Quinze anos que Marcos Pontes voltou do espaço – Por Marcelo Santos

Atual ministro de Bolsonaro viajou, sob o governo Lula, na Missão Centenário, um acordo entre Brasil e Rússia num mundo bem diferente ao atual.

Foto: EBC
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Por Marcelo Santos *

Passou despercebido. No último dia 8 de abril completaram-se 15 anos que o tenente-coronel da reserva da Força Aérea Brasileira (FAB) Marcos Pontes, hoje ministro da Ciência e Tecnologia, voltou do espaço depois de ver com seus próprios olhos que a Terra não é plana. Não havia uma foto em que o astronauta, de Bauru (SP), não estivesse com os dentes arreganhados e sorrindo. E todo mundo queria ir pro espaço também ver qual é. Até a Turma do Cocoricó, do divertido programa na tevê, cantou o feito. E a gente era tão feliz que fazia piada nas esquinas, dizendo que a missão espacial, viabilizada através de um acordo bilateral entre Brasil e Rússia, e que recebeu o nome de Missão Centenário (em referência ao primeiro voo tripulado de uma aeronave, o 14 Bis, de Santos Dumont), só foi possível depois que o Brasil entregou o ET de Varginha aos gringos. Era 2006. E a gente achava que o universo era o limite. Todo mundo queria vir para o Brasil.

Hoje, de dentro de nossas casas, sem expectativas, a gente sofre. Sofre de falta de esperança. Países fecharam fronteiras para o Brasil, cada vez mais pária e piada no mundo.

Éramos o país da alegria e sabíamos bem.

Esperávamos a Copa começar em Itaquera. Esperávamos que o exoesqueleto do neurocientista brasileiro, o doutor Miguel Nicolelis, desse o primeiro pontapé nos gramados da Zona Leste de São Paulo. O Supremo Tribunal Federal era presidido por um homem negro, o ministro Joaquim Barbosa, filho de uma ex-empregada doméstica e de um pedreiro. A expectativa pelos Jogos Olímpicos fazia qualquer um sonhar com o pódio e com a medalha de ouro. Ronaldo, o Fenômeno, veio jogar no Timão. Gilberto Gil fez carnaval na ONU e pôs Koffi Annan pra dançar. Os pobres começaram a chegar na universidade e foram estudar no exterior. Médicos cubanos atendiam nas periferias.

Esperança era o horizonte

Ainda que se critique, e muito com razão, sobre esse período, era esse o país em que vivíamos. Um país que tinha como linha no horizonte a esperança. Esperança até de que os governos poderiam ser melhores. Que a corrupção poderia ser combatida. E que a violência fosse controlada e a educação prevalecesse. De que os livros se espalhassem pelo vento. Que o cinema nacional ganhasse cada vez mais notoriedade.

Mas hoje mesmo eu recebi uma ligação: “Está tudo tão difícil”. Ouvi também uma mensagem no WhatsApp. “Tem dia que eu não quero sair da cama.” E li sobre as 200 produções do cinema nacional por ano que já tivemos.

Tem uma música da cantora Simone que diz assim: “Felicidade é (..) qualquer lugar que se ilumina quando a gente quer amar”. E tudo o que a gente quer, nessa vida, é voltar a ser feliz. É ter esperança. É amar. Mesmo que, depois de ter ido e voltado ao espaço, em dez dias, o nosso primeiro astronauta tenha se tornado vendedor de travesseiros, coaching de autoajuda e, por fim, ministro de Bolsonaro.

*Marcelo Santos é jornalista.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.