tempos raivosos que dividiram o Brasil em 2018”, conta. O vídeo clipe, onde ele divide a canção com a cantora portuguesa Mara, é um mergulho da cineasta Fádhia Salomão na intimidade das gravações da nova canção de Tiago Araripe, realizadas na cidade portuguesa de Almada. Algumas das composições de “Cabelos de Sansão” cativam de cara. É o caso de “Cine Cassino”, onde descreve uma aventura amorosa adolescente num cinema. Nela a tensão sexual se confunde com astrologia, Beatles, num sampler de “Strawberry Fields Forever”, e a própria ação do filme, com um refrão anedota que repete: “Os criminosos sempre voltam ao local do crime”. Outra que merece atenção é “Redemoinho”. Uma canção de amor que mistura música indiana com cordas no estilo “Eleanor Rigby” (os Beatles parecem presentes em todo o disco) e uma letra excelente. Outro achado fica por conta de uma versão de ninguém menos do que o poeta Augusto de Campos para “Little Wing”, de Jimmi Hendrix. “Asa Linda”, fiel a original, evoca a poética non sense e repleta de imagens lisérgicas de Hendrix, além de ser cantada lindamente por Tiago. Para além de tudo isso, “Cabelos de Sansão” traz ainda um certo mistério, um algo mais que nos toca a alma sem grandes explicações. Direto de um tempo cheio de esperanças, é um dos grandes discos brasileiros de todos os tempos, que faz finalmente a travessia do vinil independente para a música por demanda.