"25 de Abril sempre!" A Revolução dos Cravos e suas canções

O sinal para as tropas é dado logo após a meia-noite, quando a canção “Grândola, Vila Morena”, do compositor Zeca Afonso é transmitida pelo programa Limite, da Rádio Renascença

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Em Portugal, no dia 25 de abril de 1974, um movimento militar denominado Movimento das Forças Armadas (MFA), formado em sua maior parte por capitães, derrubava a ditadura de inspiração fascista conhecida como“Estado Novo”, cujo regime atormentava o país desde 1933. O sinal para as tropas é dado logo após a meia-noite, quando a canção “Grândola, Vila Morena”, do compositor Zeca Afonso é transmitida pelo programa Limite, da Rádio Renascença. O locutor, na ocasião, era Leite de Vasconcelos, jornalista e poeta moçambicano. A canção estava proibida, pois, segundo o governo, fazia alusão ao comunismo. Aquela sucessão vertiginosa de acontecimentos passou a ser conhecida, em Portugal e no mundo, como a Revolução dos Cravos. Conta a lenda que Celeste Caeiro, que trabalhava num restaurante na Rua Braancamp, em Lisboa, iniciou a distribuição dos cravos vermelhos pelos populares que os ofereciam aos soldados. Os cravos eram colocados nos canos das espingardas. Em uma noite inesquecível, em meados da década de 80, fazíamos uma cantoria na casa de um empresário brasileiro descendente de portugueses onde estavam alguns ministros de Estado da terrinha. À certa altura da festa, já com alguns litros de um bom vinho da região do Dão devidamente emborcados, os portugueses presentes se perfilaram em uma comoção pouco comum para a ocasião e cantaram a “Grândola, Vila Morena”. Naquele momento, como em pouco outros, tive a noção do real significado da canção para os nossos patrícios. Mais do que isto, pude enxergar (e ouvir) com clareza a importância da construção de um hino no imaginário popular. Zeca Afonso, com os seus discos, passou a ser referência por toda a minha vida de músico e pesquisador da canção popular. Aqui, no Brasil, vivíamos a ditadura dos militares em sua fase mais sangrenta. O cantor e compositor Chico Buarque, por sua vez, fez na época uma canção magnífica em homenagem à Revolução dos Cravos chamada “Tanto Mar”. A sua primeira versão, como em tantos outros casos do compositor, foi vetada pela ditadura brasileira e acabou sendo lançada apenas em Portugal, onde “fazia a primavera”. Veja abaixo: Tanto Mar (primeira versão) Sei que estás em festa, pá Fico contente Enquanto estou ausente guarda um cravo para mim Eu queria estar na festa, pá Com a tua gente E colher pessoalmente uma flor do teu jardim Sei que há léguas a nós separar Tanto mar, tanto mar Sei também quanto é preciso, pá Navegar, navegar Lá faz primavera, pá Cá estou doente Manda urgentemente algum cheirinho de alecrim Lá faz primavera, pá Cá estou doente Manda urgentemente algum cheirinho de alecrim Alguns anos depois, em 1978, a canção foi finalmente liberada pela censura. A “Revolução dos Cravos” já não era mais a mesma e o autor resolveu fazer, por conta própria, pequenas alterações na letra. Uma das mais significativas ficou por conta do verso “Sei que estás em festa, pá”, que virou “Já murcharam tua festa, pá”. Veja abaixo: Tanto Mar (segunda versão) Foi bonita a festa, pá Fiquei contente Ainda guardo renitente um velho cravo para mim Já murcharam tua festa, pá Mas certamente Esqueceram uma semente em algum canto de jardim Sei que há léguas a nós separar Tanto mar, tanto mar Sei também quanto é preciso, pá Navegar, navegar Canta a primavera, pá Cá estou carente Manda novamente algum cheirinho de alecrim Canta a primavera, pá Cá estou carente Manda novamente algum cheirinho de alecrim