ROL TAXATIVO

Rol taxativo e os dilemas da saúde do Brasil – Por Jorge Abissamra Filho

Com a aprovação do "rol taxativo", as operadoras de planos de saúde saíram vitoriosas, os empresários do ramo vão reduzir seus custos e aumentar seus lucros. Como sempre, por outro lado, a população saiu derrotada

Créditos: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil
Por
Escrito en DEBATES el

Para assumir a carreira médica, realizei um juramento, esse valor ético norteia a minha trajetória por todos os anos de profissão e continuarei a segui-lo até o último dia da minha vida.

Ser médico, é antes de tudo, assumir o compromisso em defesa da vida, pressupõe colocar-se a disposição daqueles que precisam de ajuda, e sem nenhum tipo de julgamento de classe, raça ou gênero, lutar diuturnamente pela defesa da vida.

O ofício médico está indissociavelmente vinculado as condicionalidades sociais para o exercício da profissão, logo, em um país marcadamente desigual, infelizmente, os mais pobres padecem de assistência médica.

Com o intuito de diminuir as disparidades e assegurar a igualdade de tratamento, o nosso país conseguiu aprovar um Sistema Único de Saúde (SUS), onde o estado é obrigado a garantir a universalidade e gratuidade no acesso e tratamento médico. Embora o SUS careça de muitos ajustes, ele é sem dúvidas, um dos modelos de saúde mais importantes do mundo.

Muitas famílias com o objetivo de fugir dos dilemas do SUS, procuram a assistência médica através da rede privada por intermédio das operadoras de planos de saúde. No Brasil, perto de 50 milhões de pessoas são assistidas por convênios médicos e/ou odontológicos, com perto de 3.500 procedimentos distintos; porém para alcançar esse acesso, as famílias comprometem boa parte do orçamento mensal.

A regulação e fiscalização dos planos de saúde é realizada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), responsável por garantir que os procedimentos sejam cumpridos e que as operadoras ofertem qualidade no tratamento médico de seus usuários.

Até a última semana as operadoras eram obrigadas a ofertarem aos usuários os procedimentos  prescritos no "rol exemplificativo", documento da ANS que orientava sobre os procedimentos obrigatórios. A cada dois anos, novos procedimentos eram incluídos e a lista no "rol exemplificativo" era atualizada.

Entretanto, no dia 8/6 o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou a substituição do "rol exemplificativo" para o "rol taxativo" e várias alterações entraram em cena, afetando diretamente a vida dos usuários, mas afinal, o que determina essa mudança?

A partir da aprovação da decisão do STJ, as operadoras de plano de saúde são obrigadas a cumprirem apenas os procedimentos que constam na lista do "rol taxativo" da ANS, ou seja, procedimentos novos, assim como medicações, tratamentos, terapias, cirurgias e outros são desobrigados pelas operadoras dos planos, até a atualização de uma nova lista.

O "rol taxativo" terá um impacto direto em tratamentos como imunoterapia para câncer e alguns tipos de quimioterapia, outros tratamentos passam a ser limitados, tais como terapias para pessoas com autismo e outros tipos de deficiência.

Com a aprovação do "rol taxativo", as operadoras de planos de saúde saíram vitoriosas, os empresários do ramo vão reduzir seus custos e aumentar seus lucros. Como sempre, por outro lado, a população saiu derrotada; mas o que está jogo é a vida humana e não cifras, logo, essa alteração terá impacto direto em tratamentos imprescindíveis para assegurar a vida.

Outra consequência inevitável será o aumento da demanda do SUS, pois a ausência de procedimentos nos planos de saúde, levará os usuários a busca de tratamento pelo Sistema Único de Saúde, ou seja, vão pagar por duas vias, os impostos para manutenção do SUS e o próprio plano privado.

Diante dos dilemas que vivemos em nossa sociedade, é cada vez mais difícil para o cidadão adquirir e/ou manter um plano de saúde privado, a pauperização do trabalho, o aumento do desemprego e do custo de vida são elementos que impactam diretamente o orçamento familiar, logo a manutenção do plano é uma realidade para poucos.

Diante da pressão e críticas da sociedade civil e entidades diversas, deputados federais estão analisando em um grupo de trabalho as queixas que se acumulam contra o "rol taxativo". A proposta do grupo consiste na aprovação de uma lei que não prejudique os usuários dos planos de saúde, entretanto, há grupos econômicos que instrumentalizam a política para seus interesses e devemos ficar atentos e em permanente estado de alerta.

A sociedade civil deve estar atenta a esse movimento e exigir dos deputados um posicionamento em defesa da vida e não de interesses econômicos, portanto, nos cabe a tarefa de fiscalizar, exigir e lutar.

É urgente que repensemos o modelo de saúde de nosso país e que assumamos um compromisso ético em defesa da vida, onde, os lucros não sejam maiores que a cobertura e assistência médica, e que a vida seja sempre a nossa condição máxima.

Diante dos desafios nossos de cada dia, nossa tarefa diuturna é lutar. Eu como médico assumi que meu lado nessa luta é contra o "rol taxativo".

Temas